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31 outubro 2011

IMPACTO DA RETIRADA DE AREIA NA MATA CILIAR DO RIO ACRE (*)

As dragas que retiram a areia do leito do rio Acre jogam o mineral em canchas de armazenamento localizadas na margem do rio, em áreas de preservação permanente (APP), onde a vegetação é completamente eliminada. Além do dano à vegetação, o armazenamento torna o solo do local extremamente arenoso, afetando a regeneração natural da floresta quando as canchas são abandonadas

João Bosco N. Queiroz (1,2,3); Evandro J. L. Ferreira (1,2); Nelson L. Leite-Junior (1,2); Ângela L. Alves (1,2); José de R. Bandeira (1,2); Cleison C. de Mendonça (1,2); Clebyane de S. Barbosa (1,2); Geliane M. da Silva (1,2); Adriano S. da Silva (1,2) e Antonio F. de Lima (1,2).

Introdução

[Vista de uma draga de extração de areia no rio Acre]

A mineração de areia no rio Acre, que corta a cidade de Rio Branco, é feita com dragas que sugam o mineral do leito do rio, jogando-o em lugares na margem que coincidem com as matas ciliares, legalmente consideradas áreas de preservação permanente (APP). A areia é armazenada em ‘canchas’, áreas circulares com até 2.000 m² onde a cobertura vegetal é completamente eliminada.

Além do dano causado á vegetação, o armazenamento de areia em canchas modifica profundamente o solo, tornando-o extremamente arenoso, afetando a regeneração natural da floresta quando as canchas são abandonadas.

A recuperação das áreas degradadas pela mineração é uma exigência legal e deve ser feita exclusivamente com espécies nativas, recomendando-se a aplicação do modelo sucessional, que separa as espécies vegetais em grupos ecológicos com características comuns e funções diferentes na dinâmica da floresta (Almeida e Sánchez, 2005).

A realização de estudos sobre a composição florística e as relações fitossociológicas entre as espécies colonizadoras de áreas fortemente perturbadas, como as submetidas à mineração, são ferramentas importantes para nortear estratégias de reabilitação e recuperação, além de permitir a realização de avaliações quali-quantitativas da recuperação (Nappo et al., 2000).

Como as estratégias mais recomendadas em planos de recuperação de áreas degradadas tentam reproduzir o padrão natural das comunidades vegetais para aumentar a probabilidade de sucesso na recuperação ambiental e reduzir os custos desses projetos (Araújo et al., 2005), os estudos fitossociológicos são fundamentais para o conhecimento desses padrões, abrangendo os fenômenos que afetam a dinâmica dessas comunidades, sua constituição, classificação, proporção na abundância entre espécies e distribuição espacial dos indivíduos (Jacobi et al., 2008).

Objetivos

Determinar a diversidade e a similaridade florística entre canchas de armazenamento de areia com diferentes idades de abandono, e localizadas ao logo do rio Acre, dentro do perímetro da área de Proteção Ambiental Lago do Amapá, nas cercanias de Rio Branco, Acre.

Material e métodos

[Imagem aérea mostrando estradas de acesso e as canchas de armazenamento de áreia adjacentes ao rio, em áreas de APPs]

O estudo foi desenvolvido em uma área adjacente ao rio Acre (10°01'02"S; 67°51'04"W), no perímetro urbano de Rio Branco, onde a mineração de areia foi abandonada há cerca de 5 anos. Para o estudo foram selecionadas canchas de armazenamento de areia abandonadas
há 5, 10 e 20 anos. A área de controle foi instalada em uma floresta primária adjacente á cancha de 5 anos. As unidades amostrais foram instaladas dentro de cada cancha, na borda das florestas adjacentes ás canchas e na área de controle.

Em cada ponto amostral as espécies arbóreas e arbustivas foram amostradas em 8 parcelas de 5 x 10 m (50 m²) enquanto as ervas e lianas foram amostradas em 8 sub-parcelas de 2 x 2 m (4 m²), resultando em uma área amostral total de 2.800 m².

Todos os indivíduos arbóreos, arbustivos e as ervas passíveis de terem o DAP ou diâmetro a altura do colo (DAC) medidos no interior das parcelas de 50 m² foram identificados e contados. As ervas e lianas foram identificadas e contadas dentro das parcelas de 4 m².

A composição e diversidade florística (Shannon-Wiener), bem como os parâmetros fitossociológicos foram calculadas com o software Mata Nativa versão 2.0. A similaridade florística de Jaccard (SJ) foi calculada usando o programa Biodiversity Pro (McAleece et al., 1997).

Resultados

Foram inventariadas 857 plantas, 541 nas parcelas de 50 m² (plantas adultas) e 316 nas parcelas de 4 m² (ervas e regenerações) sendo identificadas 37 famílias, 67 gêneros e 81 espécies nas parcelas de plantas adultas e 30 famílias, 48 gêneros e 54 espécies nas parcelas de regeneração. Pelo menos 23 famílias, 35 gêneros e 38 espécies ocorreram simultaneamente nas parcelas adultas e de regeneração.

O índice de Shannon-Wiener foi de 3,29 e 3,73, respectivamente, para as áreas com plantas em regeneração e plantas adultas. Segundo Knight (1975) para as florestas topicais, normalmente, o índice pode variar entre 3,83 a 5,85, sugerindo que os índices encontrados neste estudo são baixos. O maior índice de diversidade foi encontrado na parcela testemunha localizada no interior da floresta (3.46) e a menor na parcela instalada no interior da cancha abandonada há 5 anos (0,88).

Isso era esperado, pois as áreas em regeneração retêm estádios preliminares de recuperação da vegetação. Nascimento (2009), estudando uma floresta secundária nas cercanias de Rio Branco encontrou índice de diversidade de 4,25. Salomão et al. (2002), estudando uma floresta primária na Amazônia ocidental encontraram índice de diversidade variando entre 4.53 e 4,97.

[Vista do interior de uma cancha de armazenamento de areia sendo preenchida com areia dragada do rio Acre]

A similaridade florística variou de 32,55% entre a cancha de 20 anos e a área de floresta, e 52,27% entre as canchas de 5 e 10 anos. A média de similaridade foi de 43,43% e a matriz de similaridade mostrou que todas as similaridades acima da média referem-se às comparações entre a área de floresta e as canchas de 5 e 10 anos, respectivamente, enquanto que todas as similaridades abaixo da média referem-se às comparações entre a cancha abandonada há 20 anos e as demais áreas. O resultado encontrado deve-se ao fato das canchas de 5 e 10 anos serem adjacentes e localizarem-se há poucos metros da área florestal onde foi instalada a parcela testemunha. Estes resultados corroboram a hipótese de que quanto maior a proximidade espacial entre as parcelas, maior será a similaridade florística entre elas (Oliveira, 1997; Santos; Jardim, 2006).

Conclusão

A composição florística mostrou um número baixo de espécies e famílias em razão da amostragem ter incluído floresta de várzea e áreas abertas, onde a vegetação havia sido completamente eliminada. Em relação à diversidade, o maior valor obtido na área de floresta decorre da mesma se constituir em área inalterada, enquanto o menor índice observado na cancha abandonada há 5 anos reflete o seu processo inicial de regeneração. A maior similaridade florística entre a área de floresta e as canchas de 5 e 10 anos decorre da proximidade física entre elas.

Referências

Almeida, R. O. P. O; Sánchez, L. E. 2005. Revegetação de áreas de mineração: critérios de monitoramento e avaliação do desempenho. Revista árvore, Viçosa, MG, v. 29, n. 1, 2005.

Araújo, H. J. B. de. Inventário florestal para fins de planejamento de colheita madeireira em pequenas áreas manejadas no estado do Acre. In: Simpósio brasileiro sobre colheita e transporte florestal, 7. Vitória. Anais...Viçosa: UFV, 2005. p. 229-248.

Jacobi C.M., Carmo F.F., Vincent R.C. 2008. Estudo fitossociológico de uma comunidade vegetal sobre canga como subsídio para a reabilitação de áreas mineradas no Quadrilátero Ferrífero, MG. Rev. Árvore, 32(2):345-353.

Knight, H. D. 1975. A phytosociological analysis of species rich tropical forest on Barro Colorado, Island, Panamá. Ecology Monograph v. 45: 259-284.

McAleece, N.; Lambshead, P. J. D.; Paterson, G. L. J.; Gage, J. G. 1997. Biodiversity professional. Beta-Version. The Natural History Museum and the Scottish Association for Marine Sciences.

Nappo, M. E.; Fontes, M. A. L. & Oliveira Filho, A. T. 2000. Regeneração natural em sub-bosque de povoamentos homogêneos de Mimosa scabrella Benth., implantados em áreas mineradas, em Poços de Caldas, MG. Revista árvore 24: 297-307.

Nascimento, J. F. 2009. Composição Florística e estrutura fitossociológica de um fragmento da área de Proteção Ambiental Raimundo Irineu Serra em Rio Branco, Acre. 59 f. Monografia (Graduação em Engenharia Florestal) Universidade Federal do Acre, Rio Branco, Acre.

Oliveira, A. A. de. 1997. Diversidade, estrutura e dinâmica do componente arbóreo de uma floresta de terra-firme de Manaus, Amazonas. 187 f. Tese (doutorado em Botânica) - Universidade de São Paulo, São Paulo, Departamento de Botânica do Instituto de Biociências.

Salomão, R. de P.; Matos, A. H. de; Rosa, N. de A. 2002. Dinâmica do sub-bosque e estado arbóreo de floresta tropical primária fragmentada na Amazônia oriental. Acta Amazônica 32(4): 387-419.

Santos, G. C. dos.; Jardim, M. A. G. 2006. Florística e estrutura do estrato arbóreo de uma floresta de várzea no município de Santa Bárbara do Pará, Estado do Pará, Brasil. Acta Amazônica 36(4): 437-446.

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(*) Título original: "Diversidade e similaridade florística entre áreas impactadas pela mineração de areia em APPs do rio Acre em Rio Branco, Acre".
Este trabalho, na forma de resumo expandido, foi originalmente publicado nos Anais do X Congresso de Ecologia do Brasil, realizado em São Lourenoço-MG, entre os dias 16 e 22 de Setembro de 2011.

(1) Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia - INPA/Núcleo de Pesquisa do Acre, BR - 364, km 5, Distrito Industrial, Rio Branco, Acre, CEP 69.915 - 900; (2) Herbário do Parque Zoobotânico (HPZ), Campus da Universidade Federal do Acre UFAC, BR - 364, km 5, Distrito Industrial, Rio Branco, Acre, CEP 69.915 - 900; (3) Curso Superior em Gestão Ambiental, Universidade do Norte do Paraná – UNOPAR.

