Google
Na Web No BLOG AMBIENTE ACREANO

28 fevereiro 2010

A DEMOCRACIA ESTÁ EM DECADÊNCIA

Entrevista com Humphrey Hawksley, especialista em relações internacionais e comentarista da rede britânica BBC

Adriana Carranca
Estadão, 14/02/3010

A democracia vive seu momento mais crítico desde a Guerra Fria, diz o especialista em relações internacionais Humphrey Hawksley, comentarista da rede britânica BBC. Em Democracy Kills: What"s So Good About the Vote? ("A Democracia Mata: O que há de tão bom sobre o voto?", em tradução livre), lançado em outubro e ainda indisponível no Brasil, ele faz uma compilação surpreendente das ameaças ao processo democrático.

Entre elas, o poderio econômico da China, a influência cada vez maior de países como Paquistão e Irã no perigoso jogo das relações internacionais e o fracasso dos EUA no Iraque e Afeganistão. Isso não significa que a população desses países não quer democracia. Só não está convencida de suas vantagens. Para afegãos e iraquianos, o sistema não trouxe melhor qualidade de vida. Ao contrário, intensificou a violência e a pobreza, enquanto os chineses enriquecem sob o regime autocrático de Pequim e a mão pesada do Exército Popular.

Há exemplos em que o resultado do processo eleitoral não é reconhecido pelo Ocidente, como nos territórios palestinos. "O mundo vê isso e pergunta: os EUA defendem a democracia, mas desde que vença quem eles querem no poder?" Se até as eleições diretas, alicerce da democracia, estão em xeque, o que resta ao sistema? Em entrevista ao Estado, por telefone, Hawksley tenta responder à questão que deixou em aberto em seu livro.

A democracia está em risco?

Em países com instituições fracas - Legislativo, Judiciário, Ministério Público -, ela é um risco em si. Governos altamente corruptos manipulam o sistema em favor de interesses próprios, como no Congo. E não está funcionando em muitos lugares, como no Iraque. A população acaba buscando alternativas. Isso é muito comum quando as pessoas se veem colocadas em perigo pela democracia. No Afeganistão, vivia-se sob um regime autoritário, mas se seu vilarejo é bombardeado, oficiais corruptos roubam sua casa, sua mulher é estuprada, você vai preferir a volta do Taleban.

Mas a culpa é da democracia?

Em locais como Afeganistão e Iraque, sim. Veja, em 2003, os EUA invadiram o país, depuseram Saddam Hussein e entregaram a tão clamada democracia para os iraquianos. E o que aconteceu? De repente, eles se viram livres e mergulharam em uma guerra civil. Isso faz com que países como China, Rússia ou Cingapura digam para seu povo: para que isso? E as pessoas aceitam, porque estão com medo da democracia.

O que fazer, então?

Em vez de ir para Afeganistão, Iraque, Mianmar ou Cuba e dizer "queremos trazer eleições para o seu país", o certo seria ajudá-los a ter um sistema melhor de governança, com instituições fortalecidas, menos corrupção. Assim, você tira a ideologia do acordo. E a democracia virá com o tempo.

Países como Irã ou Rússia podem ser considerados democracias?

Acho que a Rússia tentou a democracia após o fim da Guerra Fria, mas não funcionou - a máfia russa tomou conta e vieram novos conflitos. Por isso, o país voltou atrás, adotando um estilo mais autoritário. A liberdade foi cerceada, não há acesso à informação. No Brasil, você tem muito mais meios de fazer críticas a Lula do que os russos ao (primeiro-ministro Vladimir) Putin. Então, nesse sentido, não é uma democracia. Já o Irã é um caso interessante, porque há um sistema. Nas eleições de junho, havia dois partidos com visões distintas muito claras. Mas, quando o povo decidiu ir às ruas protestar (contra supostas fraudes), o aparato do Estado foi para cima deles. Então, a democracia iraniana é sobreposta pelo guarda-chuva dos clérigos. No entanto, toda sociedade é assim. Na Grã-Bretanha, o Partido Nacional, de ultradireita, está prestes a desaparecer porque as pessoas o acusam de ser racista e de criar tensões entre etnias e regiões. Cada país tem seu guarda-chuva ideológico. Nós só não aprovamos o do Irã.

Havia consenso de que a economia das democracias vai melhor...

