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Na Web No BLOG AMBIENTE ACREANO

28 abril 2015

FLAUTA DE PAN MARAVILLOSA

24 abril 2015

LEIS EM MOVIMENTO

Displicente, o Senado aprovou o nome de Dias Toffoli, ao qual faltava o “notório saber” para ocupar uma cadeira no STF. Agora, os senadores enfrentam um desafio distinto: o nome escolhido por Dilma tem indiscutível “notório saber”, mas sua “opção política” não expressa um exercício individual de cidadania, mas uma militância específica na arena do Direito.

Demétrio Magnoli/O Globo



O Senado sabatinará o jurista Luiz Edson Fachin, indicado por Dilma Rousseff para a cadeira vaga no STF desde a renúncia de Joaquim Barbosa. O fato de que Fachin fez campanha para Dilma, em 2010, não o desabona. “Ele manifestou uma posição política, votou na presidente”, disse o senador tucano Álvaro Dias, para explicar: “O que deve prevalecer não é a opção política circunstancial” mas “o notório saber jurídico, a reputação ilibada e a independência de quem vai julgar”. De fato, em 2002, o Senado aprovou a nomeação de Gilmar Mendes por FH e, em 2009, a de Dias Toffoli por Lula, sem impugnar a “opção política circunstancial” de nenhum dos dois. O problema é que, no caso de Fachin, a “opção política” não expressa um exercício individual de cidadania, mas uma militância específica na arena do Direito.

“Tenho em minhas mãos um manifesto de centenas de juristas brasileiros que tomaram lado”, discursou Fachin cinco anos atrás. “Apoiamos Dilma para prosseguirmos juntos na construção de um país capaz de um crescimento econômico que signifique desenvolvimento para todos”. Há algo extraordinário quando juristas assinam coletivamente um manifesto político. Manifestos de intelectuais, economistas ou sambistas são só opiniões. Por outro lado, um “partido de juristas” tem o condão de ameaçar uma ordem jurídica fundada sobre o alicerce da neutralidade da Justiça. É isso que deveria acender uma luz de alerta no plenário do Senado.

O “partido de juristas” que escolheu Fachin como seu porta-voz não é o PT, como imaginam tantos espíritos simplórios. O “lado” dos juristas “que tomaram lado” é o da mudança política e social pelo Direito, à margem da vontade majoritária refletida pelo voto popular. “Se o conselho que se dava aos juízes antigos da Itália era não use a testa, use o texto, hoje a máxima pode ser reinventada para use a testa, não esquecendo do texto e seu contexto”, escreveu o indicado de Dilma em artigo recente. Obviamente, o juiz tem a prerrogativa de interpretar a lei à luz de princípios gerais e circunstâncias singulares. Contudo, de acordo com Fachin, os juízes, como coletividade que tem “lado”, devem abrir as portas para o futuro, guiando a sociedade numa direção virtuosa.

O STF é o guardião da Constituição. Fachin, porém, atribui poucos méritos ao texto constitucional. Num ensaio para a “Revista de Direito Brasileira”, publicado em 2011, ele menciona “a Constituição que não vimos nascer”, qualificando o processo constituinte da redemocratização como “uma promessa” que “se converteu em ausência” pois “nela, o que de pouco Marx havia deu lugar a muito Tocqueville”. O fracasso, teoriza, decorreu de um recuo, “a nostalgia da primeira modernidade”, que o jurista entende como primado do indivíduo sobre o coletivo e do mercado sobre os direitos humanos. Não há nada de errado com a crítica acadêmica à Constituição, mesmo quando exprime impulsos autoritários. Outra coisa, bem diferente, é introduzi-la na Corte Constitucional.

Segundo a tese de Fachin, o “leito de Procusto” do Direito é a economia de mercado, pois “a compra e venda que tudo transforma em mercadoria” interpõe-se “entre os significados da equidade, democracia e direitos humanos”. Na sua visão, a prevalência do mercado “afasta o Estado-legislador do centro dos poderes e intenta limitar o Estado-juiz a retomar-se como bouche de la loi” (isto é, numa antiga expressão pejorativa, como mero arauto da lei). O ideal do jurista, camuflado na floresta de uma retórica hermética, é a concentração do poder no Estado e a autonomia dos juízes para implodir o “leito de Procusto”.

O ativismo judicial de Fachin não encontra limites. Se, como imagina abusivamente, nosso arcabouço legal não é muito mais que uma reprodução das leis do Estado liberal do século XIX, a solução seria fabricar, pela vontade dos juízes, uma nova Constituição. A Carta de 1988 “proclama erradicar a pobreza” e “reduzir as desigualdades”, mas “não constrói searas de soberania popular”, acusa no mesmo ensaio, para indicar o caminho: “É evidente que uma Constituição se faz Constituição no desenrolar de um processo constituinte material de índole permanente”, pelo recurso a “ações afirmativas” e pelo “resgate de dívidas históricas”. Se os senadores aprovarem o nome de Fachin, estarão dizendo que deve ser atribuído ao STF um poder constituinte.

O horizonte de um “processo constituinte” de “índole permanente” é um tanto assustador. A filósofa Hanna Arendt enfatizou que, nas ideologias totalitárias, o movimento é tudo e “o próprio termo lei mudou de sentido: deixa de expressar a estrutura de estabilidade dentro da qual podem ocorrer os atos e os movimentos humanos para ser a expressão do próprio movimento” (“Origens do totalitarismo”). Seria ridículo apontar em Fachin um cultor do totalitarismo. Contudo, sua aversão à “estrutura de estabilidade” da legislação e sua obsessão por “searas de soberania popular” criadas pelo gesto soberano do juiz não podem passar em branco numa sabatina digna desse nome.