Crédito das fotos: E. Santos/Crédito da edição da imagem Google: E. Ferreira

30 outubro 2011

O PETRÓLEO E O FUTURO DO BRASIL

O país do subdesenvolvimento agradece aos senadores que não mostraram interesse em aplicar a verba dos royalties na construção do futuro da nação

Helena Nader* & Jacob Palis**
Folha de S. Paulo

No dia 19/10 o Senado da República aprovou em votação simbólica o projeto de lei nº 448, referente à partilha dos royalties do petróleo. Foi uma decisão que vira as costas para o desenvolvimento do país e despreza nossas futuras gerações.

Os senadores optaram pela distribuição de uma riqueza razoável (15% do valor do petróleo extraído) para o governo federal e para todos os Estados e municípios brasileiros mediante critérios frágeis, sem objetivos definidos e sem compromissos com a sociedade.

Para se ter uma ideia da falta de objetividade, o projeto de lei nº 448 estabelece que os royalties do petróleo poderão ser gastos com “educação, infraestrutura social e econômica, saúde, segurança, programas de erradicação da miséria e da pobreza, cultura, esporte, pesquisa, ciência e tecnologia, defesa civil, meio ambiente, em programas voltados para a mitigação e adaptação às mudanças climáticas, e para o tratamento e reinserção social dos dependentes químicos”.

Não se discute a importância de cada uma dessas áreas. O problema é a dispersão dos recursos, o que não vai resolver todos os problemas de qualquer das áreas contempladas, muito menos promoverá avanços sociais e/ou econômicos no Brasil como um todo.

A proposta que levamos ao Congresso Nacional é diferente. A Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) e a Academia Brasileira de Ciências (ABC) propõem que parte expressiva dos royalties do petróleo seja utilizada em áreas que promovam melhorias estruturais e sustentáveis na vida social e econômica do conjunto do país: educação e ciência, tecnologia e
inovação (C,T&I).

Há consenso em nossa sociedade de que o sistema de ensino brasileiro continua com carências que comprometem gravemente a formação de nossas crianças e jovens. Os royalties do petróleo poderiam ajudar a quitar esse deficit histórico.

Já C,T&I demandam investimentos mais expressivos do que os feitos hoje porque são a única porta para ingresso do Brasil na economia do conhecimento -a forma de produção que mais agrega valor aos produtos e serviços.

Não bastasse a instituição da distribuição descomprometida dos recursos, o projeto de lei nº 448 tem mais um agravante. Se levado adiante, teremos o fim da destinação de parte dos royalties do petróleo para o Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT).

A ironia -ou o cinismo- dessa história é que o pré-sal só pode ser descoberto, e somente poderá ser explorado, porque o Brasil, obviamente a Petrobras incluída, investiu em ciência, tecnologia e inovação na área de petróleo e gás.

Esquecem nossos políticos que as reservas de petróleo, mesmo que abundantes, são finitas.

O Brasil do subdesenvolvimento certamente agradece aos senadores que se mostraram interessados apenas em distribuir o dinheiro dos royalties, e não em como aplicá-lo na construção do futuro da nação.

Assim, como estamos empenhados em defender o Brasil e os brasileiros, reivindicamos que a Câmara se manifeste contrária ao projeto de lei aprovado no Senado.

Precisamos que sejam restabelecidas as expectativas de utilizarmos as nossas reservas de petróleo efetivamente para o desenvolvimento social e econômico do País. Os royalties do petróleo demandam uma política de Estado, e não de governo.

*Helena Nader, biomédica, é presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) e professora titular da Unifesp.
**Jacob Palis, matemático, é presidente da Academia Brasileira de Ciências (ABC) e pesquisador do Impa (IMPA – Instituto Nacional de Matemática Pura e Aplicada).

28 outubro 2011

JUCA KFOURI CHUTANDO O BALDE

"Já tive diversas desilusões na vida. Eu achava que o Lula romperia com esse pessoal do futebol. Hoje estou convencido de que o governo do PT não é um governo de rupturas...Eu vi o Lula dizer que nunca mais o jornalista Juca Kfouri diria que o torcedor no Brasil era tratado como gado...em 2003, na assinatura do Estatuto do Torcedor...Não havia um único cartola na cerimônia...Seis meses depois, ele estava de braços dados com o Ricardo Teixeira naquele jogo no Haiti."

Juca Kfouri contra o feudalismo da bola

Guilherme Brendler
Caderno Ilustríssima/Folha de S. Paulo

Que Juca kfouri, 61, é o mais radical crítico à Copa no Brasil em 2014 não é novidade. Seja em sua coluna na Folha, em seu programa na rádio CBN ou na TV a cabo (ESPN), são diárias as suas declarações contra a política da Fifa e à CBF de Ricardo Teixeira.

Na edição da revista "Interesse Nacional" [Ateliê, 86 págs., R$ 25], que chega às livrarias no dia 5 deste mês, Kfouri expõe suas razões em argumentação próxima à de artigo acadêmico, buscando a adesão de um público mais afeito às querelas diplomáticas ou da política partidária do que às do futebol.

Na edição anterior da mesma revista, publicada em abril, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso publicou o polêmico artigo que dizia que o PSDB deveria se aproximar da classe média e não disputar o "povão" com o PT.

"Se 10% do seleto público da revista passar a acompanhar as questões políticas do futebol, será maravilhoso", disse Kfouri à Folha. Na entrevista a seguir, concedida em sua casa, ele repassa alguns dos pontos do artigo "A Copa do Mundo é Nossa?" e não esconde a sua decepção com figuras como Lula, o PT e outros.

Folha - O que está em jogo para o Brasil na aprovação da Lei Geral da Copa, que define as regras para sediar o evento?
Juca Kfouri - Quando um país se candidata a um Mundial, ele já sabe que vai entregar a sua soberania. A isenção de impostos, os convidados VIPs, a possibilidade do marketing de emboscada, a bebida alcoólica no estádio. Tudo isso já está no caderno de encargos.

Na Alemanha, em 2008, com exceção da cidade de Dortmund, onde o Partido Verde brigou para cacete e conseguiu fazer com que se vendesse também a cerveja local, em todos os estádios era possível comprar apenas Budweiser. Isso é uma ofensa no país da cerveja servir aquele xixi de caveira.

Folha - Qual é o risco de o Brasil deixar de ser sede da Copa de 2014?
O risco que o Brasil corre é de a Fifa se arreglar com a Inglaterra, que está incomodando uma barbaridade, e entregar a Copa a eles.

Gostaria de ver isso. Já ocorreram desistências, como a Colômbia, que desistiu dois anos antes de realizar a Copa de 1986. Acho que o Brasil não vai desistir, mas a Fifa pode, sim, entregar a Copa do Mundo para a Inglaterra se o governo dificultar muito a vida deles.

Agora, devido às pretensões brasileiras de ter um lugar no Conselho de Segurança da ONU, é difícil imaginar que o Brasil deixe isso acontecer. Penso que a presidenta Dilma vai endurecer o quanto ela puder, mas cederá tudo aquilo que for inegociável para a Fifa.

A indicação do [deputado federal] Vicente Cândido (PT-SP) como relator da Lei Geral da Copa mostra que a presidenta não está com tão inflexível. Cândido é também vice-presidente da Federação Paulista de Futebol e sócio de Marco Polo del Nero, homem muito ligado a Ricardo Teixeira, presidente da CBF e do COL [Comitê Organizador Local da Copa do Mundo].

Eu exultaria se o Brasil mandasse a Fifa às favas. Seria uma demonstração de dignidade, de soberania. Acho que seria um exemplo e que dinamitaria a Fifa. Mas é óbvio que é tudo suposição. É muito difícil que isso ocorra.

Folha - Você está desiludido com a política do PT em relação ao futebol?
Já tive diversas desilusões na vida. Eu achava que o Lula romperia com esse pessoal do futebol. Hoje estou convencido de que o governo do PT não é um governo de rupturas, não faz rupturas. Eu vi o Lula dizer que nunca mais o jornalista Juca Kfouri diria que o torcedor no Brasil era tratado como gado, que "a presença dele aqui é uma homenagem a todos os jornalistas que foram processados, tiveram credenciais negadas por essa cartolagem que infelicita o Brasil". Isso foi em 2003, na assinatura do Estatuto do Torcedor, a primeira lei que ele assinou. Não havia um único cartola na cerimônia.

Seis meses depois, ele estava de braços dados com o Ricardo Teixeira naquele jogo no Haiti. Que foi lindo, uma história muito bonita. O poder de sedução da cartolagem brasileira é algo que não deve ser desprezado. Pergunte ao Ricardo Teixeira de quem ele gosta mais: do Lula ou do Fernando Henrique Cardoso?

Não é curioso? O Teixeira detesta o Fernando Henrique. Eles não têm uma foto juntos. No dia que voltaram da Ásia campeões do mundo, em 2002, o FHC condecorou o Ricardo Teixeira na sala dele, sem fotógrafo. Com o Lula tem um milhão de fotos, de braços dados, de camisa aberta, tomando cerveja, de todas as formas.

Folha - Você é um dos raros corintianos contra a construção do Itaquerão.
As pessoas me falam: "Você é contra o Itaquerão, pô! Que tipo de corintiano você é?". Não se está discutindo se o clube merece ou não um estádio. O que se discute é que a operação, em si, é um escândalo. Numa cidade como São Paulo você achar que um estádio como o Morumbi não serve para sediar seis ou sete jogos da Copa do Mundo no Brasil é loucura.

Se os alemães tivessem demolido o Allianz Arena, em Munique, tudo bem. Mas a Alemanha pode. Nós não. Cinquenta anos depois descobriram que o Morumbi não serve para jogo de futebol? Já se fez tudo que é competição aqui: final de Libertadores, eliminatórias de Copa, Mundial de Clubes da Fifa.

Folha - Mas seriam necessárias reformas.
Claro, o Morumbi não é o ideal, mas é factível. Como o Ellis Park foi factível para a Copa na África do Sul, em 2010. Agora, em Johannesburgo também cometeram excessos. Fizeram o Soccer City, a 4 km do Ellis Park, no Soweto. Qual era a justificativa: polo de desenvolvimento. Aqui, polo de desenvolvimento! [fazendo uma "banana"]. Vá lá ver se é polo de desenvolvimento. Os caras têm um monumento daqueles, mas não têm o que comer.

Na Cidade do Cabo fizeram um estádio maravilhoso, uma das coisas mais lindas que já vi. Mas desalojaram 4.000 famílias da região. Agora falam em demolir porque nunca mais ocuparam o estádio.

Vamos repetir isso no Recife, apesar de o Náutico ter dito que poderá usar o novo estádio. Mas e em Brasília, Cuiabá, Natal? Nem futebol profissional há por lá!

