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16 dezembro 2011

AGROPECUÁRIA AMEAÇA CERRADO E AMAZÔNIA NO PA E MA, DIZ IBGE

Instituto divulgou mapas sobre vegetação e uso da terra em três estados. Dados apontam redução do cerrado e pressão da pecuária sobre florestas.

Eduardo Carvalho Do Globo Natureza, em São Paulo

Novos mapas que mostram a vegetação e uso da terra divulgados nesta sexta-feira (16) pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostram a atividade agropecuária como predominante nos estados do Sergipe, Maranhão e Pará, sendo os dois últimos inseridos na Amazônia Legal, e apontam ainda ameaças ao cerrado e à floresta amazônica devido às atividades humanas.

A representação faz parte de uma série temática produzida pelo instituto que mostra os recursos naturais de todos os estados da Amazônia legal, elaborados a partir de informações obtidas em trabalhos de campo e imagens de satélite até 2010.

Segundo o levantamento, a área de cerrado no Maranhão, inserida dentro da nova fronteira agrícola (perto das cidades de Balsas e Fortaleza de Nogueira), perdeu 24,1% de sua cobertura vegetal desde a década de 1980 devido à atividade agropecuária (pastagens plantadas e lavouras de soja). A área original de 74.288 km² foi reduzida para 57.130 km².

“O perigo maior é onde essas plantações estão acontecendo. Historicamente, o cerrado maranhense na região centro-oeste do estado já era ocupada pela pecuária extensiva, que foi acrescentada pela cultura da soja. Mas agora, existe perigo porque as plantações estão ocorrendo em áreas de chapadas no sul do Maranhã, onde estão as nascentes de rios”, disse Pedro Bezerra, gerente de Recursos Naturais do IBGE.

“Se acontecer a ocupação no topo das chapadas, a água das chuvas ficará impedida de penetrar no solo, diminuindo o fluxo dos rios e provocando escoamento superficial, que resulta na erosão”, complementa.

Floresta

Outra consequência da ocupação do solo é a redução das áreas de floresta. Segundo o IBGE, atualmente restam 31% da cobertura vegetal densa original (19.707 km²). Entretanto, da área primitiva de floresta aberta na região, quando as árvores estão mais espaçadas e são mais baixas, resta apenas 0,09%. “Onde tinha esta área de floresta, agora há plantações de babaçu, cujo óleo é extraído e utilizado pela população”, disse Bezerra.

A pecuária também está presente em 60% do estado do Sergipe, com foco na cultura de animais de grande porte (bovinos), associada a lavouras de milho, que, segundo o instituto, ocupam grandes extensões do território sergipano nas suas porções central e oeste.

No Pará, o mapa de cobertura e uso da terra apontou que em 19% da área total do estado ocorrem atividades agrícolas, sendo que se destaca a pecuária (187.308 km², o equivalente a 15,2% do estado, considerado o maior criador de búfalos do país e quinto maior produtor de bovinos, segundo o próprio IBGE.

Essas atividades ocorrem, principalmente, no eixo de rodovias como a BR-230 (Transamazônica), BR-163 (Santarém-Cuiabá), BR-010 (Belém-Brasília), além de estradas estaduais.

“A atividade está consolidada na região sudeste do estado, como nas regiões de Redenção e São Félix do Xingu”, disse Joana D’arc Carmo Arouck, engenheira florestal e supervisora regional de uso da terra do IBGE.

As duas cidades citadas estão inseridas no chamado “arco do desmatamento da Amazônia” e foram colocadas na lista dos municípios que mais desmatam o bioma, elaborado pelo Ministério do Meio Ambiente.

[Redenção, cidade do Pará, perdeu grande parte da cobertura vegetal por conta da atividade Pecuária. A cidade tem registrado focos de queimada neste mês em áreas preservadas devido à estiagem. (Foto: Paulo Whitaker/Reuters)]

Pressão

Segundo o IBGE, 77,3% da área do estado é coberto por vegetação natural, sendo que 73% (o equivalente a 909.061 km²) é área de floresta amazônica.