O “partido dos juristas” almeja reescrever a Lei, interpretando livremente os princípios gerais do Direito para dinamitar as heranças constitucionais da “primeira modernidade”. E eles querem operar acima e além dos limites definidos pela separação de poderes: “Quando (...) o Judiciário se vê compelido a debater questões de poder, assacam-lhe de pronto a crítica (...) do ativismo judicial”, reclama Fachin, sem se dar conta de que o povo elege o presidente e os legisladores, mas não elege juízes.

Displicente, o Senado aprovou o nome de Dias Toffoli, ao qual faltava o “notório saber” para ocupar uma cadeira no STF. Agora, os senadores enfrentam um desafio distinto: o nome escolhido por Dilma usa um indiscutível “notório saber” para contestar a ordem constitucional e as prerrogativas do Congresso. É hora de dizer “não”.

23 abril 2015

JOGANDO PARA A GALERA

Evandro Ferreira
Blog Ambiente Acreano

É impressionante a capacidade de alguns políticos que elegemos de tentar, a todo custo, burlar o regime jurídico vigente no país. Junte isso à fama de corruptos que alguns deles carregam e o resultado é inominável.

A iniciativa de alterar a constituição para limitar o número de ministérios no poder executivo é um dos melhores exemplos. Inimigo declarado da Presidente Dilma Rousseff, o presidente da Câmara Federal, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), por mera birra, está patrocinando essa causa natimorta apenas para fazer média com a opinião pública.

A proposta é inconstitucional na sua gênese e essência porque representa uma clara violação do princípio de independência dos poderes vigentes no Brasil desde a Carta Imperial de 1824. Na constituição atual ele está disposto no artigo 2º e expressa que "são poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário".

Se a proposta de Eduardo Cunha fosse colocada em prática, o próximo passo de políticos do naipe do parlamentar carioca certamente seria determinar o fechamento de alguns Tribunais Federais Brasil afora, usando como justificativa o fato de eles estarem investigando os políticos em demasia.

E como esses achacadores travestidos de políticos estão ‘jogando para a torcida’? É simples. Não obstante a sua ilegalidade, o grupo de Cunha, com maioria de votos na Câmara e no Senado, aprovará a proposta que será enviada, como toda legislação votada no Congresso, para sanção presidencial. E o que a presidência da república fará, considerando a legislação em vigor no país? Vetará a proposta porque ela fere um princípio constitucional fundamental.

A repercussão desse veto é que será o 'pulo do gato'. Com o apoio dos integrantes do Partido da Imprensa Golpista (PIG), capitaneados pela Globo, Veja, Folha de S. Paulo e Estado de S. Paulo, a turma liderada por Eduardo Cunha denunciará que a "presidência trabalha para afundar o país ao vetar uma medida austera em tempos de crise econômica".

É claro que esse falso arroubo moralista desses políticos menores monopolizará as primeiras páginas dos jornais, sites de internet e telejornais. E nas redes sociais milhares de 'zumbis' - os analfabetos eletrônicos sem senso crítico - irão compartilhar e espalhar como ilegal, um ato legal da presidência do país.

Os zumbis a que me refiro são as pessoas que viraram massa de manobra de políticos golpistas e defensores de interesses escusos e que recentemente foram às ruas pedir o impossível juridicamente: o impeachment da presidente. Enternecidos com as manifestações, os políticos que as incentivaram estão aprovando no Congresso um projeto que regulamenta os contratos de terceirização que causará prejuízos econômicos e trabalhistas para a classe operária do país. É um pagamento e tanto para quem caiu na conversa mole desses políticos. Você leitor não é de cair nesse tipo de conversa mole não é mesmo?

Os ataques à nossa constituição movidos por corporativismo de funcionários públicos, birras e disputas políticas pequenas me causam preocupação. Se essas tentativas de mudanças prosperarem, ficará faltando pouco para o Brasil virar uma Republica Dominicana. Explico: na constituição do país caribenho está escrito que durante as eleições os homens votam pela manhã e as mulheres pela tarde. É mole? Agora imaginem o que esse pessoal, na ânsia de atender interesses classistas ou escusos, não será capaz de colocar em nossa constituição?

Foto: Editora Abril

22 abril 2015

‘ESTRADAS PARA A DESTRUIÇÃO’ NO INTERIOR DO ACRE

Evandro Ferreira
Blog Ambiente Acreano
[Revisado e corrigido em 22/04/2015]

Já faz alguns anos que políticos em campanha fazem promessas de abrir estradas para ‘tirar do isolamento’ as cidades de Santa Rosa do Purus, Jordão, Porto Valter e Marechal Taumaturgo. Detalhe: desde sempre todas essas cidades são acessíveis por rios e as estradas prometidas deverão ser construídas paralelas a esses rios, rasgando áreas de florestas pristinas. 

[Foto ICMBIO/RO]

Esses políticos já deveriam ter aprendido que a abertura de estradas na Amazônia nem sempre é sinônimo de progresso econômico porque na maioria das vezes o caos social e ambiental chega junto com as mesmas. Em Rondônia, aqui ao lado, todas as cidades estão integradas por estradas. O custo dessa integração, entretanto, foi a maior taxa de desmatamento entre todos os Estados da Amazônia brasileira e sob o ponto de vista ambiental a situação em nosso vizinho pode ser classificada como um desastre sem precedentes. No Acre temos um desastre ambiental em gestação: uma estrada ‘pirata’ aberta entre a cidade de Jordão, no alto rio Tarauacá, e a comunidades de Novo Porto, no alto rio Muru. Com apenas 40 km de extensão e cortando terras públicas e particulares, a via foi construída com recursos do governo estadual sem licenças ou estudos de impacto ambiental.