Folha - Então o Brasil não deveria nem ter pensado em sediar uma Copa?
Aí é que está. Deveria, sim. Mas para fazer uma Copa do Mundo do Brasil no Brasil. Não uma Copa do Mundo da Alemanha no Brasil. Claro que o Brasil pode fazer uma Copa, mas tem que fazer dentro das nossas possibilidades.

E qual o maior sentido que faria para o Brasil sediar um evento como esse? Os legados para as tais 12 sedes. Em Johannesburgo, por exemplo, eles ficaram com um aeroporto ótimo. Embora tenha sido inaugurado um dia depois do fim da Copa, está lá, e o povo sul-africano pode usufruir disso. Tem a linha do monotrilho que liga o aeroporto ao centro rico da cidade.

Esse tipo de investimento deveria ser feito aqui. Essa obsessão por novos estádios é uma reprodução, sem tirar nem pôr, do que se fez durante a ditadura militar. Os estádios brasileiros nunca tiveram sua capacidade máxima ocupada, têm 65% da capacidade ociosa nesse Campeonato Brasileiro.

Estamos construindo elefantes brancos, reproduzindo o que ocorreu durante a ditadura em um governo democrático, dito de esquerda, sob a égide do PC do B. Isso é uma loucura!

Folha - Foi o que ocorreu nos Jogos Pan-Americanos, no Rio, em 2007?
Quando criticávamos o que estava sendo feito em torno do Pan, diziam: "Esses jornalistas são maníacos por fracasso, são mal-humorados, antipatriotas etc.". Diziam que fariam o melhor Pan da história e deixariam três legados para o Rio: o metrô entre Jacarepaguá e a cidade olímpica, a despoluição da baía da Guanabara, da lagoa Rodrigo de Freitas.

Nenhuma dessas coisas foi feita. A ponto de um atleta do remo pescar um colchão durante a prova. Quem fez a maratona aquática saiu doente.

Mas os equipamentos esportivos ficarão para a Olimpíada, me diziam. Tem o Parque Aquático Maria Lenk, lindo, maravilhoso. Coisa de Primeiro Mundo. Aí vem o COI [Comitê Esportivo Internacional] e diz: infelizmente, a capacidade de público é aquém da que a gente exige em provas de natação. Então o Maria Lenk será usado no aquecimento das competições. Será preciso construir um novo centro para as provas oficiais.

A previsão inicial de gastos com o Pan era de R$ 400 milhões. Custou R$ 4 bilhões. E o TCU [Tribunal de Contas da União] diz que houve uma série de irregularidades, mas que esse é o preço do noviciado, que foi feito um evento desse porte. É brincadeira! Não estou falando da Copa de 1950. Me refiro a algo que ocorreu quatro anos atrás. Então, me dê uma razão para acreditar que vai ser bom, uma razão.

Folha - Você gostou do perfil de Ricardo Teixeira que a revista "Piauí" publicou na edição de julho?
Eu tirei o chapéu para a Daniela Pinheiro, que escreveu o texto. Ela inclusive me perguntou: "O que eu fiz de errado que você e ele gostaram?". [Risos] Eu disse que eu continuaria gostando, mas que ele não gostaria depois de um tempo. Hoje eu sei que ele não gosta mais porque já levou uma represália da Globo por causa da matéria.

Ele baixou as calças de um parceiro em praça pública. Isso tem um preço, evidentemente.

Ele é um ogro. O Ricardo Teixeira é um ogro. A reportagem é um retrato do que ele é. Um cara que vai a um restaurante cuja grande atração é um jardim, e ele senta de costas. A menos de 500 metros do hotel onde ele sempre se hospeda ficam os vitrais do Chagall, e ele nunca foi lá. O episódio do beliscão na filha. A história do casaco de pele que custa "só mil euros".

Passei anos juntando documentos, denunciando, mas nada foi tão demolidor quanto as frases dele. A reportagem mais demolidora contra o Ricardo Teixeira nesses anos todos foi a Daniela quem fez, usando só com as descrições do que ela viu e com as palavras dele. Apenas isso. Nada mais.

Folha - Você divide o seu artigo em primeiro tempo, intervalo, segundo tempo e prorrogação. Quem vencerá a disputa nos pênaltis?
Adoraria responder: "Nós, os brasileiros, os cidadãos brasileiros. Não a cartolagem". Vinte anos atrás eu te daria essa resposta, mas hoje eu sei que nesse filme de mocinho e bandido os bandidos ganham no fim. Raras têm sido as vezes em que os mocinhos ganham.

O professor Carlos Wainer, da UFRJ, usou uma expressão esses dias que eu nunca tive coragem de usar. Ele disse que o futebol brasileiro vive ainda no sistema feudal.
E é verdade. As federações são feudos, e os cartolas, senhores feudais. Embora estejam todos milionários, não têm dimensão do quanto podem tirar desta galinha dos ovos de ouro sem matá-la. Eles querem é raspar o tacho.

27 outubro 2011

AMAZÔNIA: RESTRIÇÃO À AQUISIÇÃO DE TERRAS POR ESTRANGEIROS

Debatedores defendem restrições à aquisição de terras por estrangeiros na Amazônia

O Brasil precisa aumentar a restrição e ter mais controle sobre a compra de terras por parte de estrangeiros na Amazônia. O alerta foi feito pelo consultor-geral da Advocacia-Geral da União, Arnaldo Sampaio Godoy, e pelo assessor de Políticas Estratégicas do Ministério da Defesa, capitão-de-mar-e-guerra Paulo César Garcia Brandão, que participaram, nesta quinta-feira (27), de audiência da Subcomissão Permanente da Amazônia para tratar do assunto.

O representante da AGU lembrou que a restrição à aquisição de terras por parte de cidadãos não nacionais é comum no mundo inteiro e não há em tal prática qualquer resquício de xenofobia ou discriminação.

- Há países que sequer permitem a compra de terras por indivíduos de outras nacionalidades. No mundo de hoje, informação é fundamental. Precisamos saber nas mãos de quem estão nossas terras. É uma questão estratégica, de soberania e até de segurança alimentar - opinou Arnaldo Godoy, que ainda fez um histórico das legislações e dos conflitos jurídicos existentes sobre o tema desde o século 19.

Cobiça

Já o representante do Ministério da Defesa ressaltou que o grande potencial de riquezas e a biodiversidade fazem da Amazônia brasileira foco da atenção internacional. O problema, segundo ele, é que a presença do Estado na área é dificultada pela baixa densidade demográfica, pelas longas distâncias e pela precariedade dos sistemas de transportes.

Na opinião de Garcia Brandão, para defender a Amazônia, será preciso tirá-la da insegurança jurídica causada pelo crescente conflito generalizado por conta de terras.

- Por isso, a regularização fundiária é urgente e fundamental - afirmou.

Grupo de trabalho

O debate foi realizado por iniciativa da senadora Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM), que também defendeu a necessidade de mais controle e rigor na presença de estrangeiros na Região Amazônica.

Ela propôs a instituição de um grupo de trabalho a ser formado por senadores e deputados para fazer um levantamento de todos os projetos em tramitação no Congresso Nacional sobre o assunto.

A intenção da senadora é atualizar a legislação existente, a partir de regras claras, sem margem a divergências de interpretação. Para isso, ela convidou representantes do Executivo para integrarem do grupo.

Também participaram do debate desta quinta-feira a senadora Ana Amélia (PP-RS) e os representantes do Ministério das Relações Exteriores (MRE), Carla Carneiro, e da Secretaria de Patrimônio da União (SPU), Paulo César Brandão. Eles se mostraram preocupados com a questão social dos habitantes da região e apresentaram os projetos que vêm sendo realizados pela Secretaria e pelo Ministério na Amazônia brasileira e faixa de fronteira.

Anderson Vieira / Agência Senado

AVALIAÇÃO ECONÔMICA DO TRÁFICO DE DROGAS NO ACRE

Pesquisa revela o perfil sócio-econômico dos traficantes e faz avaliação econômica e financeira do tráfico de drogas no Acre

Evandro Ferreira
Blog Ambiente Acreano

O tráfico de drogas ilícitas, que movimenta anualmente cerca de US$ 750 bilhões, é a atividade ilegal mais praticada no mundo. Se fosse legal, ela ficaria atrás apenas do setor petrolífero e da indústria automobilística.

Dados do Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime indicam que no Brasil, que faz fronteira com os três maiores produtores de cocaína do mundo, circulam anualmente cerca de 80 toneladas de drogas, metade destinada ao consumo interno e o restante à exportação, movimentando cerca de US$ 5 bilhões. O consumo de cocaína no país cresceu mais de 30% nos últimos anos, uma média de 6% ao ano entre 2002 e 2007.

Foi com o objetivo de entender os fatores que levam uma grande quantidade de pessoas a ingressar no tráfico de drogas ilícitas no Acre que pesquisadores das Universidades Federais do Acre e de Juiz de Fora realizaram uma análise econômica e financeira do tráfico de drogas para identificar fatores comuns entre as pessoas que migram para esta atividade criminosa. Especificamente, os pesquisadores tentaram responder a duas perguntas: (1) quais as características dos indivíduos que se envolvem com tráfico de drogas? e (2) quais os ganhos financeiros proporcionados pela prática deste crime?

A importância da pesquisa para o Acre reside no fato do mesmo fazer fronteira com dois dos principais países produtores de cocaína, a Bolívia e Peru, e da grave situação de descontrole do tráfico no Estado, que apresentou em 2009 o segundo maior volume de apreensão de drogas no Brasil.

Para o estudo, foram entrevistados, na penitenciária Francisco D’Oliveira Conde, em Rio Branco, 102 dos 956 detentos presos por tráfico no Estado. A pesquisa, realizada no final de 2009, indicou que o Acre contava com uma população carcerária de 3.036 pessoas em suas 11 unidades prisionais, das quais 31,5% haviam cometido crimes relacionados ao tráfico de drogas. Rio Branco concentrava quase 77% dos presos do Estado, sendo que 33,35% deles encontravam-se presos por tráfico de entorpecentes.

Dos detentos entrevistados, 78,4% eram do sexo masculino, 53,9% consideravam-se morenos e apenas 8,8% branco. Foi constatado que os homens têm o primeiro contato com o tráfico de drogas mais cedo que as mulheres. Para eles, o intervalo de idade entre 16 e 20 anos foi o que apresentou a maior incidência de entrevistados iniciando no tráfico de drogas (24,51%), enquanto que para as mulheres a maior incidência (27,27%) ocorreu na faixa etária entre 31 e 35 anos. A faixa etária entre 16 e 20 anos é também a de maior incidência do primeiro contato com as drogas.

Um dado extremamente preocupante da pesquisa é que aproximadamente 14% dos entrevistados iniciaram no tráfico com idade entre 10 e 15 anos, indicando que uma parcela considerável dos condenados por tráfico de drogas no Acre envolve-se na criminalidade ainda criança, período em que deveriam estar frequentando a escola.