“Deste total de florestas, 57,09% estão em áreas especiais, como terras indígenas e unidades de conservação. São áreas consideradas protegidas, porém, em sua volta, principalmente nas regiões sudeste e sudoeste do estado, já percebemos atividades agropecuárias”, explica Joana D’arc.

Ainda de acordo com o IBGE, 20% do total de florestas ainda não foram classificadas como áreas de proteção e já sofrem pressão pelo avanço das atividades humanas.

“Existe uma ameaça, mas temos que lembrar que o homem precisa consumir para viver. O que queremos ressaltar é a necessidade de haver um manejo sustentável, uma compatibilização entre o ecossistema social e ambiental”, explica.

“O mapa de uso da terra é fundamental para observarmos as mudanças da cobertura florestal e monitorarmos a questão do conflito agrário, existente na região”, complementa a supervisora do instituto.

Abaixo, da esquerda para a direita, novos mapas do Maranhão, Sergipe e Pará divulgados pelo IBGE nesta sexta-feira (Foto: Reprodução/IBGE)

14 dezembro 2011

CARACTERIZAÇÃO ANATÔMICA DAS PINAS FOLIARES DE Astrocaryum murumuru Mart. (ARECACEAE)*

Evandro José Linhares Ferreira (1, 2)

1. Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia - INPA/Núcleo de Pesquisa do Acre.
2. Herbário do Parque Zoobotânico da Universidade Federal do Acre.

INTRODUÇÃO

Os caracteres anatômicos das folhas das palmeiras tem valor diagnóstico não apenas ao nível genérico, mas também ao nível específico e se estima que entre 50 e 60 deles podem ter importância taxonômica, evolutiva ou biológica.

O presente trabalho é uma contribuição ao estudo anatômico das folhas da palmeira murumuru (Astrocaryum murumuru Mart.), uma espécie nativa de grande importância sócio-econômica na Amazônia cuja gordura extraída dos frutos é usada domesticamente para a elaboração de sabão e industrialmente na produção de cosméticos, especialmente cremes para a pele e cabelo. Ela ocorre naturalmente em florestas de várzea ou áreas ocasionalmente alagadas e se distribui por quase toda a Amazônia. No Brasil ocorre desde o Pará até o sul do Amazonas, inclusive Acre e em Rondônia.

É uma palmeira cespitosa, fortemente armada com longos espinhos negros, de pequeno a médio porte e podendo atingir até 15 m de altura. Apresenta 8-15 folhas pinadas, rígidas, com até 6 m de comprimento e 38-133 pinas lineares em cada lado da raque. As pinas estão regularmente arranjadas e dispostas em um plano. Os frutos maduros são amarelados, oblongos a obovóides, com 3,0-8,5 cm de comprimento e 2,0-4,5 cm de diâmetro, o epicarpo é espinuloso ou piloso e o mesocarpo carnoso e oleoso.

METODOLOGIA

Para este estudo foram retiradas amostras de 3 exsicatas do herbário NY (Noblick et al. 5024; Prance et al. 30662; Beck & Souza 273). De cada uma, retirou-se 3-5 amostras de 4-5 cm de comprimento da porção mediana de folíolos da região central das folhas. Amostras, com nervura central (NC) e as margens foliares (MF), foram mantidas glicerina-álcool (70%). A reidratação durou 12-24 horas e incluiu vácuo (12 p.s.i.), 3 lavagens em água deionizada (15 min. cada) e fixação em FAA.

Para o clareamento das folhas, seções de 2-3 cm com a NC e uma das MF foram colocadas em NaOH 5% na estufa (60°C) até o clareamento. No preparo de epidermes, amostras de 1 cm² foram mantidas em solução de Jeffrey (Ácido Nítrico 10% : Ácido crómico 10% + 10 g tetróxido de cromo) por 4-5 dias. As folhas clareadas e as epidermes foram coradas com Safranina (0,5%) e montadas com Kleermount.