Em diversas regiões do Brasil, onde mais de 50% das cargas trafegam por rodovias, geralmente a abertura de estradas resulta em benefícios à região recém-integrada, com destaque para o acesso a outras cidades com melhores hospitais e escolas, e centros financeiros estruturados. Na Amazônia, entretanto, abrir estradas ligando pequenas comunidades isoladas, como as do interior do Acre, geralmente resultam em problemas ambientais, exploração florestal ilegal, conflitos agrários e violência. Em 2006, quando a ocupação, a exploração e o desmatamento na Amazônia estavam no seu auge, o Mapa da Violência dos Municípios Brasileiros mostrava que cinco das dez cidades mais violentas do país localizavam-se na região.

Uma das primeiras consequências da abertura de estradas na Amazônia é o desmatamento, visto por muitos como um passo indispensável para o progresso. Pesquisas científicas, entretanto, mostram que o desmatamento não é sinônimo de progresso. Um estudo realizado por pesquisadores brasileiros e ingleses publicado em 2009 na prestigiosa revista científica Science concluiu que pessoas em municípios da Amazônia brasileira que derrubaram suas florestas não viviam melhor do que aquelas estabelecidas em lugares onde houve pouco desmatamento. O estudo, que comparou 286 municípios em diferentes estágios de desmatamento, demonstrou que a prosperidade gerada pela destruição da floresta é temporária e caracteriza-se por uma rápida ascensão e queda na economia local. Além disso, regiões muito desmatadas geralmente apresentavam piores IDH (Índice de Desenvolvimento Humano), ou seja, maior analfabetismo e menores expectativas de vida e renda per capita.

Aos que defendem cegamente a ligação terrestre das cidades isoladas do interior do Acre é importante esclarecer que as possíveis vantagens da integração – acesso o ano inteiro, barateamento nos preços dos produtos de primeira necessidade, entre outros – não tem garantia de perenidade. Vejam que dificuldades financeiras dos governos Federal e Estadual deixaram a rodovia BR-364 entre Rio Branco e Cruzeiro do Sul sem manutenção. Resultado: fechamento da estrada – por algumas horas, é verdade – nesse final de período chuvoso. Como as condições econômicas do país não irão melhorar nos próximos meses, essas interrupções poderão ser tornar recorrentes. Se você leitor acredita que em Feijó e Tarauacá o preço dos alimentos de primeira necessidade e dos combustíveis – agora transportados pela BR-364 a partir de Rio Branco – são mais acessíveis que no passado, sugiro uma visita in loco para comprovar que, apesar da maior diversidade e oferta de produtos no mercado, os preços estão na estratosfera e poucos moradores podem adquiri-los de forma regular.

Se por um lado é inegável que a pavimentação da BR-364 facilitou o acesso e diminuiu consideravelmente o custo para chegar a Rio Branco, onde os hospitais e as escolas são mais equipados e de melhor qualidade, por outro parece ser evidente um aumento considerável na violência urbana, pobreza e problemas com drogas nas cidades localizadas ao longo da estrada. As administrações dessas cidades também enfrentam sérias dificuldades financeiras em razão do aumento na demanda por serviços públicos resultantes da expansão urbana provocada pela pavimentação da estrada. Nem a carne vendida nessas cidades é mais barata ou de melhor qualidade. Em Tarauacá, por exemplo, o filé e a picanha são, literalmente, ‘carne de pescoço’ porque os animais abatidos para venda local são, em sua maioria, ‘vacas velhas’ descartadas dos plantéis. Os melhores animais, com carne tenra e de alta qualidade, são enviados para Cruzeiro do Sul e Rio Branco.

Uma avaliação isenta provavelmente mostraria que o custo social do progresso proporcionado pela pavimentação da BR-364 no interior do Acre deve ser muito alto e se vantagens e desvantagens fossem colocadas em uma balança, a primeira não superaria a segunda por larga margem. Ela também mostraria que os maiores beneficiários da estrada são comerciantes de produtos alimentícios de primeira necessidade, combustíveis, materiais de construção, fazendeiros e madeireiros. Em síntese: a minoria que já era rica, ficou mais rica. A maioria da população, especialmente os trabalhadores não qualificados recém-chegados da zona rural que se instalam em bairros periféricos, enfrenta duras condições de vida, sem moradias dignas e sobrevive de subempregos.

Quem paga a construção de estradas em nossa região é a sociedade como um todo e os recursos utilizados nesses empreendimentos não caem do céu ou saem de um poço sem fundo: eles derivam do seu, do meu, dos impostos, taxas e contribuições que pagamos diariamente. É justo continuar pagando por obras públicas que beneficiam de forma excessiva a minoria da sociedade? Vejam o caso da carne em Tarauacá: enquanto a população come ‘carne de pescoço’ os fazendeiros, com a pavimentação da BR-364, ‘economizam e embolsam’ o custo extra que tinham antes para enviar seus animais em estradas precárias aos centros consumidores.

A construção da estrada entre os rio Tarauacá e Muru foi denunciada pelos indígenas daquela região ao Ministério Público Federal alertando que a distribuição de lotes de terra ao longo da mesma beneficia apenas políticos, comerciantes e fazendeiros pressionados pelo ICMBIO a abandonar ocupações ilegais na ‘Reserva Extrativista Alto Tarauacá’. Eles citaram ainda a exploração ilegal de madeira ao longo da estrada e a realização de expedições de caça predatória. Esta situação apenas confirma uma realidade inegável na Amazônia: estradas abertas na região, especialmente em terras públicas, cedo ou tarde passam a funcionar como caminhos para a destruição e apropriação indevida de riquezas naturais.

Mesmo sabendo que as populações das cidades isoladas do Acre são a favor das estradas – porque ficam anestesiadas com a perspectiva de sua abertura –, temos que ser firmes na oposição à construção dessas ‘estradas de destruição’ no interior do Estado. De outra forma, o legado do nosso comodismo para as futuras gerações vai continuar a ser o pior possível: pobreza, violência e destruição ambiental.