Em relação ao nível de escolaridade dos condenados foi observado que ele é muito baixo, pois mais de dois terços (65%) conseguiu no máximo concluir o ensino fundamental. Desses, 47% pararam os estudos pela necessidade de trabalhar e contribuir com a renda familiar e 21% desistiram dos estudos porque começaram a ter envolvimento com a criminalidade. De todos os entrevistados, apenas aproximadamente 6% chegaram a ingressar em um curso superior.

Com relação à situação de trabalho dos entrevistados, 61,80% trabalhava quando decidiu traficar drogas, ocasião em que recebiam salário médio de R$ 646,00. Entre os motivos para o ingresso no tráfico, as dificuldades financeiras foram indicadas por mais da metade deles como a principal razão, seguida pela idéia de ganhar dinheiro fácil, influência de amigos e desemprego.

A avaliação econômica e financeira do tráfico de drogas sugere que o ganho financeiro na atividade apresenta uma variação muito grande, dependendo do tipo de participação do indivíduo e do local em que ele adquire a droga. Assim, o traficante que obtém o maior nível de renda bruta é o que adquire o entorpecente na Bolívia e promove sua venda no Brasil, auferindo em média uma renda bruta mensal equivalente a R$ 15.174,00. Por outro lado, a maior taxa de lucro é obtida pelo criminoso apelidado de ‘‘mula’’ que transporta a droga do Peru para o Brasil.

Quase dois terços dos entrevistados classificaram o risco de ser preso pela prática do tráfico de drogas entre grande e muito grande, mesmo assim sua alta lucratividade a torna atrativa. Mais da metade deles atribuiu a delatores o motivo da sua prisão, mostrando a importância da população na repressão ao tráfico de drogas.

Foi feita uma avaliação estatística multivariada de 17 variáveis para determinação do conjunto de fatores econômicos e sociais mais importantes relacionados com a decisão dos indivíduos de aderir à atividade do tráfico de drogas. Um perfil simplificado dos envolvidos é sintetizado a seguir:

"Estão cientes do alto ricos da atividade, antes de decidir ser um criminoso possuía um trabalho legal que compunha a renda familiar juntamente com o salário dos outros integrantes de sua família, tem filhos e considerava a renda obtida legalmente insuficiente para atender às necessidades de sua família, tinha amigos traficantes, ao passar a traficar drogas precisa ser cuidadoso para evitar uma eventual prisão, a renda do tráfico é elevada e suprirá suas necessidade e as da sua família".

O artigo “Avaliação econômica do tráfico de drogas no Estado do Acre”, de autoria de Rennan Bitts de Lima, Rubicleis Gomes da Silva e Eduardo Simões Almeida, foi publicado na revista REDES, v. 16, n. 2, p. 102-130, maio/ago. 2011.

Clique aqui para ler a íntegra do artigo.

Fonte da foto: Ecos da Notícias

26 outubro 2011

CIÊNCIA FOI EXCLUÍDA NA DIVISÃO DOS ROYALTIES DO PETRÓLEO

Revista Nature destacou em sua seção de notícias, na última segunda-feira (24/10), reação da comunidade científica brasileira diante do projeto de lei, aprovado no Senado, que corta royalties do pré-sal para ciência

Luta pelos royalties


Agência FAPESP – O Senado Federal aprovou, no dia 19 de outubro, um projeto de lei que propõe um novo modelo de distribuição das receitas geradas pelos campos de petróleo recentemente descobertos no país, mas o novo projeto não inclui a definição de royalties para a ciência, tecnologia, inovação e educação, que era prevista em modelos anteriores.

O tema foi destaque, na última segunda-feira (24/10), na seção de notícias da edição online da revista Nature. De acordo com a revista, a expectativa é que o petróleo descoberto no pré-sal gere receitas de R$ 80 bilhões por ano em 2020. O projeto de lei será votado na Câmara dos Deputados antes de ser sancionada pela presidente da república.

O diretor científico da FAPESP, Carlos Henrique de Brito Cruz, declarou à Nature que a aprovação pleo Senado foi um grande golpe para a ciência e para o financiamento de tecnologia no Brasil. “Começa o desmantelamento de um sistema de financiamento que foi criado em 1998, que tem trazido excelentes resultados em ciência e tecnologia no Brasil", afirmou Brito Cruz, segundo a revista.

No início de setembro, segundo a revista, uniram-se para a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) e a Academia Brasileira de Ciências (ABC) lançaram um abaixo assinado pedindo 7% dos royalties para o financiamento de ciência e 30% para a educação. Até agora, de acordo com a Nature, a petição já reuniu mais de 27 mil assinaturas. O objetivo é conseguir um milhão de adesões.

Helena Nader, presidente da SBPC, segundo a Nature, disse que foram justamente os investimentos em educação ciência e tecnologia realizados no passado que permitiram ao país descobrir o pré-sal. Ela escreveu aos congressistas pedindo à Câmara dos Deputados que “revertesse a falta de compromisso com o futuro da nação”.

"Investir em ciência e tecnologia é apostar no futuro do país. Quando o dinheiro do petróleo acabar, ficaremos com a renda que vem da educação, da ciência e da tecnologia”, teria dito Nader à Nature.

Mais informações: www.nature.com

GOVERNO ELOGIA RELATÓRIO DO NOVO CÓDIGO FLORESTAL, MAS TRABALHA POR AJUSTES ADICIONAIS

Iara Guimarães Altafin
Agência Senado

O governo faz uma avaliação positiva das alterações feitas ao projeto de novo Código Florestal (PLC 30/2011) pelo senador Luiz Henrique da Silveira (PMDB-SC), relator da matéria nas comissões de Agricultura (CRA) e de Ciência e Tecnologia (CCT). A apresentação do relatório nesta terça-feira (25) foi acompanhada pelo secretário de Florestas do Ministério do Meio Ambiente, João de Deus Medeiros.

- O texto incorpora mudanças significativas de aprimoramento do texto, na ótica de se ter uma referência clara que consolide os institutos de reserva legal e de área de preservação permanente [APP] em patamares adequados – observou.

A inclusão dos manguezais como APPs foi um dos avanços ressaltados pelo secretário. O texto aprovado na Câmara não se referia a manguezais, mas excluía parcela desse ecossistema (os apicuns e salgados) das normas de proteção. No relatório, Luiz Henrique considera todas as formações de mangues um sistema único e protegido pela lei florestal, à exceção das áreas exploradas até 2008, em especial com produção de camarão e extração de sal em apicuns e salgados.

Apesar de elogiar os avanços no texto, Medeiros apontou aspectos que ainda deverão ser aperfeiçoados. Como exemplo, citou a necessidade de maior clareza e objetividade nas orientações para os Programas de Regularização Ambiental (PRA), como forma de dar segurança jurídica aos cultivos consolidados em área protegida.

Outro aspecto analisado pelo secretário diz respeito à regularização de atividades consolidadas em APPs de rios com largura acima de dez metros. O texto já prevê condições para a manutenção das atividades agrossilvopastoris nas margens de rios até essa largura, mas não se refere aos rios maiores.

O governo teme que a falta de regras para rios com largura maior que 10 metros possa suscitar interpretação equivocadas. O secretário citou o caso de propriedades familiares que exploram as margens de rios grandes, como o rio São Francisco, nas quais praticamente todo imóvel rural está em APP.

- Não é razoável se imaginar que serão retirados todos os produtores daquela área, mas o código teria de dar uma orientação para que minimamente se garanta a compatibilidade da manutenção dessas propriedades, sem que isso signifique um comprometimento maior do rio – disse o secretário.

Outra mudança apoiada pelo governo é a inclusão de capítulo sobre a agricultura familiar. O secretário explicou que existe proposta sendo desenvolvida pelas entidades do setor, em conjunto com o Ministério do Desenvolvimento Agrário, para a definição de regras específicas para a proteção florestal em propriedades familiares.

Clique aqui para acessar a íntegra do relatório do senador Luiz Henrique

AÇAÍ E A DOENÇA DE CHAGAS

Belém fecha pontos de venda de açaí após casos de doença de Chagas

Aguirre Talento
Folha de S. Paulo/Belém

Após um aumento de 80% nos casos de doença de Chagas em Belém neste ano, a Vigilância Sanitária do município interditou ontem cinco pontos de venda de açaí.

Os locais interditados não tinham documentação exigida e desobedeciam regras de higiene na manipulação do fruto e, por isso, apresentavam risco de contaminação.

Um dos problemas, por exemplo, era que um dos locais funcionava em uma estrutura de madeira -propícia para a proliferação do barbeiro, inseto transmissor da doença de Chagas.

No Pará, o açaí é preparado diretamente a partir do fruto, o que exige mais cuidados de higiene. Se as fezes do barbeiro caem no alimento, há o risco de que o consumidor seja contaminado.

No caso da polpa do açaí, que é produzida em escala industrial e exportada para outros Estados, o produto deve ser pasteurizado para eliminar riscos.

As interdições de ontem vieram depois de a Secretaria de Saúde de Belém descobrir que nove pessoas recentemente contaminadas pela doença haviam consumido açaí no mesmo bairro, na periferia da capital.

Vistorias nas casas dos contaminados descartaram a existência do barbeiro e reforçam a hipótese de contaminação pelo açaí em quatro locais do bairro do Telégrafo e em um do Jurunas.

"A evolução da doença pode ser mais rápida quando contraída por alimentos contaminados, se a pessoa ingerir uma quantidade grande dos parasitas", explica Elenild Góes, coordenadora estadual de doença de Chagas.

Neste ano, foram detectados 36 casos em Belém. O número é 80% maior que os 20 casos de 2010.

Em todo o Estado, até agora foram 89 casos, com dez mortes. No ano passado, foram detectadas 79 pessoas com doença de Chagas no Pará e seis morreram. Outros surtos da doença ocorreram em 2009 e em 2007. Na época, o açaí também foi apontado como transmissor.

Saiba mais:
- Belém: Sesma esclarece possível surto da Doença de Chagas
- Mal de Chagas ataca um por dia em Belém
- Chega a 39 os casos de Doença de Chagas em Belém. Em todo o ano passado, a cidade registrou apenas 14 casos confirmados

25 outubro 2011

IBAMA PERDERÁ PODER DE MULTAR DESMATAMENTOS

Projeto que reduz poder do Ibama pode ser votado hoje. Uma emenda "pegadinha", apoiada por ruralistas no congresso, prevê que só o órgão que licenciou uma determinada atividade terá o poder de autuação. Como os desmatamentos são licenciados pelos Estados, somente eles poderiam multar -- e não o Ibama, órgão federal.