Mas, hoje nós temos a China. As pessoas se perguntam: em tempos de crise econômica e de aquecimento global, como os EUA podem ainda dar as cartas? Os Emirados Árabes, autocráticos, são outro exemplo. Trabalhadores da Índia, Bangladesh e Filipinas emigraram para Dubai, porque suas democracias não foram capazes de alimentá-los.

Mas as ditaduras não melhoraram ao se tornarem democracias?

Só há dois ou três exemplos bem sucedidos: Coreia do Sul e Taiwan. Talvez, Chile. Mas, em nenhum desses casos, a mudança ocorreu do dia para a noite. No Chile, Augusto Pinochet cometia atrocidades, mas, ao mesmo tempo, implementou a reforma econômica, que mais tarde facilitaria o ambiente para a democracia chilena.

E não estavam em guerra, como Iraque e Afeganistão...

Não, mas eles podiam ter seguido por esse caminho. A Coreia do Sul tinha a fronteira mais militarizada do mundo, com a Coreia do Norte. Taiwan poderia ter enfrentado a China com explosões, ataques suicidas, como no Oriente Médio, ou com qualquer outra arma. Podiam continuar se considerando refugiados, como os palestinos. Mas, em vez disso, eles se estabeleceram e concentraram energias em fabricar computadores. E estão fazendo isso muito bem.

Como você vê a relação econômica das democracias com a China?

Basicamente, desde o Iraque e Guantánamo, e dos episódios de tortura em Abu Ghraib, toda essa plataforma americana por democracia e direitos humanos caiu por terra. E ninguém mais está pedindo a Pequim que assine qualquer compromisso de apoio aos EUA ou de respeito aos direitos humanos, ou ainda que se transforme em uma democracia. Esses argumentos pouco importam, porque a China está no topo do mundo, não está? E os chineses estão enriquecendo e vendo sua qualidade de vida melhorar. A China é o principal desafio à sobrevivência da democracia.

E Guantánamo? Foi a pá de cal na credibilidade do sistema?

Guantánamo, Abu Ghraib, a completa falta de planejamento na ocupação do Iraque, onde os principais contratos de reconstrução foram dados para companhias americanas. Se você é um iraquiano, assistindo a tudo isso enquanto seu irmão está sequestrado, seu pai foi morto e a sua casa foi bombardeada, você se pergunta: que diabos está havendo? E os líderes autoritários se aproveitam de todo o histórico da política externa americana. Houve o Chile, Vietnã, Irã, palestinos. Desde o fim da Guerra Fria, o Ocidente tenta impor a democracia. Mas, primeiro, na condição de que concordem com quem é eleito. Segundo, sem dar nenhuma prova de que o sistema seja, de fato, mais eficaz em reduzir a pobreza e melhorar a vida das pessoas. Isso põe em perigo a democracia, porque sua credibilidade é questionada.

O sucesso da democracia depende de quem está no comando?

Depende de uma liderança que tenha como foco, todo o tempo, melhorar a qualidade de vida da população. Isso significa fortalecer as instituições, atacar a corrupção e dar tempo para a democracia prevalecer.

Mas isso não é realidade em muitos países livres. O que fazer?

Eu ainda não encontrei alguém que tenha conseguido nem sequer começar a responder isso. A pergunta que coloco logo no início do livro é: por que o Haiti (antes do terremoto de janeiro) é tão pobre se teve à disposição o que a democracia pode oferecer e Cuba, embora não seja um país rico, é estável e a população tem acesso a educação e saúde? Alguém pode responder?

Regimes autoritários são bons?

Digamos que, se a democracia é mesmo o caminho, então terá de se provar porque o Ocidente não em sido eficiente em convencer o mundo disso. O autoritarismo não é bom, mas a democracia precisa de um ambiente propício. Só quando se está preparado para votar em ideias, e não em etnias ou grupos, a democracia prevalecerá. Enquanto se votar pelo candidato sunita ou xiita, indiano ou paquistanês, não. Nos EUA, o fato de Obama ter sido eleito significa que os americanos venceram o elemento racial e aprenderam a votar em quem tinha as melhores ideias.

Após dois mandatos de Bush...