18 abril 2015

APREENSÃO DE MADEIRA ILEGAL RENDE MULTA DE R$ 17 MILHÕES

Operação do Ibama realizada na divisa entre o Amazonas e Rondônia já vistoriou mais de 50 áreas com indicativos de desmatamento recente.

Por: Rede Diário de Comunicação/Via Painel Florestal

[Operação Toruk está sendo realizada desde o dia 16 de março nos municípios de Boca do Acre e Lábrea. Foto: Ibama]

O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), em ação de fiscalização da Operação Toruk, apreendeu, no início do mês de abril, um caminhão carregado com 18 toras de madeira (100 m³) e aplicou ao infrator uma multa de R$ 17 milhões. A operação, realizada na divisa entre os Estados do Amazonas e de Rondônia, já vistoriou mais de 50 áreas com indicativos de desmatamento recente.

De acordo com informações do Instituto, a operação, que está sendo realizada desde o dia 16 de março nos municípios de Boca do Acre e Lábrea, tem como objetivo combater o desmatamento ilegal. O caminhão toreiro, apreendido na Terra Indígena (TI) Kaxarari, também continha cem litros de combustíveis (gasolina e óleo diesel).

Segundo o Ibama, a TI Kaxarari é alvo constante de invasão de madeireiros, que exploram ilegalmente madeiras nobres como ipê, angelim, muiracatiara, entre outras. Ao perceber a chegada da equipe de fiscalização, os madeireiros fugiram para a floresta. No caminhão, havia plaquetas utilizadas para identificar tocos e toras de áreas de planos de manejo florestal.

Conforme a assessoria do instituto, as evidências indicam que há um esquema de “esquentamento” das madeiras provenientes da TI, que eram encaminhadas às serrarias da região. O caminhão toreiro foi queimado para impedir a continuação da exploração madeireira ilegal numa área de aproximadamente 3 mil hectares.

O infrator já foi identificado, foi multado em R$ 17 milhões, mas não teve sua identidade revelada. Ele também responderá criminalmente à Justiça Federal por invasão de terra indígena e exploração ilegal de madeira. As toras serão doadas aos indígenas das aldeais Pedreira e Paxiúba, que as utilizarão para melhoria de suas moradias e construção de escolas e postos de saúde. A área de exploração ilegal foi embargada e continuará sob monitoramento do Ibama.


Até o momento, a Operação Toruk, que conta com apoio do Batalhão Ambiental da Polícia do Amazonas, já vistoriou 53 áreas com indicativos de desmatamento recente, totalizando 2.980 hectares, o que equivale a mais de dois mil campos de futebol. Também, foram vistoriadas 27 áreas embargadas anteriormente e lavrados 12 autos de infração, com aplicação de R$ 20 milhões em multas, concluiu a assessoria em nota divulgada no site do Instituto.

17 abril 2015

METANO DA AMAZÔNIA VEM DE REBANHOS E QUEIMA DE BIOMASSA

 Por Júlio Bernardes - jubern@usp.br
Agência USP de Notícias

A bacia amazônica é responsável por 4% a 5% das emissões de metano (CH4) — um dos gases do efeito estufa — em todo o mundo. O dado faz parte de pesquisa do Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (Ipen), entidade associada à USP, que determinou a emissão de metano entre os anos de 2010 e 2013, a partir da coleta de amostras de ar em quatro pontos da região, feita em aviões de pequeno porte. O trabalho da bióloga Luana Santamaria Basso aponta também que o manejo de rebanhos é responsável por 19%, em média, das emissões estimadas para cada um dos locais de estudo, enquanto a queima de biomassa contribui com 8% a 10% da emissão estimada para a área da amazônia brasileira.

O estudo, descrito em tese de doutorado apresentada no Ipen, fez parte de um grande projeto de pesquisa que tem como objetivo entender e determinar as emissões dos principais gases do efeito estufa da Amazônia. “Foram realizadas coletas em quatro localidades distribuídas na Amazônia Brasileira, formando um grande quadrante representando toda a Bacia, próximos às cidades de Santarém (Pará), Alta Floresta (Mato Grosso), Rio Branco (Acre) e Tabatinga (Amazonas)”, conta Luana. “Os estudos procuram observar como a amazônia contribui e quais são os processos que interferem nestas emissões, de modo a compreender como a região pode responder às futuras alterações climáticas”. O trabalho foi orientado pela professora Luciana Vanni Gatti, coordenadora do projeto no Laboratório de Química Atmosférica (LQA) do Ipen.

Na pesquisa foram realizados perfis verticais para as coletas de ar, utilizando aviões de pequeno porte, desde aproximadamente 300 metros (m) da superficie até 4,4 quilômetros (km), nos quatro locais de estudo na amazônia. “Foram realizados quatro anos de medidas continuas em escala regional, quinzenalmente, totalizando 293 perfis verticais realizados”, conta a pesquisadora. “Os perfis verticais são realizados tendo como base um plano de voo, preparado previamente, que indica para o piloto a localização e em quais altitudes devem ser feitas as coletas”.

A coleta tem inicio no ponto mais alto e desce em uma trajetória helicoidal de aproximadamente 5 km de diâmetro. “Os quatro anos de estudo mostraram que a Amazônia atua como uma importante fonte de metano, com uma emissão de 25,4 Teragramas (Tg) por ano”, aponta Luana. “Isso representa de 4% a 5% da emissão global, considerando a área da amazônia brasileira, que é de 4,2 milhões de quilômetros quadrados”.

Origem Antrópica

“Atualmente existem poucos estudos realizados sobre a emissão de metano na amazônia”, diz a pesquisadora. Para estimar algumas contribuições de atividades humanas nas emissões observadas na pesquisa, realizou-se alguns estudos complementares. “Hoje, cerca de 60% das emissões globais de metano são de origem antrópica, ou seja, relacionada com atividades humanas, como por exemplo a criação de rebanhos de animais que emitem metano a partir da fermentação entérica, as queimadas, o cultivo de arroz, entre outras”.