Para os cortes transversais, amostras com 1-2 cm, incluindo a NC e uma das MF, foram desidratadas (série alcoólica-etílica ascendente até álcool 100%), emblocadas em parafina e seccionadas em micrótomo rotativo (SPENCER). As secções foram coradas com solução aquosa de Safranina (1%) durante 12 horas e Astra Blue (0,5%) durante 1 hora e montadas com Kleermount. As lâminas foram examinadas e fotografadas em microscópio ótico.

RESULTADOS

Nervura central (NC): proeminente acima; 2-3 camadas de clorênquima; parênquima com 2-5 feixes vasculares grandes e 3-4 feixes menores. Células de expansão: 2-3 camadas conspícuas adjacentes à NC. Pêlos: ausentes. Epiderme: cera epicuticular abundante, persistente, transversal e fusiforme; paredes celulares não sinuosas; células adaxiais costais e intercostais indistintas, romboedrais-retangulares, em filas distintas; células abaxiais distintas. Estômatos: restritos às regiões intercostais da face abaxial, em fileiras de 2-6 unidades; células subsidiárias terminais arqueadas sobre as células-guardas. Hipoderme: 1-camada em ambas as faces, comprimidas acima e abaixo das nervuras maiores. Clorênquima: mesófilo paliçádico em 2 camadas distintas, mesófilo esponjoso em 4-5 camadas compactas. Células de tanino: presentes. Fibras não vasculares: feixes cilíndrico-ovóides, adaxiais. Nervuras primárias: arredondadas, abaxiais, delimitadas por 1-2 camadas fibrosas. Nervuras secundárias: ovóides, proeminentes abaixo. Nervuras terciárias: arredondadas, não proeminentes. Nervuras quaternárias: ausentes. Nervura marginal: proeminente, com 3-6 camadas fibrosas externas. Floema: veias distintas nas grandes nervuras. Nervuras transversais: largas e curtas, formando um padrão irregular.

CONCLUSÃO

A estrutura anatômica dos folíolos de Astrocaryum murumuru é similar a de outras espécies do gênero previamente estudadas (A. gynacanthum e A. jauari). Em comum, as espécies citadas apresentam estômatos dispostos em filas distintas apenas na face abaxial, abundante presença de cera epicuticular na face adaxial e nervuras transversais formando um padrão irregular ao longo da lâmina.

A presença abundante de cera epicuticular nestas espécies Amazônicas de Astrocaryum não é fácil de ser justificada. Essa estrutura usualmente está mais associada com espécies encontradas em ambientes secos ou indivíduos na condição epifítica, pois ela serve como principal barreira protetora contra a perda de água por transpiração excessiva, radiação solar excessiva, ação de patógenos e entrada de contaminantes nos tecidos vegetais. A palmeira murumuru e outras espécies de Astrocaryum da Amazônia são geralmente espécies de sub-bosque que recebem pouca radiação solar direta, e crescem em ambientes temporariamente alagados, portanto, com abundante disponibilidade de água. Por outro lado, a presença de cera epicuticular se justifica nas espécies de Astrocaryum nativas do cerrado brasileiro, onde a disponibilidade de água é baixa e radiação solar elevada.

Palavras-chave: Astrocaryum, anatomia foliar, Palmeira.

*Trabalho originalmente apresentado durante a 63a. Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência realizada em Goiania-GO, em julho de 2011.

13 dezembro 2011

REFUGIADOS NÃO TÊM O QUE FESTEJAR

Cada vez mais os governos, inclusive na Europa, fecham as suas fronteiras e reduzem a assistência para refugiados e para os requerentes de asilo

Christopher Stokes*
Folha de S. Paulo

Os líderes globais se reunirão em Genebra nesta semana para comemorar os 60 anos da Convenção das Nações Unidas relativa ao Estatuto dos Refugiados. Mas os 15,1 milhões de refugiados do mundo não têm o que festejar. Cada vez mais os governos estão fechando suas fronteiras e reduzindo a assistência para refugiados e requerentes de asilo.

A organização humanitária internacional Médicos sem Fronteiras (MSF), que há 40 anos leva assistência a populações vulneráveis, tem acompanhado essa tendência.