Bem, sim (risos). Acho que Bush foi um catalisador, mas se os americanos não considerassem votar em um negro, teriam eleito Hillary Clinton. E levou mais do que dois mandatos de Bush para que os EUA chegassem a isso. A guerra civil acabou em 1864, mas o direito de voto só foi dado aos negros em 1964. Foi preciso um século de negociações e processos democráticos. Mas, se houver melhora a cada geração, estaremos bem. Veja Taiwan: gradualmente permitiu à população enriquecer e, então, comprar propriedades e, com isso, pagar impostos, o que levou à inclusão do povo no debate sobre o gasto público e a um papel maior da imprensa, que, por sua vez, pressiona por um Judiciário independente. A democracia precisa de tempo para amadurecer.

Como vê a democracia no Brasil?

No fim da Guerra Fria, a América Latina tinha instituições desenvolvidas e uma política dividida entre esquerda e direita. Apenas isso já coloca o Brasil e seus vizinhos muito à frente dos países do Oriente Médio, África e parte da Ásia, onde as eleições têm bases étnicas, tribais ou religiosas.

SENADOR TIÃO VIANA, O FRENTISTA

Foto publicada no site Folha do Acre no dia 28/02/2010

A CRISE ECONÔMICA DA GRÉCIA E O BRASIL

Gregos e nós

Miriam Leitão
O Globo


A Grécia vai afetar o Brasil. Não diretamente, não criando uma crise, mas haverá menos fluxo de capital, mais dificuldade de financiar o déficit externo de 3% do PIB. O dólar ficará mais valorizado, elevando um pouco a inflação. Essa é a visão dos economistas José Márcio Camargo e José Roberto Mendonça de Barros. José Roberto define como "loucura" a criação de uma estatal de fertilizantes.

A complicação grega é maior do que parece. A Grécia tem 50 bilhões de euros vencendo em maio, e até lá o Parlamento grego tem que aprovar medidas de austeridade, do contrário, não haverá ajuda.

— A Europa tem uma moeda única, mas não tem uma base fiscal única. Maastricht (o acordo que estabeleceu metas fiscais para todos os países do bloco) vem sendo desrespeitado há tempos — afirma José Márcio Camargo, da Opus Gestão de Recursos e da PUC do Rio.

José Roberto lembrou um fato ainda mais complicado.

— O Banco Central europeu terá que renovar as facilidades de refinanciamento aprovadas no ano passado porque a exposição do sistema bancário europeu nos países do mediterrâneo chega a US$ 3 trilhões. A gente tem que lembrar que esses bancos europeus carregam dívidas da Europa oriental, algo esquecido nesse tumulto grego, mas que está lá presente — diz o economista da MB Associados.

Entrevistei os dois na Globonews sobre a situação grega, europeia, e reflexos no Brasil. O que eles disseram de tranquilizador é que nada do que ocorrerá este ano será igual ao ano passado.

— Eu não acho nada parecido com 2008, quando o Lehman Brothers faliu. Primeiro, porque os bancos estão muito menos alavancados; e porque em 2008 ninguém sabia com quem estava os papéis podres. Agora, há muito mais informação sobre a situação de cada um — diz José Márcio.

José Roberto concorda que nada é como 2008, mas haverá efeitos negativos na economia:

— Vamos ter algum efeito. Os bancos estão bem, mas não querem emprestar na Europa. A base monetária cresce a 12%, e o crédito não sobe. O mundo está assimétrico: Ásia crescendo, Estados Unidos recuperando, e Europa em crise. Isso aumenta a volatilidade do capital, que será muito maior do que a gente imaginava.

Neste contexto, vão se reduzir os fluxos de capital no mundo inteiro, afetando até os investimentos diretos. De novo, nada parecido com a crise de 2008, mas uma situação um pouco pior do que se projetava para 2010.

— Até porque nós temos que financiar um déficit de 3% do PIB, o que é US$ 60 bilhões, e isso é muito dinheiro — diz José Márcio.

— Mais importante até do que o déficit de 2010, de US$ 60 bilhões, é o de US$ 100 bilhões, que terá que ser financiado em 2011 — completa José Roberto.

No caso da ajuda à Grécia, José Roberto acha que a Europa terá de ficar entre dois limites:

Não pode salvar facilmente a Grécia porque a mensagem que passa é horrível e terá que ajudar todos os outros países em dificuldade; não pode deixar o default porque o projeto político da Europa e o projeto do euro naufragam.

