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Na Web No BLOG AMBIENTE ACREANO

31 outubro 2012

A IIRSA RENASCE COM O NOME COSIPLAN

Carlos Tautz*
Blog do Noblat

Em finais de 2011, a União das Nações Sulamericanas (UNASUL) criou o Conselho de Infra-estrutura e Planejamento (Cosiplan) para implementar o seu Programa de Ação Estratégica e construir 31 projetos de infra-estrutura na região até 2022 ao custo de US$ 16 bilhões.

Agora sob a coordenação do Brasil, a Cosiplan reedita a falecida Inciativa de Integração da Infra-estrutura Física Sulamericana (IIRSA), lançada pelo Brasil no ano 2000 e colocada sob coordenação do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), para disfarçar o evidente desejo brasileiro de ser hegemônico economicamente na América do Sul. E, também, para dar suporte à famigerada Alca, a área de comércio livre que os EUA queriam implantar nas Américas.

A Alca morreu, mas a IIRSA ressuscitou legitimada por uma entidade, a Unasul, que se diz autônoma dos EUA, e ancorada na vontade brasileira se tornar as corporações brasileiras hegemônicas. Tudo com dinheiro público canalizado pelo BNDES, uma vez que o BID não conseguiu tocar aqueles projetos de infra-estrutura de transporte e energia.

O objetivo era, e continua sendo, criar corredores de exportação para os setores de commodities, ampliar a base de exploração de recursos naturais, de mercados de bens e serviços, e harmonizar as normas legais que orientam o comércio sulamericano. Ou seja, para manter exatamente aquele padrão de acumulação concentrador que sempre vigeu na América do Sul.

O plano prioriza quatro projetos de transporte, enquanto coloca em curso as usinas hidrelétricas a serem construídas na selva peruana, fruto do acordo energético assinado em junho de 2010 entre os ex-presidentes Alan Garcia (do Peru) e Lula (Brasil), e a rodovia ligando San Ignacio de Moxos (no departamento de Beni) e Villa Tunari (em Cochabamba), cortando a reserva indígena de Tipnis, na Bolívia.

Nos projetos do Cosiplan, confirma-se a centralidade do BNDES (e por extensão, do Brasil), cuja carteira para a região soma US$ 14 bilhões. Em que pese a retórica de cooperação e integração energética e produtiva, os financiamentos do BNDES priorizam a expansão da economia brasileira, para ampliar as exportações de commodities e a internacionalização de empresas brasileiras do setor, ao passo que os financiamentos do banco aos governos se faz sob a condição de que sejam contratados bens e serviços de empresas brasileiras. As quatro maiores empreiteiras brasileiras (Odebrecht, Andrade Gutierrez, Camargo Correa e Queiroz Galvão) ficam com 80% dos financiamentos do BNDES no exterior.

O Brasil vai assim reproduzindo nos países vizinhos um imperialismo que sofreu dos EUA e da Europa por séculos, mas sempre mascarando suas intenções em retóricas positivas de integração. A prática, entretanto, mostra que os desejos do maior país da região são bem distintos.

 Carlos Tautz, jornalista, coordenador do Instituto Mais Democracia – Transparência e Controle Cidadão de Governos e Empresas - www.maisdemocracia.org.br

30 outubro 2012

FESTA DA FALSA ALEGRIA

O resultado da eleição em Rio Branco fez disparar sinais de alarme entre os dirigentes da Frente Popular.  Até os votos dos ocupantes de cargos comissionados não se materializaram como esperado. O balanço das eleições majoritárias em todo o Estado indica que a oposição levou vantagem e por isso as perspectivas para 2014 não são positivas.

Evandro Ferreira
Blog Ambiente Acreano

O resultado da eleição para prefeito de Rio Branco fez disparar sinais de alarme e luzes vermelhas de alerta para os dirigentes da Frente Popular. As perspectivas da coligação para as próximas eleições majoritárias são absolutamente incertas. Ter nas mãos a máquina estatal e a administração da maior cidade - e colégio eleitoral - do estado não é garantia de nada.

 Mais frustrante para quem coordenou a campanha deve ter sido ver que o grande esforço e investimento financeiro que foi feito para colocar, no dia da eleição, milhares de militantes e veículos para conseguir uma vitória folgada foi em vão. Fazia muito tempo que não se via a Frente Popular se esforçar tanto para vencer uma eleição e a diferença ter sido tão pequena.

