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31 agosto 2015

INAUGURADA NA AMAZÔNIA A MAIOR TORRE DE PESQUISA AMBIENTAL DA AMÉRICA DO SUL

Evandro Ferreira
Blog Ambiente Acreano

Foi inaugurado no dia 22/08 na Reserva de Desenvolvimento Sustentável do Uatumã – localizada a 150 quilômetros em linha reta de Manaus – o Observatório de Torre Alta da Amazônia. A torre principal do observatório, construída em aço e com 325 metros de altura, é a mais alta dedicada exclusivamente a pesquisas ambientais na América do Sul e a mais alta torre construída no Brasil. Ela é 25 metros mais alta que a torre Eiffel, em Paris, e 100 m mais alta do que a torre de televisão de Brasília. Sua altura equivale a de um edifício de 80 andares.

A construção da torre, que demorou cerca de um ano e utilizou tecnologia nacional, exigiu investimentos de R$ 26 milhões, bancados em partes iguais pelos governos do Brasil e da Alemanha. Seu custo anual de manutenção está estimado em aproximadamente R$ 2 milhões. A administração do observatório, que além da torre principal inclui quatro torres menores de 80 m, será feita pelo Instituto Nacional de Pesquisa da Amazônia (INPA), Universidade do Estado do Amazonas (UEA) e pelo Instituto Max Planck, da Alemanha.

A torre, erguida em uma área de ambiente pristino livre de qualquer tipo de poluição, será equipada com instrumentos científicos de alta tecnologia, sendo considerada a mais completa do gênero no mundo. Com ela será possível monitorar, pelos próximos 20 a 30 anos, o clima e os processos de troca e transporte de gases entre a floresta e a atmosfera na região amazônica. Anteriormente, os dados que agora serão obtidos com os equipamentos instalados na torre só podiam ser colhidos por experimentos aéreos. 

Com a torre será possível fazer um acompanhamento real e contínuo de dados durante 24 horas. Os estudos que serão realizados com os dados colhidos pelos instrumentos instalados na torre deverão gerar conhecimentos inéditos sobre o papel do ecossistema amazônico no contexto das mudanças climáticas globais.

Crédito da imagem: Ascom MCTI/Luciete Pedrosa-Ascom Inpa

18 agosto 2015

NÃO SEJA SURPREENDIDO, O EL NIÑO ‘GODZILA’ VEM AI

Evandro Ferreira

Pesquisadores do Centro de Previsão Climática do Serviço Atmosférico e Oceanográfico do Governo Americano (NOAA) estão alertando que o aquecimento anormal da superfície marinha na região leste do Oceano Pacífico indica que entre 2015 e 2016 poderemos enfrentar um dos mais severos “El Niño” da história, com a temperatura superficial do mar igualando ou superando níveis registrados apenas três vezes nos últimos 65 anos.

El Niño é um fenômeno climático que aparece em intervalos que variam entre dois e sete anos, durante o qual a água aquecida normalmente confinada na parte Oeste do Oceano Pacífico pela força dos ventos alísios - que sopram na direção Leste-Oeste - se move em direção ao continente Sul-Americano em razão da diminuição da força desses ventos ou mesmo pela reversão em sua direção. O fenômeno do El Niño atinge uma ampla área na região intertropical do oceano Pacífico, onde a água é mais quente e ocorre parte considerável da evaporação no planeta. Por isso seu alcance é global e seus impactos climáticos e socioeconômicos enormes.

De acordo com as previsões do NOAA, o El Niño desse ano será mais severo do que o de 1997, considerado o mais intenso já registrado e que foi responsável pela morte de mais de 20 mil pessoas e prejuízos globais estimados em cerca de U$ 45 bilhões. Para o El Niño de 2015 os pesquisadores calculam que existe uma possibilidade maior que 90% de seus efeitos continuarem intensos durante o inverno de 2015-2016 no hemisfério norte, podendo durar até a primavera de 2016. Nas palavras do Pesquisador Bill Patzert, climatologista do Laboratório de Propulsão a Jato da NASA, o evento que se avizinha deverá ser tão severo que pode perfeitamente ser chamado de El Niño ‘Godzila’.

A adoção, pelos pesquisadores e pela imprensa de uma maneira geral, da denominação ‘El Niño’ para esse fenômeno climático deriva do conhecimento empírico de pescadores peruanos, que há mais de 200 anos observam que em alguns anos, por volta do período natalino, as águas frias e com pescado farto que banham a costa do Peru são substituídas por águas mais quentes que afugentam os cardumes de atum e outros peixes. A coincidência com o período de Natal levou os pescadores a chamar o fenômeno de ‘El Niño’, numa alusão direta ao menino Jesus. Por muitos anos se pensou que o fenômeno era apenas local e a história se transformou em uma espécie de patrimônio folclórico da região. Somente na década de 50 é que se descobriu que as águas aquecidas que ocasionalmente chegam à costa peruana em período natalino integram um distúrbio climático de caráter global.

Durante o El Niño, a água aquecida que chega à costa Sul-Americana pode alterar os padrões de circulação na atmosfera do planeta e sua evaporação provoca chuvas em regiões normalmente secas na costa do Chile e Peru, se estendendo até a costa oeste dos Estados Unidos. A mudança na direção do vento e o deslocamento da massa de água quente na direção da América do Sul, por outro lado, faz com que as chuvas de monções precipitem no Oceano Pacífico, bem antes de atingir extensas áreas continentais no Sudeste Asiático e na Austrália. Com isso, em anos de El Niño intensos o período chuvoso naquelas regiões se torna extremamente seco, com graves efeitos socioeconômicos e ecológicos.