A África do Sul, por exemplo, tem proibido a entrada de zimbabuanos sem passaporte no principal posto de fronteira com o Zimbábue. Como alternativa, muitos recorrem a caminhos não oficiais, colocando em risco suas vidas. No primeiro semestre de 2011, MSF tratou de 42 pessoas que haviam sido estupradas durante a travessia.

A própria Europa, onde a Convenção de Refugiados teve início, em 1951, não trata bem as pessoas que buscam asilo no continente. Neste ano, por conta dos levantes populares no norte da África, 57 mil refugiados, requerentes de asilo e migrantes fugiram pelo Mediterrâneo rumo a Itália e Malta.
Estima-se que 2.000 pessoas morreram em alto-mar. Os sobreviventes foram detidos em centros de recepção, forçados a viver em condições extremamente precárias. Em março deste ano, 3.000 recém-chegados tiveram que dormir no cais da ilha de Lampedusa por dias, dividindo apenas 16 banheiros.

Para reduzir o número de imigrantes que chegava ao litoral, o governo italiano rapidamente assinou acordos bilaterais com o novo governo interino da Tunísia e com o Conselho Nacional de Transição da Líbia -apesar da guerra em curso-, com o objetivo de empurrar os requerentes de volta para a África.
A Itália, juntamente com outros países europeus, tomou partido no conflito na Líbia, e por isso tinha uma responsabilidade ainda maior de garantir que as pessoas fugindo da guerra fossem bem recebidas e tivessem acesso aos procedimentos de asilo de forma eficiente e justa.

Atividades médicas e humanitárias têm um impacto tangível, mas limitado, no bem-estar de refugiados, requerentes de asilo e de todos os que fogem da violência ou de colapsos econômicos em seus países de origem. As pessoas estão se movimentando cada vez mais.

Os governos precisam de soluções inovadoras, focadas na proteção dos refugiados, para lidar com a situação dos imigrantes.

Enquanto isso, a Convenção continua sendo a ferramenta mais importante de proteção e assistência a essas pessoas. Só quando todos os governos demonstrarem, de forma ativa, o seu compromisso com elas, por meio de políticas alinhadas com o espírito da Convenção, é que tanto os líderes globais quanto os refugiados finalmente terão um verdadeiro motivo para comemorar.

*Diretor-geral do escritório de Médicos sem Fronteiras (MSF) na Bélgica.
Foto: Altino Machado

10 dezembro 2011

O QUE SERÁ, SERÁ

"Hoje vejo o senador Jorge Viana conseguir, através de sua imensa capacidade de diálogo, negociar uma proposta de código florestal que não é a de seus sonhos ou de muitos de nós, mas certamente é a mais adequada a este momento de nosso país"

Carlos Bernardo de Araujo (Cacá)

Acompanhando a luta do senador Jorge Viana para a elaboração de um novo Código Florestal que, acima de tudo, seja viável e se comunique com o futuro, lembrei do tempo em que militei com alguns companheiros na clandestinidade, entre eles o companheiro Chico Mendes. Principalmente sobre o que, com o decorrer do tempo, passei a compreender acerca de suas idéias e modo de atuação.

Pra quem ainda não sabe, tenho muito orgulho de ter militado com o “Camarada Santos” (codinome utilizado por Chico Mendes no Partido Revolucionário Comunista - PRC). Ele era determinado e persistente na luta pela construção de uma sociedade mais justa, humana e solidaria. Ou seja, sua causa maior se traduzia sempre pela busca por uma vida digna para os povos da floresta. O que dito de outra forma, bem poderia ser traduzido atualmente como “florestania”.

Para isso Chico mantinha um amplo leque de diálogos com diferentes setores da socie-dade. Por vezes eu o julgava indisciplinado por não seguir as regras estritas que o centralismo partidário nos exigia. Mas as idéias de Chico na época, já alcançavam o futuro. Ele não se prendia as regras que tolhiam ou castravam possibilidades para a construção de uma nova sociedade. Para tanto não se furtava em dialogar com segmentos diversos da esquerda, bem como com diferentes setores conservadores. Procurava as instituições governamentais não só para denunciar, mas também para propor. E foi dessa linha de atuação equilibrada, porém firme, que surgiram idéias geniais como a da aliança entre índios, seringueiros e ribeirinhos, ou da cria-ção de reservas extrativistas.