A pesquisa de intenção de votos da Contilnet/Delta publicadas na véspera do pleito mostrou corretamente que os eleitores estavam divididos e que a eleição seria decidida por um ou outro detalhe. Isso foi confirmado com a diferença de apenas 2,7 mil votos em favor do candidato vencedor. Uma diferença mínima se considerarmos que 182.982 eleitores compareceram para votar. E o detalhe que decidiu essa eleição parece ter sido os votos dos cerca de 5 mil ocupantes de cargos de confiança instalados na administração municipal e estadual que atuam em Rio Branco.

Esses votos eram a 'reserva estratégica' da Frente Popular e contados como absolutamente certos pela cúpula da frente. Mas mesmo assim, considerando o resultado final da eleição, apenas cerca de metade deles parece ter votado no candidato vencedor. A outra metade não compareceu, votou em branco ou no candidato da oposição. Se este último caso aconteceu, o índice de traição foi extremamente elevado.

O balanço final das eleições majoritárias de 2012 mostra que os candidatos da oposição tiveram cerca de 8 mil votos a mais que os da situação. Em 2010 o atual Governador, Tião Viana-PT, venceu o pleito com uma diferença de cerca de 4,5 mil votos. Em 2012 a oposição tirou essa diferença e colocou uma vantagem de 8 mil votos, indicando que a vantagem em favor da oposição é hoje de pelo menos 12 mil votos.

Para quem tem nas mãos a administração da maquina estatal e da maior cidade do Estado, a vitória de Marcos Alexandre, amplamente ilustrada em sites noticiosos e jornais locais com fotos de militantes e dirigentes da Frente Popular com largos sorrisos, soa, na verdade, como uma falsa alegria. O caminho para uma possível vitória em 2014 se mostra mais difícil do que nunca.

A eleição em Rio Branco mostrou que mais uma vez a população deu um claro recado à Frente Popular, dando mais uma chance para  que ela possa se reinventar e voltar a atuar em harmonia com os anseios das massas.

Imagem: A Gazeta.net

23 outubro 2012

HOMEM, AMAZÔNIA E ECOLOGIA: A CONTRIBUIÇÃO DO PENSAMENTO DE DJALMA BATISTA

Isaac Melo*

Pode-se, sem falso louvor, situar Djalma Batista entre os grandes estudiosos amantes da Amazônia; um amazonófilo, utilizando-se, aqui, da expressão cunhada por Gilberto Freyre para se referir a Leandro Tocantins. A ecologia, posteriormente a integrar as ciências ecológicas, passou a ganhar feições próprias, como ciência, a partir do século XIX, adquirindo expressiva força na década de 1960, com o advento dos movimentos ambientais. Apesar de ser alvo de estudos desde tempos remotos, como os desenvolvidos, na Grécia antiga, por Hipócrates e Aristóteles, referentes à história natural, só mais recente o nosso “grande lar” passou a ser objeto de atenção e estudo científico.

A Amazônia, enquanto grande reserva natural do planeta, desde a lenda das amazonas, propagada pelo relato de Frei Gaspar de Carvajal, em 1542, sempre atraiu sobre si a curiosidade exploratório-científica, sobretudo nos séculos XVIII e XIX, exemplificada, entre outras, pelas clássicas expedições naturalistas de La Condamine (1735), Alexandre Rodrigues Ferreira (1786), Martius-Spix (1817-1820), Bates-Wallace (1848), Agassiz (1865-1866). Inicialmente a natureza exercia o predomínio sobre o fator humano. Aquela era maior do que este, e o absorvia. Daí a expressão de Euclides da Cunha, em princípio do século XX, inebriado pela grandiosidade da selva frente ao homem: “O homem, ali, é ainda um intruso impertinente”. Porém, com o aumento do fluxo humano, entre outros, proporcionado pela migração, somado ao aperfeiçoamento da técnica que permitiu desenvolver novas tecnologias, a Amazônia passou a sofrer considerável impacto sobre o seu meio natural. O que antes parecia ser inviolável, indobrável, mostra-se um complexo sensível às intervenções humanas desmedidas. A Amazônia passa então a necessitar ou a exigir uma ética que regule e oriente o agir humano sobre ela. A ecologia ou as ciências ecológicas vem colaborar, nesse primeiro momento, para tal reflexão, ao conceber o homem em interação com toda a biosfera.