No Brasil, a ocorrência do fenômeno El Niño geralmente provoca invernos com temperaturas mais amenas e verões mais quentes no Sudeste, verões extremamente chuvosos no Sul, secas ainda mais extremas no Nordeste, e secas prolongadas no norte da Amazônica.

Durante o El Niño ocorrido entre 1982 e 1983 aconteceram cheias históricas em Santa Catarina que desabrigaram quase 200 mil pessoas, causando a morte de pelo menos 50 delas, e resultaram em prejuízos estimados em mais de R$ 12 bilhões. Em Roraima, os efeitos do El Niño de 1997 foram catastróficos. Em Boa Vista choveu apenas 30,6 mm entre setembro de 1997 e março de 1998, ou seja, pouco mais de 8% do total que normalmente chovia no período (352 mm). Incêndios ocorridos entre o final de 1997 e o início de 1998 destruíram cerca de 40 mil km² de vegetação nativa, das quais cerca de 14 mil km² eram florestas primárias. Alguns focos de incêndios ficaram fora de controle e duraram meses. Para dar uma melhor dimensão do desastre, é como se 25% de todo o território acreano queimasse ao longo de um único período de verão Amazônico.

Dados climáticos no Brasil apoiam a previsão de um El Niño de grande severidade em 2015. Segundo o Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet), o inverno em São Paulo tem sido ameno, com a média das temperaturas mínima e máxima cerca de 2°C e 0,8°C, respectivamente, mais elevadas que em outros anos. Para Florianópolis, em Santa Catarina, dados do INPE indicam que existe uma probabilidade de 40% dos níveis de chuva no trimestre entre agosto e outubro superarem os 700 mm, quando o normal situa-se entre 300 e 500 mm. Para o Nordeste, que já enfrenta uma forte estiagem há três anos, o site climatológico americano Accu Weather prevê que o nível de precipitação tende a continuar caindo abaixo da média. A notícia é preocupante porque na atualidade os níveis dos reservatórios de água da região estão em cerca de 21%. Na Paraíba, de 124 reservatórios monitorados, 74 estavam com menos de 20% da capacidade e 40 tinham atingido o nível crítico (menos de 5%) em junho passado.

E o Acre? Será que esse El Niño ‘Godzila’ causará efeitos catastróficos por aqui?

Provavelmente não. Segundo o pesquisador Carlos Nobre, do Instituto de Pesquisas Espaciais (INPE), as secas na Amazônia se manifestam de duas formas. A primeira, que corresponde ao fenômeno observado no Acre em 2005, é mais rara e decorre do aquecimento da água no Oceano Atlântico ao norte do Equador. Este aquecimento produz alterações na circulação atmosférica dos ventos alísios que transportam a umidade que se forma sobre o mar para o interior da Amazônia. Quando isso acontece, o efeito dessa falta de transporte de umidade se traduz em seca severa no oeste e sudoeste da região, ou seja, no oeste do Amazonas, no Acre e em Rondônia. A segunda é resultante de perturbações climáticas causadas pelo fenômeno El Niño e provoca seca mais acentuada apenas no norte e leste da Amazônia, ou seja, em Roraima, norte do Amazonas, Amapá e norte do Pará.

Diante disso devemos nos tranquilizar não é mesmo? A resposta é não. Com o clima extremo em que vivemos na atualidade, preparar e planejar medidas para mitigar os efeitos socioeconômicos e ecológicos que ele tem causado é a melhor opção.


É confortante saber que a massificação do acesso à informação, incluindo aquela de caráter técnico-científico, permite a uma parcela considerável de nossa população e administradores, saber com antecedência os possíveis efeitos de fenômenos climáticos em gestação como esse El Niño ‘Godzila’ que se avizinha. Por isso acredito ser inaceitável a possibilidade de, daqui a alguns meses, ver noticiado na imprensa a ocorrência de catástrofes - com graves perdas de vidas humanas e prejuízos econômicos - em regiões nas quais o El Niño infalivelmente costuma deixar seu legado de destruição.

Para saber mais:

Algar, J. 2015. 'Godzilla' El Niño Brewing In The Pacific Could Be One Of The Strongest On Record, Forecasters Warn. Tech Times, New York [Online], 14 agosto 2015. Disponível em: http://www.techtimes.com/articles/76546/20150814/godzilla-el-ni%C3%B1o-brewing-in-the-pacific-could-be-one-of-the-strongest-on-record-forecasters-warn.htm

Barbosa, R.I. & Fearnside, P. 2000. As lições do fogo. Ciência Hoje, 157: 35-39. Disponível em: https://www.academia.edu/1188684/As_li%C3%A7%C3%B5es_do_fogo

Junges, L. 2010. As maiores inundações e enchentes no Brasil e em Santa Catarina. ANotícia, Joinvile [Online], 08 abril 2010. Disponível em: http://wp.clicrbs.com.br/anverde/2010/04/08/as-maiores-inundacoes-e-enchentes-no-brasil-e-em-santa-catarina/?topo=84,2,18,,,84&status=encerrado

Nobre, C.A. 2011. Por trás da seca na Amazônia. Le Monde Diplomatique Brasil, São Pulo [Online], 03 janeiro 2011. Disponível em: http://www.diplomatique.org.br/artigo.php?id=847

Schiesti, S. 2013. Enchente em Santa Catarina: tragédia no Estado completa 30 anos. Notícias do Dia, Florianópolis [Online], 07 julho 2013. Disponível em: http://ndonline.com.br/florianopolis/noticias/84641-enchente-de-1983-tragedia-natural-em-santa-catarina.html