Cláudio Ângelo e Márcio Falcão
Folha de S. Paulo/DF

O líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), disse nesta terça-feira que o plenário da Casa pode colocar em votação até o final do dia um projeto de lei que tira o poder do Ibama de multar desmatamentos. Segundo o líder, o projeto deve ser analisado depois de um projeto polêmico que trata do acesso a documentos públicos nos três Poderes da República, em todos os níveis de governo.

A movimentação surpreendeu o Ministério do Meio Ambiente, que vem manobrando para fortalecer o poder do órgão ambiental no Código Florestal.

O projeto em questão é o chamado PLC nº 1, proposto pela Câmara dos Deputados. Ele regulamenta o artigo 23 da Constituição, que define as competências de União, Estados e municípios na área ambiental. Desde o ano passado o projeto está no Senado como prioridade de votação.

O texto, de autoria do deputado Sarney Filho (PV-MA), foi alterado no fim de 2009 na Câmara. Uma emenda previa que só o órgão que licenciou uma determinada atividade tivesse o poder de autuação.

Como os desmatamentos são licenciados pelos Estados, somente eles poderiam multar -- e não o Ibama, órgão federal.

A área ambiental do governo vê um retrocesso no texto, já que os Estados são mais sujeitos a pressões políticas e vários deles não têm boa estrutura de fiscalização. O então ministro Carlos Minc prometeu que o artigo seria vetado.

Nas últimas semanas, o PLC nº 1 voltou à pauta do Senado, com um parecer favorável de Jucá, seu relator. O senador disse que faria uma emenda de redação para determinar que o Ibama agisse quando os Estados não o fizessem.

Mas um dos relatores do Código Florestal no Senado, Jorge Viana (PT-AC), disse que não via sentido em votar o projeto agora. "Vai no sentido oposto ao que estamos tentando construir no código", afirmou.

CÓDIGO FLORESTAL: FIM DA ANISTIA AOS DESMATADORES?

Senador retira anistia a desmatadores e votação de relatório fica para novembro

O Globo 25/10/2011 às 11h51m
Catarina Alencastro

BRASÍLIA - O relator do Código Florestal nas comissões de Ciência e Tecnologia e da Agricultura do Senado, Luiz Henrique da Silveira (PMDB-SC), apresentou nesta terça-feira seu relatório sobre o Código Florestal.

Em seu texto conforme antecipou O GLOBO, ele retira a previsão automática de anistia a quem havia desmatado Áreas de Preservação Permanente (APPs) até julho de 2008 e retira brechas para que novas anistias ocorram no futuro. Um artigo do texto deixa claro que esta é a única previsão de regularização ambiental que será permitida. Luiz Henrique também aumenta a preservação dos manguezais, cuja proteção havia sido reduzida no projeto aprovado em maio pela Câmara.

O texto foi elogiado pelos senadores, mas houve pedido de vista coletiva. A votação da matéria ficou marcada para o próximo dia 8. Depois desta etapa, o Código Florestal passa ainda pela Comissão de Meio Ambiente e pelo plenário do Senado, quando então volta para a Câmara para a aprovação final dos deputados.

- O senador Luiz Henrique teve a habilidade de acolher esse conjunto de propostas, dando ideia da democracia que ele aplicou. Seu texto melhora substancialmente o que veio da Câmara - apontou a senadora Ana Amélia (PP-RS).

Em seu texto, Luiz Henrique acolheu dezenas de emendas apresentadas pelos colegas. O relatório, embora não trate de mecanismos de incentivos econômicos e fiscais para que produtores preservem ou recuperem suas terras, traz a previsão de que o Executivo envie, 180 dias após a aprovação do novo Código, um projeto de lei sobre o tema.

Saiba mais:

- Correio Braziliense: Pedido de vista adia para o dia 8 votação do Código Florestal no Senado
- Estadão: Relator do Código Florestal propõe compensar preservação
- Estadão: Kátia Abreu: Código Florestal deve ser votado em 22/11

24 outubro 2011

AUMENTO DA PRODUTIVIDADE NA PECUÁRIA DE CORTE

Estudo da USP/Pirassununga elevou a produção de carne para 600 kg/ha, ante os 54 kg da pecuária tradicional. O investimento necessário é de cerca de R$ 5 mil/ha e a taxa de retorno [lucro] é de 11% ao ano. Vale lembrar que a aplicação na poupança traz um retorno de cerca de 7%.

Valéria Dias
Agência USP de Notícias

Na pecuária de corte tradicional brasileira, cada hectare (ha) de terra — que equivale a 10 mil metros quadrados (m²) — é usado para a pastagem de um único animal, levando a uma estimativa de produção anual média de carne em torno de 54 quilos (kg)/ha. Porém, neste mesmo espaço, quase do tamanho de um campo de futebol, é possível criar, ao mesmo tempo, 8 animais e ainda assim elevar a produção de carne para 600 Kg/ha ao ano. Essa alta produtividade pode ser encontrada no sistema de pastagens de alta lotação de animais, desenvolvido na Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia (FMVZ) da USP, em Pirassununga.

“Essa produção elevada decorre de uma série de fatores que incluem, entre outros, nível alto de adubação da pastagem com nitrogênio e o confinamento do gado durante os meses de inverno. Nesse período de estiagem, o gado recebe uma dieta a base de milho, soja, cana-de-açúcar e ureia a fim de levar a um desempenho máximo dos animais”, explica o professor Luis Felipe Prada e Silva, do Laboratório de Pesquisa de Gado de Corte, do Departamento de Nutrição e Produção Animal (VNP) da FMVZ.

De acordo com o professor, “Dados da Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carnes [ABIEC] indicam que, no Brasil, em 2010, foram produzidas 9,2 milhões de toneladas de carne em equivalentes de carcaça. Se dividirmos este número por 170 milhões de hectares, que é a área de pasto existente no país, chegaremos ao número de produção anual de carne de 54 Kg / ha”, esclarece.

Prada e Silva comenta que, atualmente, a pecuária de corte tradicional, no estado de São Paulo, está deixando de ser atrativa, pois não consegue ser tão competitiva em relação ao cultivo de cana-de-açúcar ou laranja, ou mesmo à pecuária leiteira. “A criação de gado de corte está mudando para o norte do País, em regiões de terras mais baratas e de fronteira. Com isso, há uma intensificação do desmatamento de florestas. Vende-se a madeira de forma a ocupar a área desmatada com pastos destinados a pecuária de corte”, explica o coordenador do Laboratório.

No entanto, como mostram os estudos da FMVZ, é possível sim inverter este quadro. “Nosso objetivo é promover a intensificação da pecuária de corte, tornando possível que um número maior de animais sejam criados numa mesma área, com alta produtividade”, destaca o professor. Os professores Augusto Hauber Gameiro e Angélica Pereira, do VNP, também integram o projeto, além de cerca de 15 pesquisadores, entre mestrandos e doutorandos, que desenvolvem estudos com o grupo.

Uma dessas pesquisas foi desenvolvida pelo pesquisador Rinaldo Rodrigues. Orientado pelo professor Gameiro, Rodrigues realizou, durante o seu mestrado, uma análise econômica da iniciativa implantada no campus de Pirassununga. A conclusão do trabalho é que o sistema de pastagens de alta lotação de animais é competitivo mesmo em regiões de terras mais caras utilizadas para a plantação de laranja e cana-de-açúcar.

Diferenciais

O sistema começou a ser implantado em 2009 numa área de 25 ha do campus de Pirassununga e passou a funcionar plenamente em 2010. A criação, atualmente, conta com 240 animais, de bezerros a animais adultos. A maioria é criada no pasto. Já os machos adultos próximos ao abate (de 16 a 20 meses) ficam em confinamento. “A média nacional para o abate de machos é de 36 a 48 meses”, informa o pesquisador.

No sistema desenvolvido na USP, as fêmeas têm a primeira cria aos 24 meses. No Brasil, isso ocorre, em média, entre os 36 e os 48 meses. A fertilidade também é outro diferencial: na média brasileira, a cada 100 vacas expostas aos touros, entre 50% a 60% ficarão prenhes. No sistema implantado na FMVZ, esse índice é de 90%.

A adubação do pasto é outro ponto importante. “A maioria dos pecuaristas não cultivam o hábito de adubar o pasto. Em nosso sistema, chegamos a utilizar cerca de 300 quilos de nitrogênio por hectare ao ano”, destaca.

Luis Felipe Prada e Silva ressalta que um dos focos do grupo de pesquisa é convencer o governo de que existem formas eficientes de prevenir o desmatamento das florestas do norte do País. “Isso pode ser feito fornecendo crédito para os pecuaristas investirem em suas propriedades a fim de se adaptarem ao sistema de pastagens de alta lotação de animais”, diz. Segundo o professor, o investimento ficaria em torno de R$ 5 mil por ha para a adaptação da propriedade ao confinamento, manutenção de pastos, cochos, sem contar o valor dos animais. “Nossos estudos indicam que a taxa interna de retorno [lucro] é de 11% ao ano. Vale lembrar que a aplicação na poupança traz um retorno de cerca de 7%.”

Imagens cedidas pelo pesquisador

A DERROCADA DA UNIÃO NACIONAL DOS ESTUDANTES-UNE

A UNE hoje é só fabricante de carteirinhas

Paulo Mathias*
Folha de S. Paulo

A entidade precisa retomar para si a responsabilidade de lutar pelas causas nacionais, no geral, e pela melhoria do ensino, em particular

A história recente do Brasil em muito se mistura à da União Nacional dos Estudantes, a UNE. Fundada no dia 11 de agosto de 1937, a entidade atuou fortemente em favor de causas fundamentais para o país, como a democracia, o respeito aos direitos individuais e à escola pública e gratuita, a redução do valor das mensalidades e a reforma universitária.

Foi a UNE que, em 1992, foi às ruas com sua legião de caras-pintadas, abrindo caminho para o movimento que culminou com a cassação do então presidente Fernando Collor de Mello.

A trajetória aguerrida da entidade, porém, se esvaziou com a chegada do PT ao poder. A UNE de hoje não é, nem em sombra, aquela que lutou bravamente pela redemocratização, que gritou no calor das "Diretas-Já!" ou que foi às ruas no "Fora, Collor". Um exemplo recente foi a ausência da entidade nas manifestações contra a corrupção que ocorreram em todo o país no feriado de 7 de Setembro.

A atuação da UNE do século 21 está mais alinhada à dos partidos da base do governo federal do que às necessidades dos universitários brasileiros. Patrocínios de empresas públicas federais, como a Petrobras, estão estampados no site da entidade. O último congresso da UNE, realizado em julho, contou com apoio maciço do governo petista, cujos ministros (ao lado do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva) foram as estrelas principais.