Djalma Batista (1916-1979) encontra-se entre aqueles que vem colocar a Amazônia na grande pauta da reflexão nacional e mesmo internacional, num momento em que a própria Amazônia passa a ser alvo da cobiça internacional, frente ao descaso governamental brasileiro, que, pode-se afirmar, não sabia como integrá-la ao restante do país. Cientista, pesquisador, escritor, literato, homem de profunda cultura, Djalma, arguto nas observações e rigoroso nos registros, distancia-se do pensamento romantizado acerca da Amazônia para lançar um olhar mais acurado e crítico, com embasamento científico, às grandes questões que se apresentavam à complexa realidade amazônica.

Médico formado pela famosa Faculdade de Medicina da Bahia (1939), quando de seu retorno à Amazônia, aos 23 anos, lança-se ao estudo dos diversos problemas que assolavam a região, entre os quais, as doenças tropicais, a hanseníase e a tuberculose, onde alcança resultados notáveis. Quando mais adiante assume a direção do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA), de 1959 a 1968, irá reclamar a necessidade do desenvolvimento tecnológico da região aliado ao desenvolvimento cultural de seus habitantes.

A Amazônia de Djalma ainda é, em grande parte, desconhecida cientificamente, por isso ele afirmava que “a Amazônia, se não é o infinito, é pelo menos o indefinido” (2003, p.65), por isso a necessidade de pesquisadores para descerrar o ‘véu de Ísis’ que envolvia a região, hoje, em parte, desnudada pelos modernos satélites que exibem, com precisão, detalhes dos lugares mais remotos da planície amazônica. Por isso afirmava que a natureza amazônica não estava suficientemente conhecida e estudada, o que ainda persiste.

Djalma não encarava a Amazônia segundo os critérios tradicionais da geografia física, política ou continental, mas a partir da geografia humana. Logo percebeu o ponto nevrálgico da ocupação amazônica. Para ele, toda a história da Amazônia tinha sido, até aquele momento, uma colonização desorganizada, em que a produção extrativa era a base de todo erro estrutural da economia, devido sua condição arcaica. Compreendia que todo o processo de ocupação tinha sido uma aventura, a serviço de empreendimentos mercantis, que começaram desde a primeira hora. “A ocupação da Amazônia, nos moldes de uma política meramente imediatista, é propriamente um crime”, ressaltava o cientista (cf. 1976, p.128).

Acerca do boom gomífero, a borracha, Djalma afirmava que esta era o verdadeiro símbolo da Amazônia, contemporaneamente, cujas oscilações constituiram o fluxo e o refluxo das marés sociais e econômicas. Entrevia, no entanto, a transposição desse símbolo para o rio, em perene movimento, sempre adiante, a insinuar, a exemplificar, a impor a atividade. Hoje diríamos as rodovias, e mesmo, o transporte aéreo. Segundo ele, o alvorecer promissor de um ciclo de cultura na Amazônia, proporcionado pela borracha, não correspondeu totalmente à expectativa, pois, na economia permanecemos sempre extrativistas e predatórios, e não principiamos sequer a construir uma economia no sentido capitalista; na alimentação, deixamos os enlatados, porém, continuamos a receber quase tudo de fora, o que poderia ser cultivado em nossas terras; o comércio em geral ainda não era comércio, mas puro escambo, troca de mercadorias por gêneros. Além disso, a condição de vida do povo, em geral, não havia progredido.

O resultado da época do fastígio, a toda a Amazônia, segundo Djalma, teria sido um certo quê de novo-rico, ou de aristocrata arruinado, que levou a exibicionismos e exteriorização muito além das reais possibilidades do meio. Da saga da especiaria aliada à exploração gomífera surgiu um sacrificado, ao mesmo tempo herói e mártir, que era o homem, em cuja defesa Djalma se colocava intransigentemente. Por meio da defesa à natureza, ele chegava à defesa do homem transposto àquelas paragens. Por isso, o pensamento djalmiano se contrapõe a do ‘homem impertinente’, de Euclides da Cunha. Assevera Djalma: “Reanimando o habitante da Amazônia, através da educação, enquanto a paisagem seja defendida, é preciso aprender a tirar, do que a terra possui ou pode dar, com a aplicação de novas técnicas e de nova orientação, as vantagens e os privilégios que não soubemos ou não pudemos até agora valorizar” (1976, p.101). A floresta não é uma redoma de cristal, de aura intocável, ela poder ser manejada de forma racional em favor de seus habitantes. É possível desenvolver, preservando.