O monóxido de carbono (CO), que foi quantificado na mesma amostra de ar coletada nos locais estudados, foi usado para estimar qual a contribuição da queima de biomassa nas emissões de metano. “Os resultados mostraram que a queima representara entre 8% e 10% da emissão total estimada para a amazônia brasileira”, ressalta Luana. Também foi realizada uma estimativa das emissões provenientes da fermentação entérica e do manejo dos dejetos dos rebanhos de animais ruminantes. “Elas representam em média 19% da emissão de metano estimada para cada local estudado”.

Durante os quatro anos do estudo, foi possível observar uma variação anual das emissões, indicando uma relação com as variações climáticas, como por exemplo a variação da precipitação e de temperatura. “Os resultados obtidos ressaltam a importância da realização de estudos de longa duração, durante períodos de dez anos, por exemplo”, afirma a pesquisadora. “A comparação destes resultados com dados de temperatura, precipitação, número de focos de queimada, dentre outros, ajudarão a obter um melhor entendimento das fontes de metano e também da variabilidade em suas emissões ao longo dos anos, que atualmente não é completamente compreendida”.

Segundo Luana, os perfis de avião mostram a resultante de todos os processos que ocorreram desde a costa brasileira até o local da coleta, mostrando a região Amazônica como um todo, mas não permitem entender exatamente todas as fontes, sumidouros e os fatores que influenciam nestes processos. “Para isto são necessários estudos complementares que mostrem mais detalhadamente o funcionamento de cada compartimento da floresta, por exemplo das áreas alagáveis, dos rios, etc”, aponta. “Os resultados mostraram variações anuais nas emissões, porém é necessário mais tempo de estudo, em torno de dez anos, para poder considerar estas variações e observar uma tendência de aumento ao longo dos anos”.

16 abril 2015

ESPÉCIES DE MADEIRAS NOBRES AMEAÇADAS DE EXTINÇÃO NO MATO GROSSO

Levantamento constatou que o Cedro, Cerejeira e Jatobá estão entre as  31 espécies em estado crítico

Por Ciclo Vivo/M. Barbant, Sema/MT

O Estado do Mato Grosso é um dos que mais desmata em todo o Brasil. Em consequência disso, o território também integra a lista de espécies ameaçadas. De acordo com o Ministério do Meio Ambiente, o Estado concentra 31 espécies de árvores em risco de extinção.

A informação consta nas Listas Nacionais de Espécies Ameaçadas de Extinção, divulgada em dezembro de 2014 pela ministra Izabella Teixeira. Segundo o documento oficial, 2.113 espécies foram analisadas e constatou-se que 31 delas estão em níveis que variam de “Em Perigo” até “Vulneráveis”.

Entre as árvores ameaçadas estão: palmito-juçara, ipê-felpudo, cerejeira, cedro, mogno, jequitibá, jatobá, entre outras. O desmatamento ilegal é a principal causa para a perda das espécies, seja para a própria indústria madeireira, para trocar a floresta por lavoura ou para a construção de empreendimentos.

Com a descrição feita pelo órgão governamental, as espécies identificadas ficam protegidas de maneira integral. Assim sendo, é proibida a coleta, corte, transporte, armazenamento, manejo, beneficiamento e comercialização. O uso das sementes, folhas e frutos, no entanto, está permitido, desde que sejam usadas técnicas de manejo que não coloquem em risco a conservação da espécie.

De acordo com a analista ambiental Hélida Bruno Nogueira Borges, da Coordenadoria de Conservação e Restauração de Ecossistemas (CCRE), da Superintendência de Mudanças Climáticas e Biodiversidade (Subio), da Secretaria de Meio Ambiente do Mato Grosso (Sema), o estudo selecionou somente as espécies arbóreas porque apenas para este grupo existem informações para o Estado. “Espécies arbustivas, herbáceas, cipós e epífitas não foram identificadas na relação do MMA. Isto significa que o número real de espécies ameaçadas pode ser maior que as 31 espécies relacionadas”, disse a analista ambiental.


“As espécies encontradas em Mato Grosso, a partir de agora, precisam de cuidados na autorização de corte em Planos de Exploração Florestal (PEFs) e Planos de Manejo, já que essas práticas eliminam indivíduos e também a variabilidade genética necessária para a adaptação de espécies ao ambiente. O desmatamento ilegal é pior ainda, pois pode eliminar populações inteiras promovendo a extinção local ou regional de espécies de plantas, além disso, precisamos discutir a proposição de planos de proteção visando a conservação dessas espécies”, destacou Hélida Bruno.

ESTRADAS AUMENTARAM DESMATAMENTO EM RONDÔNIA

Por Antonio Carlos Quinto - acquinto@usp.br
Agência USP de Notícias


Pesquisa realizada na Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq) da USP, em Piracicaba, constata que no estado de Rondônia as proximidade das estradas é o principal fator que estimula o desmatamento. O estudo também analisou como a fragmentação da floresta influenciou a extinção local de espécies de mamíferos de médio e grande porte, e alterações na qualidade da água dos riachos locais.

[Imagens de satélite da família Landsat revelam a expansão do desmatamento entre os anos de 1975 e 2011]

As análises e levantamentos compõem a tese de doutorado do ecólogo Rodrigo Anzolin Begotti. “Ao todo foram cerca de quatro anos e meio de estudos e análises de uma área de aproximadamente 55 mil quilômetros quadrados, por meio de imagens de satélite da família Landsat referentes ao período de 1975 a 2011”, conta. A área estudada, segundo o cientista, representa cerca de 23% de todo o estado de Rondônia. Ali existem mais de 12 mil quilômetros de estradas de terra e pavimentadas. “Vale lembrar que o desmatamento de florestas tropicais é uma das principais fontes de emissão de gases do efeito estufa”, ressalta.