Não nos parece que, a partir de 2003, os problemas da educação tenham terminado. Pelo contrário. As universidades federais estão sucateadas, com obras paradas e prédios que servem apenas para segurar placas de inauguração de espaços que não são, de fato, utilizados para formar bons profissionais.

O fato de o Brasil contar com programas de bolsas de estudo, apesar de importante, não resolve os problemas da falta de infraestrutura das universidades, do preço das mensalidades e da baixa qualidade do ensino.

O jovem brasileiro precisa de uma entidade representativa e independente, que participe das grandes discussões nacionais sobre educação, que envolva e integre o estudante. Infelizmente, quando pensamos na UNE hoje, vem à mente apenas uma entidade que fabrica carteirinhas de meia-entrada.

É natural que um jovem que goste de política se filie a um partido. O que não é natural é que, em um cenário tão amplo quanto o universitário, uma organização como a UNE não expresse a voz da ampla maioria dos estudantes e privilegie uma burocracia que visa à perpetuação do poder.

Parcela expressiva da base do movimento estudantil, os dirigentes de centros acadêmicos, diretórios centrais de estudantes e atléticas não são filiados a partidos, mas desfrutam de notável legitimidade aos olhos dos colegas.

Como diz o grito dos militantes, a UNE representa e dá voz à juventude do país. É preciso, portanto, que retome para si a responsabilidade de lutar pelas causas nacionais, no geral, e pela melhoria do ensino, em particular. Que encerre esse ciclo de partidarização e reencontre a sua missão fundamental: fazer política em prol do bem comum e de melhorias significativas para o Brasil.

* Paulo Mathias é vice-presidente do Centro Acadêmico XXII de Agosto da PUC-SP e presidente da Juventude do PSDB de São Paulo.

21 outubro 2011

ACRE, A SIBÉRIA TROPICAL (FINAL)

Que razões obscuras levaram o infante governo republicano a desterrar para os “confins” da Amazônia, no Acre, quase 1900 homens e mulheres após as revoltas da Vacina (1904) e da Chibata (1910)?

Do Rio de Janeiro para a Sibéria Tropical: Prisões e Desterros para o Acre nos Anos de 1904 e 1910 (*).

Francisco Bento da Silva (**)

[Jornal do Brasil. Geographia política, ano XIII, nº 334, 29/11/1904, p. 01. Acervo da Fundação Biblioteca Nacional].

Porque a República escondeu os indesejados?

Nos dois casos citados, os desterrados foram todos penalizados com o desterro sem que quaisquer processos tenham sido abertos contra eles. Eram criminosos sem que crime algum fosse atribuído formalmente às suas pessoas. Tal situação era uma exceção provocada e sustentada pela instituição do estado de sítio, adotado pelo governo brasileiro nos dois episódios.

Entre os desterrados de 1904, nos jornais que fizeram a cobertura à época, aparecem apenas alcunhas dos chamados desordeiros que foram presos e banidos: o crioulo Horácio José da Silva, o vulgo Prata Preta (considerado líder das desordens em “Porto Artur”, no bairro da Saúde), Rato Branco, Truvisco, Machadinho, Almeidinha, Bombacha, Chico da Baiana, Valente, Chico Maluco, João Galego, José Moleque (José Antônio Vieira), Manduca de Luto (filho do açougueiro do bairro) e muitos outros “desordeiros” sem nomes e apenas com seus apelidos conhecidos, que somente aparecem juntos com outros silenciados nos números frios das estatísticas.

O jornal A Noticia (27/12/1904) assim narrou a partida do navio Itaipava na noite do feriado do dia 25 de dezembro de 1904, quando os deportados foram presenteados com uma viagem só de ida para o norte do país, um lugar que parte deles nem chegou conhecer, pois morreu antes:

“Dos porões do navio partiam rumores surdos, gritos, imprecações, blasfêmias (...). Ali, amontoados na maior promiscuidade, crianças e velhos, negros e brancos, nacionais e estrangeiros. Nos porões nenhuma luz! Os 334 condenados, quase nus, debatiam-se nas trevas, com enormes ratazanas que, audaciosamente, os atacavam, cobrindo-os de dentadas. Nos porões os presos sem apoio rolavam uns sobre os outros, magoando-se, escorregando na lama nauseabunda de fezes e vômitos”.

O debate acerca da situação dos degredados tanto da Revolta da Vacina quanto da Revolta da Chibata gerou na capital da Republica calorosas discussões.

O deputado Luiz Domingues protocolou requerimento onde solicitava do poder executivo informações sobre os desterrados para o Acre, cuja mensagem presidencial do dia 29 de maio de 1905 já afirmava: “foram, para garantia da ordem pública, retirados desta Capital para o território do Acre, como desordeiros reconhecidos e indivíduos de má reputação”. O requerimento fazia algumas indagações básicas: quantidade, nomes, nacionalidades dos degredados, em que trabalhavam, onde moravam, porque não foram julgados como outros indivíduos que tomaram parte do movimento, por que não foram submetidos a crimes sujeitos a fiança, etc. Depois do Estado de sítio, o Estado os traria de volta? Se eles não foram acusados do crime de desterros, que crime cometeram? Eles estavam vivos? Onde estavam?

O então deputado situacionista Garcia Pires afirmava categoricamente em discurso que a ação do governo serviu “para a salvação da cidade e para que nos víssemos livres de um desses movimentos que, por honra nossa, deveria ser apagado das páginas de nossa história”. Em seu pronunciamento ele afirmou:

“Não faço injúria de dizer que os conflictos dos dias 12, 13, 14 e 15, nesta cidade, foram praticados pela população da Capital Federal. Não; os homens trabalhadores, os que concorrem para a riqueza pública, esses absolutamente não se envolveram em taes conflictos. Vi nas ruas da cidade essa classe infeliz de indivíduos que abundam em todas as capitaes, homens inteiramente despreoccupados com do sentimento da honra, noctívagos, vagabundos, batedores de carteiras; eram esses que quebravam os lampeões e atacavam as propriedades particulares”.

Em relação aos desterrados da Revolta da Chibata, ocorrida 06 anos depois, o governo utilizou o mesmo procedimento adotado para o caso anterior. Mais uma vez os parlamentares se debruçam num debate em torno dos “criminosos sem crimes” enviados mais uma vez à Amazônia.

O então senador Rui Barbosa, em sessão de agosto de 1911, teceu seus comentários acerca dos passageiros do “navio fantasma” Satéllite nos seguintes termos:

“sobre o caso do navio Satélite chama o governo ‘verdadeiras feras’ aos 400 ex-marinheiros da nossa esquadra desterrados para o norte, nas regiões do Madeira. (...) trataram de ocultar as prisões negando-as até aos membros da Câmara dos Deputados que acudiram à polícia interessados em restituir à liberdade dos detidos”.

Barbosa afirmou que devido às arbitrariedades cometidas nas prisões e a falta de informações precisas sobre os desterrados, o Brasil era um país que ainda aspirava à condição de civilizado, mas os desterros era um fato que aviltava “o Brasil abaixo das últimas nações” do mundo.

Em seguida Rui Barbosa leu uma correspondência, enviada por uma testemunha ocular, sobre as últimas informações do navio Satélite. O missivista, Booz Belfort de Oliveira, justificou sua ausência prolongada da capital da República devido aos resultados negativos das eleições ocorridas em novembro do ano anterior, levando-o a dirigir-se para a região Norte a fim de realizar trabalhos como Auxiliar de Serviços Sanitários na Comissão Rondon. Ele confirmou que estava em Belém quando soube da Revolta da Armada e depois se dirigiu à vila de Santo Antônio do Rio Madeira para atuar na Comissão Rondon, onde soube que os desterrados seriam enviados para trabalhar nesta Comissão e na construção da Estrada de Ferro Madeira-Mamoré. Segundo ele na manhã do dia 03 de fevereiro o coronel Cândido Rondon recebeu 200 homens e o restante foi recusado pelos administradores da Estrada de Ferro Madeira-Mamoré. O navio então permaneceu ancorado e seus passageiros-prisioneiros em estado de quarentena, impedidos de descer do Satéllite durante alguns dias.

Foi então constituída uma Comissão, da qual Belfort de Oliveira fez parte, que constatou a seguinte situação: “posta a prancha para o barranco, conseguimos entrar a bordo. Soubemos estarem todos recolhidos nos porões do vapor, todos os prisioneiros, trezentos e tantos homens e quarenta e uma mulheres”. No comando da guarda do navio estava o primeiro-tenente Matos Costa, que a relatou para a Comissão os acontecidos durante a viagem pela costa brasileira, principalmente a ocorrência de fuzilamentos de alguns degredados que supostamente teriam tentado criar um motim a bordo e atentado contra a vida do comandante. De acordo com o tenente Matos Costa, na saída do porto baiano, houve a eliminação de nove desterrados: sete por fuzilamento e dois teriam se jogado ao mar antes dos tiros. Serviram de exemplo pedagógico para obstar qualquer nova tentativa dos demais prisioneiros em criar novos tumultos nos porões. Tudo ocorreu com carta branca do governo.

Depois das explicações do comandante, este permitiu que os porões do navio fossem abertos. Eis o que relatou a testemunha ocular:

“A guarnição formou ao longo do navio armado em guerra, de carabinas embaladas, os porões foram abertos, e, a luz de um sol amazonense (sic), os quatrocentos desgraçados foram guindados como qualquer cousa, menos corpos humanos, e lançados ao barranco do rio. Eram fisionomias esguedelhadas, mortas de fome, esqueléticas, e nuas como lêmures das antigas senzalas brasileiras. As roupas esfrangalhadas deixaram ver todo o corpo. As mulheres, então, estavam reduzidas às camisas”.

Então ele relata que uma porção de seringueiros começou a escolher aos lotes homens esfarrapados e magros, que mostravam restos de uma robustez passada, para realizarem trabalhos de cortes de seringa nos vastos seringais amazônicos. Já as mulheres, segundo o cronista, “como lobas famintas, entregaram-se a prostituição, para sustento do corpo e a estas horas talvez não existam mais”.

Nem todos os desterrados da Revolta da Chibata eram marinheiros, a grande maioria era de civis, presos durante o período do estado de sítio ou recolhidos na Casa de Detenção. Aqueles que ficaram a serviço da Comissão Rondon, Belfort de Oliveira relata que dormiam no chão, sem agasalho ou proteção contra os mosquitos anófeles e amanheciam sob o nevoeiro de “friagens malditas”. Realizavam serviços brutais sob o calor de 39º celsius e careciam de alimentação compensativa às suas necessidades diárias de calorias. Inclusive, ocorrendo na própria Comissão casos de fuzilamentos como relata Belfort de Oliveira em determinada passagem da sua carta.