Diferente de certos ecologistas radicais hodiernos, para Djalma a floresta não deve constituir uma barreira ao desenvolvimento da Amazônia, mas ser considerada um dos mais preciosos recursos. O que tem de se criar, afirmava o pesquisador, são bases econômicas realmente estáveis, simultâneas a bases culturais, que permitam o progresso da terra e representem boas condições para sua gente, sem que se destruam as potencialidades da terra e sem que o homem seja tentado a emigrar por se sentir abandonado e sem horizontes (cf. 1979, p.291). Lição que ainda não foi assimilada de toda. Depreende-se assim, que o desenvolvimento do homem amazônico encontra-se sempre atrelado à preservação da floresta. Por isso era categórico em afirmar: “é preciso de qualquer maneira defender a ecologia amazônica” (1979, p.25).

A preservação da floresta se conjugaria com o desenvolvimento cultural do povo. Djalma atacava o subdesenvolvimento cultural como um dos principais problemas da Amazônia a ser superado: “O que sei é que o importante, na Amazônia, é preparar o povo para procurar suas próprias soluções, criadas pela experiência de seus homens devidamente esclarecidos e amadurecidos, sem cópias nem modelos alienígenas” (1976, p.213). É claro que numa reflexão atualizada, o subdesenvolvimento cultural, apesar de não está superado, poderia ser substituído pelos grandes latifúndios agro-pecuários que devastam e dominam, rápido e assombrosamente, grandes áreas na Amazônia. Por isso Djalma pregava a necessidade de se criar uma consciência da importância da natureza amazônica, que deve ser conhecida e amada, para poder ser defendida na sua ecologia, isto é, nas relações que os seres têm de guardar entre si, partindo do homem, que é o comandante lógico de todo o processo transformador.

A educação assume um lugar de destaque no pensamento djalmiano. A cultura amazônica declinava, afirmava ele, pois havia se chegado a um nível de cultura muito baixo. Por isso os seus esforços, para o estudo do “complexo amazônico”, de formar pesquisadores locais, acrescidos aos de fora, enquanto esteve à frente do INPA. Essa pobreza generalizada, agravada pelo isolamento, teria suas raízes na ausência, pouca oportunidade ou má orientação da educação, e, consequentemente, subdesenvolvimento psicossocial ou sóciocultural. Portanto, para ele, a solução estaria na educação, que levantaria o nível cultural da população, dando-lhe novos horizontes, com a valorização do trabalho e novas perspectivas de vida, que deveria ser boa e digna, em qualquer lugar; estaria também na criação de novas condições econômicas, reduzindo o extrativismo a um número suportável pela natureza, sem que esta se desgastasse de modo ameaçador como estava acontecendo (cf. 1979, p.90), e prossegue até hoje.

A cultura, a que se chegaria pela educação, seria um forte fator para o desenvolvimento e aperfeiçoamento da humanidade: “Estou convicto de que só há uma força, hoje, no mundo, capaz de sustentar os ideais supremos de Liberdade, de Justiça Social e de Paz: é a cultura” (2003, p.97). Djalma prosseguia afirmando que a memória, o raciocínio, a imaginação, o espírito crítico, dependem de exercício, treinamento e estímulo: só eles poderão conduzir à ciência, à arte, à criação literária, à filosofia, ao domínio das ideias e dos fatos, isto é, à cultura, como o patrimônio espiritual de um povo. Ainda acrescentava que essa civilização só poderia surgir de um movimento de cima para baixo, isto é, do homem de estudo para a massa, e com a elevação gradual desta, através de uma sistemática e eficiente divulgação do saber. Se não havia pesquisadores e cientistas, então o que se devia fazer era formá-los. Por isso ele propunha, em primeiro plano, a organização de uma Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras. Como homem de letras, chegou mesmo a expressar: “Precisamos, enfim, de poetas, de muitos poetas na Amazônia, que eternizem no verso os anseios e os sentimentos do povo” (2003, p.94). É incomum ouvir apelos assim vindos do meio científico. Mas Djalma era um devoto do homem diante do altar da natureza.