Begotti também avaliou como o que restou da floresta influenciou na qualidade da água dos riachos. “Neste caso, analisamos 21 parâmetros físico-químicos da água relacionando-os com a dinâmica do desmatamento, o arranjo espacial e a quantidade de floresta remanescente, além de características físicas das áreas drenadas por esses corpos d’água”, descreve. As análises laboratoriais foram realizadas no Centro de Energia Nuclear na Agricultura (CENA), em Piracicaba. Com esses dados, o pesquisador conseguiu constatar, por exemplo, que a proporção de floresta até a distância de 100 metros dos riachos contribuiu para reduzir as concentrações de alumínio, fosfato, nitrogênio e sedimentos em suspensão, principalmente na estação chuvosa. Esse resultado tem implicações importantes com relação às modificações realizadas recentemente no Código Florestal no que diz respeito à manutenção de vegetação na beira de rios, lagos e nascentes.

Desmatamento histórico

A colonização do estado de Rondônia, como explica o pesquisador, foi marcada o pelos incentivos do governo federal, sobretudo nas década de 1970 e 1980, por meio da concessão de lotes para pequenos agricultores. “Isso levou ao desmatamento de grandes áreas, por parte de milhares de assentados, a maioria vindos das regiões sul e sudeste”, conta. Além disso, ele lembra que àquela época, a derrubada da floresta era condição para que os assentados garantissem a posse de seus lotes, sendo que a caça era a única fonte de alimentação. A coordenação e execução dos projetos de assentamento foi realizada pelo Instituto Nacional de Reforma Agrária (INCRA), utilizando inclusive financiamento do Banco Mundial.

Anos mais tarde, já nas décadas de 1990 e 2000, os agentes do desmatamento mudaram, com a abertura de estradas e de grandes áreas para criação de gado. “Os lucros da produção da carne motivam a abertura de novas áreas e novos desmatamentos”, enfatiza o pesquisador. Begotti conta que o estado de Rondônia possui o sétimo maior rebanho do País com cerca de 12 milhões de cabeças de gado, segundo dados do IBGE. Com a situação incerta no que diz respeito à questão fundiária em algumas localidades, existem até hoje focos de conflito com posseiros e invasores de terras públicas que desmataram uma quantidade de floresta considerável dentro e nas imediações da Floresta Nacional do Bom Futuro, por exemplo.

Ele descreve que, ao longo de 36 anos de monitoramento houve uma perda de floresta da ordem de 24.826 quilômetros quadrados (km²) relacionada, dentre outros fatores, à expansão da malha viária de 3.158 km para 12.863 km de extensão. “Embora a extensão da malha viária não tenha variado de modo significativo quando comparamos as áreas desmatadas recentemente com aquelas do início da colonização de Rondônia, o processo de fragmentação da floresta desmatada nos últimos anos tem sido mais intenso”, lembra o ecólogo.

Entrevistas

As informações sobre as espécies de mamíferos foram coletadas em entrevistas junto a proprietários da região, tendo como referência os fragmentos de florestas dentro de suas propriedades. “Além disso, também visitamos Unidades de Conservação como e Reservas Eextrativistas (RESEX)”, conta o pesquisador. Ao todo, foram examinados cerca de 110 fragmentos de florestas sendo que, em cada um deles foi realizada uma ou duas entrevistas. O estudo compreendeu a região centro norte de Rondônia, englobando cerca de 10 municípios.

[Ainda há as espécies que persistem e resistem, mesmo em áreas cujo habitat florestal foi reduzido]

De acordo com o levantamento, as espécies que estão em maior risco de extinção local nos fragmentos são o tatu-canastra, a onça-pintada, a anta e o tamanduá-bandeira, entre outros, corroborando resultados de outros estudos na Mata Atlântica e na própria Amazônia. “Mas há as espécies de hábitos generalistas que persistem e resistem mesmo em áreas cujo habitat florestal foi extremamente reduzido, como o macaco prego, a paca, a irara e o tatu-galinha”, lembra o pesquisador, ressaltando que “algumas dessas espécies como a paca e o tatu-galinha ainda são caçadas, mesmo nos fragmentos”.

A pesquisa de doutorado O papel dos remanescentes florestais na retenção da biodiversidade e conservação da água em uma paisagem fragmentada na região central de Rondônia foi financiada pela FAPESP por meio de auxílio-pesquisa e bolsa regular. O estudo teve início em 2009 e foi concluído em 2014, no Departamento de Ciências Florestais da Esalq, sob orientação do professor Sílvio Frosini de Barros Ferraz.

Fotos: Rodrigo Anzolin Begotti

15 abril 2015

PLANTAS DA AMAZÔNIA BRASILEIRA SÃO MATÉRIA PRIMA DE PRODUTOS PARA CABELOS

Liana John 
Blog Biodiversa - Planeta Sustentável
   
As duas espécies da Amazônia brasileira são amplamente conhecidas por seus usos tradicionais: do crajiru (Arrabidaea chica) há muito se tira o corante vermelho-vinho para dar vida aos sorvetes, produzidos na Europa inclusive, e do mulateiro-da-várzea (Calycophyllum spruceanum) se obtém chá e banho de assento para o resguardo pós-parto, sobretudo das moradoras de comunidades isoladas. Mas é graças às pesquisas sobre as propriedades e particularidades das substâncias encontradas nas duas plantas que hoje também se fabricam xampus, condicionadores, cremes para tratamento capilar e até tônicos para estimular o crescimento de cabelos.