Travou sua luta também através de instituições. Foi vereador eleito pelo MDB em Xapuri, pleiteou a cadeira de deputado estadual pelo PT, flertou com o PV no Rio de Janeiro e se tornou conhecido em todo o mundo, antes mesmo de sê-lo no Brasil. Tudo isso por quê? Porque era um líder do diálogo. Sabia fazer a leitura da realidade. Vivia sonhos atemporais, como quando fez sua famosa carta aos jovens do futuro, mas conhecia bem o chão que pisava. Observando tudo isso compreendi que sua aparente indisciplina partidária, que tanto me incomodava naquela época, na verdade tratava-se de uma extraordinária e avançada visão de futuro.

Hoje vejo o senador Jorge Viana conseguir, através de sua imensa capacidade de diálogo, negociar uma proposta de código florestal que não é a de seus sonhos ou de muitos de nós, mas certamente é a mais adequada a este momento de nosso país. Caso Jorge Viana tivesse sucumbido a adversa correlação de forças representada no Senado Federal, certamente teríamos perdido a grande oportunidade de termos um Código Florestal que avança no presente e nos projeta com muito mais força como uma nação de referência para um futuro ambientalmente sustentável.

Por tudo isso, diria que aprendi, ao longo da vida, observando a atuação do velho e saudoso “Camarada Santos”, algo muito semelhante ao que percebo hoje na atuação do Companheiro Jorge Viana e que já foi magistralmente sintetizado pela prosa do Mestre Guimarães Rosa:

“Nem tudo o que se vê é o que se vê.

Cumpadre, é o que vai se ver”.

(Grande Sertão Veredas)

*Artigo originalmente publicado na coluna Lá e Cá, do jornal a Gazeta.

01 dezembro 2011

A IMPORTÂNCIA DO CULTIVO DE PLANTAS ALIMENTARES EM QUINTAIS DE RIO BRANCO

Evandro Ferreira
Blog Ambiente Acreano

Na Amazônia os quintais urbanos são importantes para a sobrevivência de habitantes pobres da periferia das cidades porque permitem o cultivo de plantas que complementam a dieta e contribuem para a segurança alimentar dos moradores. Na região, já foi observado que muitas atividades agrícolas originalmente praticadas na floresta estão sendo modeladas na periferia das cidades, construindo um novo mosaico agrícola urbano.

No caso do Acre, o intenso êxodo rural dirigido para a sua capital, Rio Branco, resultou na criação de diversos bairros com uma população formada por numerosos ex-extrativistas de baixo poder aquisitivo mas com grande conhecimento empírico sobre o cultivo de espécies alimentares.

Esta particularidade da capital acreana estimulou o pesquisador Amauri Siviero, da Embrapa-Ac, a realizar um estudo sobre as espécies vegetais de uso alimentar cultivadas por moradores de três importantes bairros da periferia de Rio Branco. O estudo, que contou com a colaboração de pesquisadores da Embrapa e da Universidade Federal do Acre (UFAC), foi publicado na revista científica Acta Botanica Brasilica.

A pesquisa consistiu na visita e avaliação dos quintais de 53 residências no bairro Aeroporto Velho, 44 no bairro Placas e 35 no bairro Novo Horizonte. Os dados foram obtidos via entrevistas com os moradores e observações diretas em cada residência. Foram pesquisados aspectos qualitativos e quantitativos dos quintais, das espécies alimentares cultivadas e as características socioeconômicas dos moradores entrevistados.