Acerca da criação de um possível Centro de Estudos Amazônicos, em tom quase poético, Djalma se deleitava com a ideia que este só lhe podia trazer o concurso, inútil porque vazio, despretensioso porque sincero, de sua mocidade, formada no culto devocional e no amor afervorado pela terra e pelo homem amazônicos: terra feiticeira e boa, portentosa e triste, que encerra o futuro da humanidade no seu seio carinhoso – no recesso ignoto de suas florestas, onde corre a seiva fecunda de uma botânica intrincada e nova, e toda uma zoologia que assombra e fascina; na trama vascular de seus caudalosos rios; no sistema nervoso de suas cidades, vilas e povoados, vibrando ao toque mágico de suas convulsões potâmicas, geológicas e econômicas (cf. 2003, p.12).

Naquele momento crítico da história brasileira, em que o governo militar passou a incentivar a ocupação da Amazônia, Djalma alertava: “Não basta para o Brasil a posse física da Amazônia, urge recuperá-la para a economia e criá-la para a cultura brasileira” (2003, p.94). Isso não queria dizer uma ocupação desorganizada e uma exploração predatória, pois o que mais o impressionava constantemente naquele momento era o desmatamento desmedido, contra o qual ergueu sua voz veementemente. Por isso ressaltava que tudo nos cumpre fazer para defendê-la, e, defendendo-a, desenvolvê-la. Considerava uma estultície pensar em reduzir toda a riqueza amazônica a dinheiro, porque, em troca dele, teríamos o deserto. Além disso, a floresta comporta valor em si mesmo. A grande esperança continuava sendo, entretanto, o despertar da consciência ecológica, assegurava.

Por fim, decorridos mais de três décadas da publicação de sua principal obra, O Complexo da Amazônia (1976), e de seu falecimento (1979), seu pensamento ainda permanece uma verdade que não se esgotou e um testemunho que não envelheceu. Um homem que levantou ardorosamente a bandeira da preservação da Amazônia, num momento em que pouco se falava ou se conhecia em relação à ecologia. A Amazônia persiste a necessitar de outros Djalmas capazes de ir além de sua época, na busca de solução e empreendimentos que ajudem cada vez mais a garantia de todos ao bem supremo da vida, numa era em que esta se vê constantemente ameaçada. Que a memória de Djalma Batista não se reduza a nomes de avenidas e escolas, mas ganhe a consciência dos homens, de quem foi defensor intransigente, pois “asseguro que nada mais sou que um dos que muito desconhecem a Amazônia, pertencendo, no entanto, ao grupo dos que almejam entendê-la e defendê-la”. O que fez de modo ímpar.

Referências

Batista, Djalma. O complexo da Amazônia: análise do processo de desenvolvimento. Rio de Janeiro: Conquista, 1976.

Batista, Djalma. Amazônia, Cultura e Sociedade (Org. Tenório Teles). Manaus: Editora Valer, 2003.

* Isaac Melo, natural de Tarauacá, terra natal de Djalma Batista, é formado em Filosofia pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná. Reside em Curitiba – PR.

16 outubro 2012

DOUTORADO INTERINSTITUCIONAL INPA-UFAC APROVADO PELA CAPES

 Evandro Ferreira
Blog Ambiente Acreano
*Corrigido em 17/10/2012
Foi divulgado no site da CAPES no dia 05/10 a aprovação da proposta conjunta do INPA e da UFAC de implantar um curso de Doutorado Interinstitucional na área de Ciências de Florestas Tropicais no Acre.

O curso tem previsão de oferecer 15 vagas, com inscrições para a seleção dos candidatos devendo ocorrer em janeiro de 2013 e o início do semestre letivo em março.

É importante ressaltar que a UFAC estará oferecendo, em conjunto com o INPA o melhor programa de Doutorado na área de engenharia florestal de todo o Brasil. O curso do INPA tem nota 5 na CAPES, e apenas os programas da USP, em Piracicaba, de Viçosa e Lavras, em Minas Gerais, e da Universidade Federal de Santa Maria, no Rio Grande do Sul possuem notas similares.

A realização do referido curso na UFAC é importante não apenas para formar pessoal local em uma área estratégica para o Estado, mas também para ajudar o quadro docente da UFAC a melhorar ainda mais seu desempenho científico. Isso é fundamental para que nos próximos anos a mesma possa contar com um quadro de professores de alto nível, com produção científica elevada, que viabilize a formalização de propostas institucionais de mestrado e doutorado na área florestal.