O crajiru é uma trepadeira de folhas estreitas e longas, fácil de “plantar de galho” como se diz popularmente. É bastante cultivado em jardins e roças. Tanto o corante alimentício como o extrato dos cosméticos são obtidos das folhas, embora os produtos para cabelos não sirvam para tingir, pois o protocolo de extração é diferente.

O mulateiro-da-várzea é uma bela árvore de trinta metros de altura, com tronco liso e reto, de cuja casca se extraem compostos fenólicos antioxidantes e clareadores, usados contra rugas e manchas da pele (leia o post do blog Biodiversa Para rejuvenescer use o escorrega-macaco). Sua área de ocorrência natural se estende pelas várzeas do Acre, Amapá e Amazonas, em concentrações de até 30 árvores por hectare (só para efeito de comparação, as espécies madeireiras devem ter um mínimo de três árvores por hectare para serem exploradas legalmente e o mulateiro tem 10 vezes mais). A madeira é densa e tem bom poder calorífico, por isso é bastante usada como lenha para cozinhar, pelas populações tradicionais.

“Minha família veio da França e Amsterdã nos anos 1890 e se instalou no Acre, antes do Acre ser do Brasil”, conta o químico e empresário Paulo Tasso, justificando, em tom de brincadeira, como nasceu ‘índio de olhos azuis’. Desde criança, ele sempre viu a mulherada tomando chá de mulateiro e passando na pele para não envelhecer. E pode comprovar o efeito nos rostos lisos e sem rugas delas, com destaque para uma tia, Terezinha, hoje com 91-anos-que-ninguém-diz.

Por isso, Tasso investiu numa fábrica de creme facial antirrugas, chamada Casa de Mulateiro. Depois, tomou conhecimento de pesquisas realizadas com as duas espécies – mais de 40 teses de doutorado, só sobre o mulateiro – e criou também uma linha para cabelos, utilizando os extratos e a mucilagem de mulateiro e crajiru, com reforço de amor-crescido (Portulaca pilosa).

O mulateiro é fungicida, o crajiru é bactericida e o amor crescido fecha a cutícula do cabelo e dá brilho. Todos juntos garantem a limpeza e fortificam o couro cabeludo e os cabelos, sobretudo após tinturas à base de formol, amônia, guanidinas, peróxido de hidrogênio (água oxigenada) e hidróxidos.

“Como sou um pouco careca, comecei a desenvolver um tônico capilar para mim, à base de mulateiro e outro ativo vegetal. Deu muito certo – fez nascerem novos fios! – então agora estou preparando o lançamento desse tônico no mercado”, comemora o químico-empresário. Isso deve ocorrer assim que a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) apreciar a documentação, talvez até meados deste ano.

“Todos os nossos produtos são orgânicos, sem parabenos e sem petrolatos”, acrescenta. “O crajiru e o amor-crescido são cultivados e, no caso do mulateiro, que vem da floresta, de árvores nativas, temos o cuidado de acompanhar toda a coleta da casca, feita de modo sustentável por cooperativas do Sul do Amazonas. Queremos ter a certeza de só usar o mulateiro mesmo (sem misturas com outras espécies, como acontece quando não se controla a origem) e em condições ideais, sem fungos, sem resíduos”.


Pelo jeito, a aposta na dupla da biodiversidade amazônica compensa, sobretudo para quem tem problemas cabeludos. Ou melhor, capilares!

14 abril 2015

ANTROPOCENO: A ÉPOCA GEOLÓGICA DO HOMEM (I)

Evandro Ferreira
Blog Ambiente Acreano

Se a história geológica de 4,57 bilhões de anos do nosso planeta fosse condensada em 24 horas de um dia, o homem moderno iria surgir apenas quando faltassem três segundos para a meia noite. Essa breve presença passa a impressão enganosa de que o papel do homem na história do planeta é a de um mero coadjuvante sem maior importância.  Entretanto, a verdade é que o homem, nesses poucos segundos de sua existência geológica, tem influenciado de tal forma as condições naturais do nosso planeta que uma nova época geológica foi proposta para acomodar as mudanças patrocinadas por ele: o Antropoceno ou ‘época da humanidade’.

O termo Antropoceno, uma junção das palavras gregas anthropo-, que significa humano e –ceno, que significa novo, foi originalmente proposto pelo pesquisador americano Eugene Stoermer no início da década de 1980 para se referir aos impactos causados pelas atividades humanas sobre o planeta.  Entretanto, a popularização do termo ocorreu graças ao ganhador do prêmio Nobel de Química, Paul Crutzen. Durante uma conferência científica realizada no México em 2000, depois de ouvir repetidas vezes o presidente do evento se referir à época geológica atual como sendo o Holoceno, iniciada 11 mil anos atrás com o fim da última era glacial ou idade do gelo, Crutzen pediu a palavra e, no calor do momento, afirmou “Precisamos parar com essa história. O Holoceno já ficou para trás. Agora estamos no Antropoceno!”

Para Crutzen era evidente que as mudanças em curso no planeta estavam sendo promovidas pelo homem e não por forças naturais, como as que caracterizam as demais eras, períodos e épocas da história geológica do planeta. Em síntese, a influência das atividades humanas na atmosfera terrestre nos últimos séculos tem sido tão significativa que poderia se constituir em uma nova época geológica. A formalização e o desenvolvimento do conceito de Antropoceno foram explicados por Crutzen e Stoermer no artigo “O Antropoceno”, publicado no ano de 2000 na revista Global Change Newsletter, e por Crutzen, em 2002, no artigo “Geologia da Humanidade” publicado na conceituada revista científica Nature.