Os resultados revelaram o cultivo de 77 espécies de uso alimentar, com predominância de frutíferas (62,0%) e hortaliças (38%). Dentre as frutíferas, as mais comuns foram: “coco” (Cocos nucifera), citros – “laranja”, “tangerina” e “limão” (Citrus spp.), “cupuaçu” (Theobromagrandiflorum) e a “acerola”(Malpighia glabra). Entre as espécies hortícolas destacaram-se a “cebola de palha” (Allium schoenoprasum) e o “quiabo” (Abelmoschus esculentus (L.) Moench). Das espécies alimentares identificadas, 28,9% também tem uso medicinal e 16,8% uso ornamental.

As espécies frutíferas são cultivadas diretamente no solo enquanto as hortaliças (folhosas e condimentares) são cultivadas em canteiros suspensos, pois demandam solos de melhor qualidade, maior luminosidade e proteção contra a ação de animais domésticos.

A maior parte das espécies cultivadas (68%) é exótica, provavelmente devido ao fato de quase metade dos moradores entrevistados ser oriunda de cidades não Amazônicas e ao intercambio de mudas e sementes entre parentes e vizinhos. As plantas cultivadas são consumidas majoritariamente frescas (67%) e na forma de sucos (25,6%).

O estudo socioeconômico revelou que a maioria dos responsáveis pelo manejo dos quintais é do gênero feminino, casado e cerca de 60% apresenta baixa escolaridade. Aposentados e donas de casa foram as principais categorias de ocupação citadas. A maioria (79-88%) nasceu no Acre, filhos de país imigrantes do nordeste, especialmente o Ceará, e 55% eram oriundos de cidades do interior do Acre.

Foi observado que os fatores socioeconômicos não apresentam correlação direta com a riqueza de plantas cultivadas nos quintais avaliados. Os moradores possuem um bom conhecimento tradicional acerca das plantas cultivadas, mas isso não está relacionado ao nível de escolaridade dos entrevistados.

Existem diferenças estatísticas significativas entre a riqueza de espécies cultivadas nos bairros avaliados. O bairro Placas (8,3 espécies/quintal) difere significativamente do Aeroporto Velho (4,6 espécies) e Novo Horizonte (3,9 espécies). Isso pode ser parcialmente explicado pela maior área física dos quintais e maior área efetivamente utilizada para o cultivo no bairro Placas, que apresentou quintais com tamanho médio de 397,9 m², ante 84,25 m² no Novo Horizonte e 169,6 m² no Aeroporto Velho. A área efetivamente usada como quintal – excluindo a área construída com residência e outras benfeitorias – foi de 82%, 44% e 62% nos bairros Placas, Novo Horizonte e Aeroporto Velho, respectivamente.

No bairro Placas, o arranjo dos cultivos nos quintais é similar a sistemas agroflorestais rurais, sem regras de espaço e alinhamento entre as plantas. No entanto, observou-se certa setorização na escolha do local de plantio com espécies ornamentais dispostas na frente da residência e as alimentares nos fundos do quintal.

Para os autores do estudo os quintais com áreas maiores apresentam maior potencial para uso agrícola. Em Rio Branco, estes tipos de quintais são uma fonte de recursos genéticos vegetais e contribuempara a segurança alimentar e saúde das famílias,além de eventualmente gerar renda com a venda de excedentes.

Apesar disso, os benefícios decorrentes do cultivo de plantas alimentares em quintais urbanos não poderão ser desfrutados pelas centenas de famílias contempladas no atual programa de habitação desenvolvido no Acre, pois as unidades habitacionais são edificadas em quintais minúsculos.

Considerando os benefícios, especialmente para as famílias de baixa renda, e a grande disponibilidade de terra nas cercanias de Rio Branco, seria importante que os planejadores habitacionais considerassem um incremento no tamanho dos quintais dos futuros conjuntos habitacionais planejados para a cidade.

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O trabalho ‘Cultivo de Espécies Alimentares em Quintais Urbanos de Rio Branco, Acre, Brasil’, de autoria de Amauri Siviero, Thiago Andrés Delunardo, Moacir Haverroth, Luis Cláudio de Oliveira e Ângela Maria Silva Mendonça foi publicado em setembro de 2011 na revista Acta BotanicaBrasilica (vol.25, no. 3, páginas 549-556).

Foto: Eletrobrás/CGTEE