José Márcio tem a tese de que os países que passaram bem pela crise foram os que, por causa da crise dos anos 90, foram ao FMI (Fundo Monetário Internacional) e tiveram que fazer o ajuste de suas economias, aumentando a solidez fiscal, como a Coreia, Tailândia, Indonésia, México, Brasil. A Argentina, não, porque ela não fez o ajuste.

O FMI forçou esses países a fazerem o ajuste e quando chegou a crise eles estavam mais bem preparados.

O que a crise fez mal ao Brasil, na visão de José Márcio, foi que ela justificou escolhas ideológicas de aumento do tamanho do Estado, que tinham sido arquivadas.

A crise está justificando decisões absolutamente políticas e ideológicas de aumentar o Estado. A lição que o governo está tirando é exatamente a oposta da que deveria tirar, achando que agora pode aumentar o Estado para debelar a crise. A lição certa é que se saiu melhor quem reduziu o tamanho do Estado. A Grécia aumentou o tamanho e está em crise.

José Roberto acha que há uma leitura errada do economista inglês John Maynard Keynes, no governo:

— Lamentavelmente, neste fim de governo, uma visão de que tudo se resolve através do Estado prevaleceu. Começaram todos keynesianos e terminaram estatistas. Aproveitaram o embalo político para embrulhar em cima do coitado do Keynes o antigo programa do PT.

Quando perguntei a José Roberto o que ele achou da ideia de criar uma estatal de fertilizantes, já que ele tem conhecimentos do setor agrícola, ele respondeu:

— É uma loucura. Isso aí é uma bobagem sem tamanho, que nasceu de um trabalho de três anos atrás, feito por um assessor do ministro Reinhold Stephanes, e que é uma das coisas mais fracas que já li na minha vida. O problema do setor de fertilizantes é de outra natureza. A Petrobras, que é dona do gás, quer fazer nitrogenado (matéria-prima de fertilizante) barato? Entrega o gás a preço decente. Isso ela não faz. A Telebrás é outra parte dessa onda maluca que está surgindo.

Os dois acham que este ano a inflação sobe um pouco, para 5%, o dólar fica entre R$ 1,90 e R$ 2,00, e os juros vão subir, talvez a partir de abril. Acham que a situação econômica fica um pouco pior com a crise da Grécia, mas nada que comprometa o crescimento. Mas alertam: 2011 será o ano da ressaca se a compulsão estatizante e gastadora não for contida.

O PT MUDOU O BRASIL? OU FOI O CONTRÁRIO?

"Lula e o PT conseguiram, mediante a desconstrução sistemática das realizações de outros governos, convencer a maioria de que o Brasil teria começado em 2003. Nunca antes"

Maílson da Nóbrega
Rrevista Veja, Edição 2148, 20 de janeiro de 2010

Nunca antes na história deste país um partido se vangloriou tanto de feitos que não realizou. É o caso do PT. No seu último programa no rádio e na TV, o partido reivindicou o papel de marco zero. Até a estabilização da economia teria sido obra sua. Os petistas se jactam de ter mudado o país. Para um de seus senadores, 2009 foi "a segunda descoberta do Brasil".

No mundo, três transformações radicais sobressaem: (1) a Revolução Gloriosa (1688), que extinguiu o absolutismo inglês e levaria a Inglaterra à Revolução Industrial; (2) a Revolução Americana (1776), da qual surgiria a maior potência no século XIX; e (3) a Revolução Francesa (1789), a profunda mudança que substituiria os privilégios da nobreza, do clero e dos senhores feudais pelos direitos inalienáveis dos cidadãos.

Nada desse porte aconteceu no Brasil, nem agora nem antes. A independência foi declarada por dom Pedro, representante da metrópole. A República nasceu de um golpe de estado dado por Deodoro da Fonseca. A Revolução de 1930, a única que talvez possa ter esse título, promoveu mudanças, mas não daquela magnitude. Aqui não se viram rupturas nem violências. O regime militar findou sob negociação.

O PT pretendia mudar o Brasil, mas para pior. O título de seu programa para as eleições de 2002 era "a ruptura necessária". Prometia "uma ruptura com o atual modelo econômico, fundado na abertura e na desregulação radicais da economia nacional e na consequente subordinação de sua dinâmica aos interesses e humores do capital financeiro globalizado". Soa ridículo hoje, não?

As propostas continham inúmeros disparates: controles na entrada de capitais estrangeiros, mudanças na captação de recursos externos pelos bancos e a denúncia do acordo com o FMI, entre outros. Uma reforma tributária taxaria as grandes fortunas. O pagamento dos juros da dívida pública seria reduzido de forma voluntarista.

