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28 abril 2009

A EXTINÇÃO DA REALEZA ESPANHOLA FOI GENÉTICA

A queda de uma dinastia: dados genéticos apoiam teoria de que uniões consanguíneas extinguiram linhagem de reis espanhóis


[Brasão da linhagem espanhola da dinastia Habsburgo, que governou a Espanha por quase duzentos anos (imagens: Wikimedia Commons).]

Uma hipótese histórica sobre o fim de uma linhagem de reis que dominaram a Espanha entre 1516 e 1700 – e da qual descende a família real brasileira – acaba de ganhar o apoio de evidências genéticas. Um grupo de pesquisadores espanhóis mostra que a alta frequência de casamentos entre parentes próximos pode ter levado à concentração de problemas genéticos nos descendentes da linhagem espanhola da dinastia Habsburgo e culminado com sua extinção.

O braço espanhol da dinastia Habsburgo foi fundado por Filipe I, que entre 1504 e 1506 foi rei de Castela, hoje parte da Espanha. Seu filho, Carlos I, ocupou o trono dos reinos de Aragão e Castela a partir de 1516 e tornou-se o primeiro rei da Espanha em 1555, após a unificação do país.

Sob o comando dos Habsburgo, a Espanha alcançou o apogeu de seu poder e influência na Europa. Em 1700, no entanto, o rei Carlos II (tataraneto de Carlos I) morreu sem ter deixado filhos de seus dois casamentos. Então, a linhagem espanhola dos Habsburgo desapareceu e a dinastia francesa Bourbon chegou ao trono espanhol.

Segundo relatos históricos, o rei Carlos II – apelidado de “o enfeitiçado” – era física e mentalmente incapacitado. Até os quatro anos, ele não falava e só começou a andar aos oito anos. Sofria de problemas intestinais, inchaços nos pés, pernas, abdômen e face, ejaculação precoce e infertilidade. Morreu aos 39 anos, com aparência de velho, após episódio de febre, dor abdominal, dificuldade respiratória e coma.

Herança genética

Historiadores sugerem que a principal causa dos problemas de saúde do rei Carlos II teria sido a preferência da linhagem espanhola dos Habsburgo por casar com parentes próximos (endogamia), na tentativa de conservar sua herança sempre nas mesmas mãos. Geralmente há um aumento da incidência de doenças genéticas em filhos de casais consanguíneos, porque existe maior probabilidade de que eles herdem duas versões iguais – uma do pai e outra da mãe – de genes recessivos raros e prejudiciais, em função da existência de ancestrais comuns que carregavam esses genes.

Para verificar essa hipótese, pesquisadores liderados por Gonzalo Alvarez, da Universidade de Santiago de Compostela (Espanha), calcularam, por meio de um programa de computador, o que eles chamam de coeficiente de endogamia dos reis espanhóis da dinastia Habsburgo. Esse valor indica a probabilidade de um indivíduo herdar de seus pais duas cópias idênticas de um gene.

O cálculo foi feito a partir de informações sobre mais de 3 mil antepassados do rei Carlos II ao longo de 16 gerações. Os pesquisadores constataram que nove dos onze casamentos da dinastia espanhola envolviam parentes biológicos.

[Carlos II, o último rei espanhol da dinastia Habsburgo, retratado por Juan Carreño de Miranda em 1685.]

O estudo, publicado esta semana na PLoS One, mostra que o coeficiente de endogamia dos Habsburgo aumentou cerca de dez vezes ao longo das gerações. Os reis espanhóis com maior semelhança em seu genoma eram Carlos II e seu avô, Filipe III, que provavelmente tinham mais de 20% dos genes herdados do pai e da mãe iguais. Embora fossem filhos de casamentos entre tio e sobrinha, eles apresentavam coeficientes de endogamia quase tão altos quanto os de descendentes de uniões entre pais e filhos e entre irmãos.

Combinação de genes recessivos

“Alguns dos problemas de saúde sofridos por Carlos II poderiam ter sido causados pela ação de genes recessivos prejudiciais, devido ao seu alto coeficiente de endogamismo”, afirmam os pesquisadores no artigo. Com base nos conhecimentos médicos atuais, a equipe especula que a ocorrência simultânea de duas diferentes doenças genéticas poderia explicar o quadro de saúde complexo do rei Carlos II, inclusive a infertilidade que levou à extinção de sua dinastia.

Segundo os pesquisadores, os efeitos dos casamentos consanguíneos também se refletiam na alta taxa de mortalidade infantil entre os Habsburgo na Espanha. Um levantamento feito pela equipe mostrou que, entre 1527 e 1661, das 34 crianças nascidas na família real espanhola, dez (29,4%) morreram antes de completar um ano e metade não chegou aos 10 anos. Esses valores são bem mais altos do que a taxa de mortalidade infantil dos povoados hispânicos da época, que era de 20%.

Mas os autores ressaltam que essas evidências são indiretas. Os efeitos nocivos sobre a saúde e as taxas de mortalidade infantil poderiam estar associados a causas ambientais ou defeitos genéticos não relacionados a casamentos consanguíneos.

Embora não tenha deixado descendentes diretos, a linhagem espanhola dos Habsburgo figura entre os ancestrais da família real brasileira. Mariana da Áustria, mãe do rei Carlos II, era irmã de Leopoldo I, bisavô do rei de Portugal D. João VI. Este, por sua vez, também era filho de casamento consanguíneo – entre D. Maria I, “a louca”, e o tio dela, Pedro III, neto de Leopoldo I. Quis o destino que o parentesco de seus pais não gerasse graves consequências para D. Joao VI, que teve nove filhos – um deles, D. Pedro I, que proclamou a independência do Brasil.

Thaís Fernandes
Ciência Hoje On-line

2 Comments:

Blogger Txai Dinho da Silva said...

Que maravilha de artigo!

Parabéns pelo empreendedorismo marcante do blog!

Forte abraço Acreano :)

01/05/2009, 02:59  
Blogger Evandro Ferreira said...

Txai Dinho, fico feliz que você se interessa por estes assuntos. Acho relevantes e esclarecedores de muitas perguntas sem respostas que temos nos dias atuais.
Evandro

01/05/2009, 19:06  

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