É importante considerar, entretanto, que antes de Stoermer e Crutzen, outros autores já haviam abordado os efeitos das atividades humanas sobre a história geológica do planeta. Em 1873 o geólogo italiano Antonio Stoppani cunhou o termo ‘Era Antropozóica’ como sucessora da Era Cenozóica, usando como argumento o aparecimento do homem e as mudanças que ele estava promovendo no planeta.  Em 1879 o geólogo norte-americano Joseph Le Conte sugeriu o nome ‘Psicozoico’. Em 1926 o antropólogo Francês Teilhard de Chardin e o geoquímico russo Vladimir Vernadsky propuseram o termo ‘Noosfera’, por considerar que o poder intelectual humano gerou efeitos que poderiam ser considerados uma força geológica. Mais recentemente, em 1992, o americano Andrew Revkin utilizou o termo ‘Antroceno’ para justificar o fato de a era geológica atual estar sendo moldada pelo homem. Em 1999 o termo ‘Homogenoceno’ foi usado pelo biólogo sul-africano Michael Samways, que argumentou que na atualidade a biodiversidade está diminuindo e os ecossistemas no planeta estão se tornando mais similares.

Embora a adoção do termo Antropoceno pela comunidade científica, considerado tecnicamente mais apropriado, seja quase consensual, a sua inserção na ‘Escala de Tempo Geológico’ oficial pela Comissão Internacional de Estratigrafia da União Internacional de Ciências Geológicas ainda não se concretizou. Esperava-se que isso tivesse acontecido durante 34°. Congresso Internacional de Geologia realizado em 2012 na Austrália, mas não se concretizou. A esperança é que isso aconteça em 2016, durante o 35º Congresso Internacional de Geologia a ser realizado na África do Sul. Sobre essa situação, Paul Crutzen e Christian Schwägerl, um jornalista especializado em assuntos ambientais, afirmam textualmente, em artigo publicado em 2011, que “É uma pena que ainda estejamos vivendo oficialmente em uma época chamado Holoceno. O Antropoceno – marcada pela dominação humana dos processos geológicos, biológicos e químicos na Terra - já é uma realidade inegável. Há evidências de que a mudança de nome sugerida há mais de dez anos está atrasada. Talvez ainda demore um tempo até que o corpo científico responsável pela nominação de grandes períodos de tempo na história da terra - Comissão Internacional de Estratigrafia – se convença da necessidade da mudança. Mas isso não deve nos impedir de ver e aprender o que significa viver nesta nova época do Antropoceno em um planeta que está sendo antropizado em alta velocidade”.

Outro aspecto inconcluso sobre o Antropoceno é a data de seu início. A opinião de alguns estudiosos situa o início dessa nova época geológica entre o final do século 18 e os anos de 1950. O limite temporal mais antigo coincidente com o aperfeiçoamento da máquina a vapor por James Watt, e é considerando como o marco inicial da revolução industrial que promoveu um aumento significativo na quantidade de CO2 e outros gases causadores do efeito estufa na atmosfera do planeta. No século 20 a queima de combustíveis fósseis para a geração de energia para abastecer o parque industrial crescente no planeta só intensificou esse processo. O segundo limite temporal está relacionado com a intensificação dos testes nucleares atmosféricos a partir da década de 50. Testes nucleares, como ressalta David Grinspoon, curador de astrobiologia do Denver Museum of Nature & Science, produzem assinaturas isotópicas e de estruturas geológicas que não podem ser interpretadas de outra forma. Outras opiniões situam o início do Antropoceno no início do Holoceno, há cerca de 8 mil anos, por ocasião da disseminação da agricultura. Essa disseminação resultou no desmatamento em várias regiões do planeta e causou um aumento de CO2 na atmosfera que evitou a ocorrência de uma nova era do gelo. Alguns cientistas sugerem o início em meados do século 20, a partir da aceleração do crescimento populacional no planeta e o consequente aumento do consumo predatório de recursos naturais.

Independente das discussões acadêmicas que tentam determinar a data exata do início dessa nova época geológica, o certo que poucos argumentos podem negar que o ser humano se tornou um agente geológico capaz de causar mudanças marcantes no planeta, da mesma forma que vulcões e asteroides o fizeram no passado. Aceitar esse fato é fundamental porque poderá fazer com que nós possamos refletir e reformular o real papel que desempenhamos no planeta. Um editorial da revista Nature de março de 2015 coloca números preocupantes: desde o final da segunda guerra a população mundial aumentou 180%, o uso de água 215% e o consumo de energia 375%. A revista advoga para que a Comissão Internacional de Estratigrafia insira o Antropoceno na escala geológica oficial porque isso encorajaria uma atitude mental da população importante não apenas para compreender as transformações que estão em curso no momento, mas também para saber como agir para manejar a situação.

Para saber mais:

Araia, E. 2011. ‘Bem vindo ao Antropoceno’. Revista Planeta, 470. Disponível em: revistaplaneta.terra.com.br/secao/reportagens/bem-vindo-ao-antropoceno

Crutzen, P. J. e Stoermer, E. F. 2000. ‘The ‘Anthropocene’. Global Change Newsletter, v.41, p. 17.

Crutzen, P. J. 2002. ‘Geology of mankind’. Nature, v.415 (6.867), p. 23.

Martini, B. 2013. ‘The Anthropocene: Humankind as a Turning Point for Earth’. Astrobiology Magagzine. Disponível em: www.astrobio.net/interview/the-anthropocene-humankind-as-a-turning-point-for-earth

Martini, B. e Ribeiro, C. G. 2011. ‘Antropoceno: a época da humanidade?’ Ciência Hoje, v.48, n.283, p.38-43.

Nature Magazine. 2015. ‘Editorial: All in good time’. Nature, v.519, p.129–130. Disponível em: http://www.nature.com/news/all-in-good-time-1.17074

Zalasiewicz, J. et al. 2008. ‘Are we living in the Anthropocene?’ GSA Today, v. 18 (2), p. 4.

Zalasiewicz, J. et al. 2010. ‘The new world of the Anthropocene’. Environment Science & Technology, v.44 (7), p.2.228.