Terminada a leitura da carta na tribuna, Rui Barbosa passou a fazer suas considerações com apontamentos voltados à luz do direito, sua seara. Afirmou a todos que tudo aquilo compunha um quadro horrendo de grosseria e desumanidade, uma abolição completa do respeito à vida, um nivelamento de seres humanos às criaturas irracionais e um desprezo “aos progressos cristãos de nosso tempo”. E continua diante de todos: “Em toda minha vida política, nos quarenta anos de sua duração, é o mais cruel dos cruéis desenganos por que tenha passado a minha consciência de homem sincero”. Contudo, sua indignação e denúncia não afetam as posições defendidas pelo governo e parte da imprensa que apoiaram aquelas medidas.

Já os desterrados de 1904, pouco conhecemos sobre suas vidas no Acre. Ainda hoje, o que sabemos é que saíram com destino a esta localidade e alguns jornais acreanos atestam a chegadas destas pessoas pelo menos nas cidades de Cruzeiro do Sul e Xapuri. Resta-nos, seguir os parcos indícios deixados nas margens através de poucos documentos e fazer o diálogo possível com estes lampejos que chegaram até nós. Como é o caso do Preto Lycurgo, alcunha de Álvaro de Carvalho, que foi preso alguns anos depois na cidade de Xapuri acusado de ter cometido um assassinato naquela cidade.

Amazônia, uma terra “sem história”

Porque a Amazônia? O olhar de grande parcela dos homens do sul do país — pertencentes à intelligentsia da época — desde muito tempo estava condicionado pela idéia de que a Amazônia era uma terra ignota, distante, inóspita e inadequada à presença humana. No zeitgeist (espírito do tempo) dominante à época, aqueles que nela habitavam eram considerados sujeitos que estavam em descompasso com certa visão acerca da “história nacional” e com os ideais civilizatórios, de lampejos eurocêntricos, que desembarcavam aqui nos trópicos.

O próprio antropólogo belga Claude Levi-Strauss, em sua obra Triste trópicos, referiu-se à região como “o mundo perdido”, de populações enigmáticas, uma terra proibida e ainda desconhecida da civilização, localizada para além das franjas do sertão do Brasil central onde ele realizou seus estudos etnológicos. Talvez o título do capítulo de sua obra remeta a uma possível leitura sua da obra do escritor Arthur Conan Doyle, lançada em 1912, chamada por sinal de O mundo perdido.

Quando o escritor Euclides da Cunha tem seu primeiro contato com a Amazônia, logo ele afirma existir uma Amazônia real e outra imaginada. Esta última seria aquela presente nos relatos de cronistas e viajantes desde o XVI. No capítulo Terra sem história, de sua obra póstuma A margem da História, ele afirma que a imagem real é inferior a subjetiva, tecida ao longo dos tempos. Segundo suas impressões telúricas constituídas in loco, faltava harmonia estética, beleza equilibrada à Amazônia, portadora de uma grandeza monótona, de horizontes vazios e indefinidos numa planura desmedida.

Nesse meio físico que era a Amazônia, Cunha apontava que o homem chegou como um intruso impertinente. Aparecera sem ser esperado e querido, quando a natureza era ainda uma opulenta desordem. A Amazônia aparecia aos seus olhos como pertencente à outra era geológica. Mais que um descompasso temporal, havia também um descompasso civilizatório e cultural da população local. Era uma região que tinha tudo e faltava tudo (artes, ciências, história, compreensão), dizia ele. Por isso ele considera que na Amazônia o brasileiro, mesmo pisando em terras pátrias, era um estrangeiro que não fincava raízes no lugar. A própria Amazônia era uma terra sem pátria, um local selvagem que impressionava uma civilização distante, que seria o sul do país, o litoral que há muito era a antítese do Sertão (idem, ibidem).

Esta natureza brutal e soberana seria sempre uma adversária do homem: diante do homem errante a natureza era estável; para o homem sedentário, ela seria revoltosa e volúvel. Por isso, a Amazônia se caracterizava por ser uma terra de nomadismo, da inconstância que remetia à figura metafórica dos seus rios erráticos. E era/é através dos rios, que se chega(va) aos seringais, que nada mais são que um misto de paraíso e inferno na visão euclidiana. Um mundo feudal, torto e bronco em “descompasso evolutivo”. Malgrado suas idiossincrasias culturalistas, seu tom é de denúncia.

Vejamos também como Belfort de Oliveira rememora suas impressões acerca dos degredados que ele observara desembarcando nas alastrantes terras amazônicas:

“...ali (na Amazônia) impera o cinismo, o crime, o contrabando e todas as misérias da humanidade (...) também sofrem os soldados, que recrutados em todos os estados da União, com as mesmas bazófias do futuro, vão para servir de escravos a mando de braços bordados de galardões, chibateados da manhã à noite”.

É também um misto de denúncia dos poderosos do mundo dito civilizado em oposição da vida sofrida do homem comum em uma terra sem lei e sem ordem. Visão semelhante a sua é a do inglês Henry Whistler, que em 1654 se referia desta forma ao relatar o fato da Inglaterra mandar para a colônia caribenha de Barbados seus degredados: “Esta ilha é um monte de estrume onde a Inglaterra despeja seu lixo: vadios e prostitutas e outras pessoas do tipo são as que em geral trazem para cá”.

A Amazônia adquire então aspecto parecido ao descrito por Whistler, um depósito para o “lixo”, para o “estrume social” indesejado e produzido pelas contradições do modelo republicano, que estava em transição de um renegado passado monárquico e escravista que teimava em permanecer com alguns traços nos comportamentos e feições de parte da população. Junto a isso, havia ainda o processo de urbanização e remodelamento da capital da República que vinham sendo implementados desde a última década do XIX, bem como as políticas de saúde pública com a vacinação obrigatória.

Estes sujeitos desterrados eram os homens e mulheres que, nos dizeres de Euclides da Cunha, “levavam a doloríssima missão de desaparecer” quando foram condenados ao desterro no Acre, a “Sibéria tropical”. Região vista como um local adequado aos recalcitrantes, por ser essa região considerada erma, distante, vazia, sem civilização, sem cultura constituída e, portanto, sem história. E o Acre, apenas “uma vaga expressão geográfica, um deserto empantanado, a estirar-se sem limites”.

Neste sentido, a natureza amazônica com sua grandiosidade, seus “vazios” demográficos e seus perigos, seria uma mãe disciplinadora para os filhos rebeldes da Nação, que iriam ser “polidos” nas suas brutezas pela natureza e amaciados pelas dificuldades de adaptação que ela ofereceria àqueles que também “chegam sem ser convidados” (CUNHA, 1998).

Foram então condenados a viver, — ou morrer —, no Acre, entre uma “vaga população erradia e dispersa, perdida em um recanto selvagem da Amazônia”, como se refere Oliveira Vianna (Oliveira Viana, 146). Uma população que no entendimento deste sociólogo era formada majoritariamente por “cangaceiros tumultuários; jagunços explosivos e turbulentos; sertanejos rebeldes e indomáveis” (idem, p. 147). Se o Acre era assim, nada mais justo no imaginário de algumas personalidades da época em mandar pessoas com semelhantes predicados para viverem longe da república imaginada e sonhada. Foi assim que embarcaram em navios-prisões grupos heterogêneos de homens e mulheres para uma viagem sem volta, para um destino cruel, onde o horizonte que se apresentava era ou a morte ou o isolamento na “Sibéria tropical”.

Para os sobreviventes adventícios, restava o exílio na “própria” terra, num local afastado e desconhecido que paradoxalmente também era uma “outra” terra. Os defensores dos desterros acreditavam que somente por meio de um trabalho rigoroso e severo é que aqueles homens rudes e mulheres licenciosas teriam a oportunidade de abrandarem suas brutezas e práticas condenáveis pelo olho do poder civilizatório e policialesco que se tentava implantar na capital da nação brasileira. Vale lembrar que os verbos polir e policiar possuem a mesma matriz semântica. Neste sentido o Estado intentava exercer polimento e policiamento das mentes desviadas, dos corpos indômitos e das práticas condenáveis. Visava enquadrar os indivíduos para serem sujeitos “bons e do bem”, monopolizando a violência legal para instaurar a ordem imaginada.

Considerações finais

Neste breve artigo intentamos trazer ao presente algumas questões relativas aos desterros implementados pelo Estado brasileiro como punição e penalização aos “sujeitos incômodos”, considerados perigosos ao convívio social que se idealizava como correto na capital da república no início do século XX. Como afirmou certa vez Marc Bloch (2001), não existe passado morto. Existe passado esquecido — consciente e inconscientemente —, inacessível ou perdido. No caso dos desterrados, suas expulsões traziam a marca do isolamento, da tentativa de escondê-los nas selvas longínquas da Amazônia acreana. Além do banimento físico, se procurou bani-los da memória, apagar suas identidades e seus dramas à posteridade.

Se lembrarmos Andréas Huyssen (2000), diz ele que o lugar da memória em uma sociedade qualquer é determinado por uma rede discursiva complexa, portadora de aspectos rituais, míticos, históricos, políticos e psicológicos. Assim sendo, os acontecimentos do Rio de Janeiro envolvendo os desterros e os sujeitos por elas atingidos, tem relevância dada a presença dessa ampla rede discursiva atuando na imprensa da época, no sistema penal e policial do Estado brasileiro, nas representações em torno de uma história nacional, da República e da Nação. Pode se atestar que aqueles homens e mulheres desterrados não foram condenados somente pelo aparato repressivo republicano através do estado de sítio, mas acima de tudo condenados e punidos pela nova ordem política, moral e citadina que as elites brasileiras intentavam impor na capital do país.

Para saber mais/Referências bibliográficas

BARBOSA, Rui. Obras completas. Volume XXXVIII, tomo I. Fundação Casa de Rui Barbosa: Rio de Janeiro, 1911.

BLOCH, Marc Leopold Benjamin. (2001). Apologia da história ou o ofício do historiador. Tradução de André Telles. Rio de Janeiro. Jorge Zahar editores.

CARVALHO, Lia Aquino de. Contribuição ao estudo das habitações populares: Rio de Janeiro – 1886/1906. Coleção Biblioteca Carioca. Rio de Janeiro: Secretária Municipal de Cultura, 1995.

CARVALHO, José Murilo de. Os bestializados da República: o Rio de Janeiro e a República que não foi. 03ª ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2004.

CHALHOUB, Sidney. “Medo branco de almas negras: escravos libertos e republicanos na cidade do Rio”. In Revista Brasileira de História, São Paulo: ANPUH/Marco Zero, vol. 08, nº 16, pp. 83/105, 1988.

___________, Sidney. Cidade febril: cortiços e epidemias na Corte imperial. São Paulo: Companhia das Letras, 1996.

CUKIERMAN, Henrique. Yes, nós Temos Pasteur – Manguinhos: Oswaldo Cruz e a História da Ciência no Brasil. Rio de Janeiro: Faperj/Relume Dumará, 2007.