Apoio do Senador Jorge Viana

Em meados de 2011, quando a idéia da realização do curso de pós-graduação na área florestal foi consolidada entre o pessoal do INPA no Acre, INPA em Manaus e da UFAC, via professores que atuam no Parque Zoobotânico, ficou decidido que o grupo que estava à frente da proposta iria viabilizar apoio financeiro para conseguir ter a infra-estrutura necessária para a realização do programa.

Além da apresentação de projetos específicos para Editais do CNPq, CAPES e outras agências de fomentos, o grupo decidiu buscar apoio do Senador Jorge Viana, um Engenheiro Florestal, que, durante os anos em que administrou o Estado, foi o responsável pela criação e implantação do curso de graduação em Engenharia Florestal na UFAC.

O Senador ficou lisonjeado e não deixou escapar sua emoção de ter sido escolhido para apoiar a proposta. Desde então, o grupo responsável pela implantação do programa de pós-graduação tem trabalhado com a equipe do Senador para que o sonho da infra-estrutura para o funcionamento do programa se torne uma realidade.

Programa ajudará corpo acadêmico da UFAC

A recente negativa da CAPES em aprovar programas de mestrado e doutorado institucionais da UFAC tem como principal causa a falta de produção científica mínima exigida pela CAPES. A realização do Dinter UFAC-INPA ajudará a UFAC a superar essa deficiência.

Experiências similares da UFAC com a a Fundação Osvaldo Cruz resultaram na institucionalização, em 2008, do programa de mestrado em Saúde Coletiva. A colaboração do INPA com a UFAC poderá render frutos similares caso a parceria se estenda para a planejada criação do programa de mestrado em Ciências Florestais. 

O INPA e a UFAC mantém acordo de cooperação técnica e científica há mais de 30 anos, sendo um dos primeiros frutos da parceira a criação do Parque Zoobotânico, hoje um importante centro de pesquisas da UFAC.

Clique aqui para acessar o site da CAPES e ver os programas de Mestrado e Doutorado Interinstitucionais aprovados em outubro de 2012.

04 outubro 2012

O NOVO CÓDIGO FLORESTAL E AS MATAS CILIARES

Evandro Ferreira* Antônio Ferreira de Lima**

Matas ciliares são formações vegetais que crescem nas margens de rios, igarapés, lagos, açudes, barragens e nascentes. Embora existam outras denominações para essas formações vegetais, tais como florestas ripárias, matas de várzeas e florestas de galerias, sob o ponto de vista legal, o novo Código Florestal as denominam de “áreas de preservação permanente”.

A definição das regras para a preservação e a recuperação dessas importantes formações vegetais foi objeto de uma verdadeira guerra entre parlamentares ambientalistas e ruralistas no Congresso. Os últimos impuseram sua vontade, diminiundo a largura da vaixa de mata ciliar a ser preservada, mas a presidente Dilma Rousseff vetou suas aspirações. O veto da presidente, que alargou novamente a faixa de mata ciliar a ser preservada, foi publicado na forma de Medida Provisória (MP571) e teve que ser remetido ao Congresso para apreciação e as alterações propostas pela presidente foram modificadas pela bancada ruralista - que mais uma vez diminui a largura da faixa de mata ciliar a ser preservada. Os assessores da presidente já deixaram claro que ela poderá vetar a matéria uma vez mais. Esta falta de consenso está criando um perigoso impasse que poderá retardar ainda mais a entrada em vigor do novo Código Florestal.

Mas qual a razão de tanta briga por causa das matas ciliares?

A destruição das matas ciliares no Brasil tem ocorrido em razão do avanço das atividades agropecuárias, da urbanização e da construção de hidrelétricas, para citar apenas alguns dos fatores mais importantes. O legado positivo decorrente da degradação das matas ciliares tem sido o aumento da produção agrícola, a expansão das cidades e a disponibilização de energia para fomentar o crescimento econômico - geração de emprego e renda para a população. Entretanto, a sociedade brasileira tem pago um alto preço por esse progresso - quase sempre desor-denado - porque as matas ciliares desempenham importantes papéis hidrológicos e ecológicos.

A supressão da mata ciliar favorece o escoamento superficial da água da chuva e dificulta a sua infiltração no solo para abastecer o lençol freático. Isso prejudica o acesso à água para a grande massa de habitantes mais pobres que ainda depende da captação desse líquido via poços, afeta as nascentes, córregos e, em última instância, os grandes cursos de água que abastecem as cidades.

A mata ciliar funciona também como uma proteção natural contra o assoreamento dos cursos de água, pois sem a sua proteção a água da chuva que escorre na superfície do solo carrega sedimentos para dentro dos rios. Com o tempo, o leito dos rios se eleva e a sua capacidade de escoamento fica reduzida. Nas áreas urbanas o assoreamento faz com que, ano após ano, os rios fiquem cada vez mais rasos no período da seca. No período das chuvas, uma intensificação e concentração das mesmas em um curto espaço de tempo provocam transbordamentos, as famosas alagações, mesmo que a quantidade anual de chuvas não seja significativamente maior do que o normal.

A supressão das matas ciliares prejudica a formação de corredores naturais para a fauna e a flora nativas, impossibilitando o deslocamento, dispersão e reprodução dos animais e plantas, resultando na diminuição da biodiversidade local. Além disso, a mata ciliar funciona como um filtro natural para a água que chega aos cursos de água, tornando-a mais limpa, fato que favorece a fauna e flora aquática e facilita o tratamento da mesma para consumo humano.

Embora não tenhamos citado, as situações descritas acima se encaixam perfeitamente ao que tem ocorrido em Rio Branco e no Rio Acre. Ano após ano, a captação de água nesse rio para o abastecimento de nossa cidade durante o período seco tem sido mais difícil em razão do seu assoreamento. E o custo para tratar sua água extremamente barrenta é muito elevado. Estamos quase convencidos que o Rio Acre não poderá garantir o abastecimento de água para nossa cidade no futuro. E um preço alto vai ser pago para se encontrar uma alternativa para isso.

Alguns podem argumentar que isso já foi resolvido e que o aquífero do segundo distrito tem água suficiente e com baixíssimo custo de extração. Duvido. Quem vai controlar a extração se os responsáveis por isso, por razões políticas, se recusam a instalar hidrômetros para controlar a atual exploração desenfreada? Quem vai garantir que o aquifero não irá ser contaminado pela expansão urbana e industrial naquela região - cidade do povo e agregados urbanos que surgirão no local, novo distrito industrial? Está certo que custa caro separar água do barro - como é feito hoje com a água do Rio Acre -, mas com certeza, é mais caro tratar quimicamente água contaminada por esgotos e outros poluentes industriais.

A crise de água que os habitantes de Rio Branco vivem de forma recorrente durante as estiagens é reflexo direto da destruição da mata ciliar do Rio Acre. Estudos científicos mostram que ao longo de todo o curso do rio, desde sua nascente no Peru até sua foz em Boca do Acre, Amazonas, 32% de suas matas ciliares já foram eliminadas. Em território acreano, esse percentual já atingiu 32%. No município de Epitaciolândia a destruição beira os 60% e em Rio Branco já ultrapassou os 40%.

Com tantos benefícios sociais, econômicos e ambientais, porque lutar para atravancar a conservação e recuperação das matas ciliares como alguns congressistas estão fazendo em Brasília? Para garantir 5-10 m adicionais de áreas de pastagens em suas propriedades? É isso? Ou é apenas para mostrar que são poderosos, que jamais darão o braço a torcer para os ambientalistas e que podem fazer o que bem entendem para atender os seus interesses e de seus financiadores?

Um eventual veto da presidente Dilma às modificações efetuadas na MP571 pelos ‘radicais do agronegócio’ do Congresso pode resultar em uma inédita guerra entre o legislativo e o executivo. Caso isso venha a acontecer, esperamos que os congressistas acreanos não nos envergonhem e cumpram o seu papel, usando o bom senso e o espírito cívico para garantir que a nova legislação florestal brasileira proteja efetivamente as nossas matas ciliares.

Seus potenciais eleitores residentes em Rio Branco agradecem.

* Evandro Ferreira é engenheiro agrônomo e pesquisador do Inpa/Parque Zoobotânico da Ufac.
** Antonio Ferreira de Lima é discente do curso de Engenharia Florestal da Universidade Federal do Acre.