CUNHA, Euclides da. Um paraíso perdido. Rio Branco: Fundação Cultural do Estado do Acre, 1998.

________. A margem da história. Rio Branco: Fundação Elias Mansour, 2000. DO RIO DE JANEIRO PARA A SIBÉRIA TROPICAL: prisões e desterros para o Acre nos anos de 1904 e 1910 Francisco Bento da Silva Florianópolis, v. 3, n. 1, p. 161 – 179, jan/jun. 2011 179.

FOUCAULT, Michel. Vigiar e Punir: historia da violência nas prisões. Petrópolis: Vozes, 1987.

HUYSSEN, Andréas. Seduzidos pela memória: arquitetura, monumentos, mídia. Rio de Janeiro: Aeroplano, 2000.

LINEBAUGH, Peter. “Todas as montanhas atlânticas estremeceram”. In: Revista Brasileira de História, São Paulo: ANPUH/Marco Zero, nº 06, pp. 07/46, 1984.

LEVI-STRAUSS, Claude. Tristes trópicos. Tradução de Rosa Freire D’Aguiar. São Paulo: Companhia das Letras, 2001.

NASCIMENTO, Álvaro Pereira do. A ressaca da marujada: recrutamento e disciplina na Armada Imperial. Rio de Janeiro: Arquivo Nacional, 2001.

NEEDELL, Jeffrey. Belle èpoque tropical: sociedade e cultura de elite no Rio de Janeiro. São Paulo: Cia. das Letras, 1993.

OLIVEIRA VIANNA, Francisco. Pequenos estudos de psychologia social. 03ª edição, Rio de Janeiro: Companhia Editora Nacional, 1942.

PEREIRA, Leonardo Affonso de Miranda. As barricadas da saúde: vacina e protesto popular no Rio de Janeiro da Primeira República. São Paulo: Fundação Perseu Abramo, 2002.

ROCHA, Oswaldo Porto. A era das demolições: cidade do Rio de Janeiro – 1870/1920. Coleção Biblioteca Carioca. Rio de Janeiro: Secretária Municipal de Cultura, 1995.

TOCANTINS, Leandro. Amazônia: natureza, homem e tempo. 02ª edição. Rio de Janeiro: Civilização brasileira/Bibliex, 1982.

*Artigo originalmente publicado na revista Tempo e Argumento, v. 3, n. 1, p. 161–179, jan/jun. 2011.
**Professor do Centro de Ciências Humanas da UFAC. Graduado em Ciências Sociais, com mestrado e doutorado em História. Contato: chicobento_ac@yahoo.com.br.

20 outubro 2011

A NOVA DISTRIBUIÇÃO DA RECEITA DA EXPLORAÇÃO DE PETRÓLEO NO BRASIL

"Esses recursos adicionais, especialmente cobiçados por governadores e prefeitos de estados não produtores de petróleo, não garantem a distribuição de renda, educação, saúde, saneamento, bem-estar e segurança aos que mais necessitam. Para isso vai ser preciso travar uma guerra para garantir a aplicação devida e a distribuição necessária desses recursos".

Evandro Ferreira
Blog Ambiente Acreano
[Atualizado às 10:05h]

O Senado aprovou ontem o novo modelo de distribuição das receitas (royalties) do petróleo. Segundo o texto aprovado, no próximo ano a fatia da União cai de 30% para 20%, a dos estados produtores de 26,25% para 20% e a dos municípios produtores 26,25% para 17%.

Os maiores perdedores com a aprovação do novo modelo de distribuição das receitas são os estados e municípios produtores, que deixarão de arrecadar R$ 3,6 bilhões no próximo ano, e a união, que terá que abrir mão de R$ 2,5 bilhões. Os maiores beneficiários serão estados e municípios não produtores, antes excluídos do bolo, que vão ganhar R$ 8 bilhões já no próximo ano.

O Acre, que hoje recebe cerca de R$ 8 milhões por ano, poderá receber cerca de R$ 280 milhões já em 2012, valor que atingirá mais de R$ 500 milhões por ano quando a exploração do petróleo do Pré-Sal atingir seu pico por volta de 2022. Neste ano de 2011 estima-se que a distribuição de royalties do petróleo extraído do mar chegue R$ 25 bilhões.

Segundo nota do jornal Folha de S. Paulo, o texto aprovado ainda será analisado pela Câmara e atinge todas as áreas licitadas, inclusive do pré-sal, pelo regime de concessão. Também está previsto um sistema de partilha para a exploração de novas áreas de petróleo do pré-sal, em que uma parte da produção fica com o governo.

Os estados e municípios que saíram perdendo com a nova distribuição da renda do petróleo ameaçam ir à justiça para garantir que as mudanças não afetem a renda derivada de áreas já licitadas. Esses são os casos dos estados do Rio de Janeiro e Espírito Santo que alegam que, além de ser inconstitucional, o corte na arrecadação irá causar graves problemas sociais em razão da impossibilidade de repor, por outras fontes, os recursos que eles tem usado para beneficiar as populações “afetadas” pela exploração do petróleo feita em alto mar.

Segundo a jornalista Eliane Catanhêde, da Folha de S. Paulo, a ‘guerra’ deflagrada pela alteração nas regras da distribuição da renda da exploração do petróleo é pela quantidade e não pela qualidade dos recursos. Ela não tem a ver com o bem-estar que podem levar às populações mais pobres de uns e de outros.

E ela dá dois exemplos. Macaé (RJ), conhecida como a capital do petróleo brasileiro, cresceu e apareceu, apresentando um incremento populacional de 65 mil para 200 mil habitantes desde os anos 1970. A cidade tem um PIB per capita de R$ 42 mil, em valores de 2008, que corresponde ao dobro da média do Estado do Rio e o triplo da nacional. Apesar disso, só 17% dos domicílios têm saneamento básico, os índices de educação são baixos e os de homicídios, muito altos.

Presidente Kennedy (ES) também recebe grande volume de royalties, com o segundo maior PIB per capita do Estado e uma das maiores taxas de crescimento do país. Mas tem resultados do Ideb muito inferiores à média estadual, 17% de analfabetos e só 38% dos domicílios com saneamento básico. Está na 62ª posição entre 78 municípios pelo Índice Firjan de Desenvolvimento Municipal e no 2.688º lugar no ranking nacional.

A conclusão da jornalista paulista é de que royalties são bons e todo mundo gosta - especialmente governadores e prefeitos, sobretudo em ano eleitoral-, mas não garantem em si distribuição de renda, educação, saúde, saneamento, bem-estar e segurança.

Ela finaliza seu texto sugerindo que a guerra "de cima" para atrair os recursos do petróleo deveria ser acompanhada de outra guerra, "de baixo", para garantir a aplicação devida e a distribuição necessária desses recursos. Do contrário, o petróleo, embora sendo nosso não chegará a quem mais precisa.

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O texto acima foi baseado nos artigos ‘Senado aprova nova divisão da renda do petróleo’, de Márcio Falcão e Valdo Cruz (Folha de S. Paulo, 19/10/2011) e ‘O petróleo é de quem mesmo?’, de Eliane Catanhêde (Folha de S. Paulo, 02/10/2011).

Ilustração: Blog Momento Verdadeiro.

19 outubro 2011

JANTAR COM AHMADINEJAD

Minha esperança é que Lula ou outros amigos do Irã no governo brasileiro possam fazer essas perguntas a ele

Moisés Naín*
Folha de S. Paulo

Karim Sadjapour é meu amigo e colega no Carnegie Endowment, "think tank" (centro de estudos) onde trabalho. É também um dos maiores especialistas mundiais no Irã.
Alguns dias atrás Karim publicou um artigo no "Washington Post", um texto baseado em perguntas ao presidente Mahmoud Ahmadinejad.

Karim colheu as perguntas de ativistas iranianos pró-democracia e direitos humanos, que, obviamente, não têm acesso ao presidente. Como o Brasil é bom amigo do Irã e o presidente Lula desenvolveu laços pessoais estreitos com Ahmadinejad, pensei que seria boa ideia divulgar mais essas perguntas.

Minha esperança é que Lula ou outros amigos do Irã no governo brasileiro, quem sabe, possam formular as perguntas a ele diretamente -e discretamente.

Afinal, a explicação que Lula e o Itamaraty deram de seu longo silêncio público em relação às violações de direitos humanos no Irã, Cuba e Venezuela é que são mais eficazes quando transmitem suas mensagens reservadamente a Ahmadinejad, Castro e Chávez. Aqui, então, estão algumas perguntas que eles poderão colocar na próxima vez em que jantarem com o presidente Ahmadinejad.

- Seus adversários nas eleições de 2009, Mir Hossein Mousavi, 69, e Mehdi Karroubi, 73, estão sendo mantidos incomunicáveis há quase um ano. Com base em quê estão sendo mantidos em prisão domiciliar?

- A estudante de PhD Somayeh Tohidlou, 32, recentemente recebeu 50 chibatadas na prisão por ter "insultado" o sr. pelo fato de ter feito campanha por Mousavi em 2009. O sr. acredita que homens açoitarem mulheres por posições políticas é apropriado?

- O sr. disse em setembro de 2010 que "a liberdade é um direito divino". Isso se aplica aos bahai iranianos, que são perseguidos por praticarem sua fé, discriminados nos locais de trabalho e encarcerados por tentarem educar seus jovens, barrados das universidades?

- A Transparência Internacional, a Freedom House e o Banco Mundial dizem que os índices de corrupção, mal-estar econômico e repressão durante seu governo são mais altos do que eram no Egito de Hosni Mubarak e na Tunísia de Ben Ali. O sr. acredita que não terá o mesmo destino que eles?

- Os protestos antigoverno no Irã em 2009 foram significativamente maiores do que quaisquer protestos no Oriente Médio este ano, mas o sr. aludiu aos manifestantes como "poeira e sujeira". Por que?

- Durante sua presidência, o Irã vem tendo o mais alto índice per capita de execuções no mundo, incluindo execuções públicas recentes e a morte de acusados de serem homossexuais. O sr. se orgulha desse histórico?

- Ali Vakili Rad, condenado pela França em 1991 pelo assassinato brutal a facadas do ativista democrático iraniano Shapour Bakhtiar, 77, em Paris, teve uma recepção oficial de herói no aeroporto de Teerã ao ser libertado da prisão no ano passado. Por que seu governo glorifica assassinos?

Estas são apenas algumas poucas perguntas que escolhi, mas há muitas outras. Elas garantirão um jantar interessante. E colocá-las é a coisa decente a fazer.

*Escritor venezuelano, do Carnegie Endowment for International Peace, foi ex-editor-chefe da revista "Foreign Policy".

Tradução de Clara Allain