A Carta ao Povo Brasileiro (22 de junho de 2002) foi o começo do fim dessas ideias. Nela, Lula ainda defendia "um projeto nacional alternativo", mas falava em "respeito aos contratos e obrigações do país". O superávit primário seria preservado "para impedir que a dívida interna aumente e destrua a confiança na capacidade do governo de honrar os seus compromissos".

As visões econômicas do PT morreram de vez com Lula na Presidência. Um banqueiro foi presidir o Banco Central. No primeiro mês, elevaram-se a taxa de juros e a meta de superávit primário. Tudo o que o PT tachava de neoliberal. Na política, a coalizão de governo incluiu partidos políticos e figuras conhecidas que o PT abominava.

A política econômica foi mantida. Com a preservação da plataforma construída por seus antecessores, Lula conseguiu alçar o Brasil a novas alturas. O amadurecimento das mudanças anteriores ampliou o potencial de crescimento da economia, que foi adicionalmente impulsionada pelos ventos favoráveis da economia mundial entre 2003 e 2008. Tornou-se possível manter e ampliar os programas sociais herdados.

Muito se deve à intuição política do presidente e ao trabalho de seu primeiro ministro da Fazenda, Antonio Palocci. Lula percebeu que a preservação de sua popularidade dependia do controle da inflação e por isso reforçou a autonomia do Banco Central. Ele cresceu aos olhos do mundo em razão de sua simpatia, de seu carisma e por ser um líder de esquerda moderado, defensor da democracia e da economia de mercado.

Lula e o PT conseguiram, mediante a desconstrução sistemática das realizações de outros governos, convencer a maioria de que o Brasil teria começado em 2003. Nunca antes. É um grande tento, que requereu doses elevadas de desfaçatez. Recentemente, na falta de energia no Sul e Sudeste, a preocupação não foi explicar, mas mostrar que o apagão de Lula era melhor que o de FHC.

A manutenção da política econômica foi uma decisão corajosa. Respondeu a um novo ambiente, caracterizado pela intolerância da sociedade à inflação, pela imprensa livre, pela nascente valorização da democracia e pela disciplina do mercado. Lula curvou-se às imposições dessa nova realidade. Ainda bem. O Brasil mudou o PT, que agora é, em todos os sentidos, um partido como os outros.

27 fevereiro 2010

ESCÂNDALO NO MINISTÉRIO PÚBLICO DO PIAUÍ

Entre outras irregularidades, foram descobertos promotores eleitorais filiados a partidos políticos, pagamento de salário de R$ 61 mil a procuradores, sonegação de Imposto de Renda por promotores, procuradores e funcionários, além de fraudes em licitações

Devassa revela abusos em série no MP do Piauí

Efrém Ribeiro
Especial para O GLOBO, 25/02/2010

TERESINA - O Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) começou nesta quinta-feira uma inspeção na Procuradoria Geral de Justiça do Piauí, após a divulgação do relatório da primeira inspeção na instituição. Entre outras irregularidades, foram descobertos promotores eleitorais filiados a partidos políticos, o pagamento de salário de R$ 61 mil a procuradores, sonegação de Imposto de Renda por promotores, procuradores e funcionários, além de fraudes na realização de licitações para compras de bens e contração de serviços.

A inspeção ficará a cargo de quatro integrantes do CNMP: Sandro José Neis (corregedor-geral), Taís Ferraz, Cláudio Barros e Almino Afonso. O conselho descobriu também que um prédio anexo foi comprado sem licitação.

Estagiários chegavam a ganhar salários acima de R$ 5 mil

Também foi constatado o pagamento de salários acima de R$ 5 mil a estagiários; pagamentos de gratificações a procuradores e promotores com valores de R$ 1 mil a R$ 9 mil por mês; pagamento de jetons de R$ 2 mil a R$ 3 mil para procuradores e promotores para participação em reuniões; e gastos de R$ 26 mil com arranjos de flores.

O corregedor Sandro Neis disse que o procurador regional eleitoral do Piauí, Marco Túlio Lustosa Caminha, informou que há membros do Ministério Público do Piauí filiados a partidos políticos, situação em conflito com resolução do CNMP e das próprias decisões do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Recentemente, o TSE admitiu a possibilidade de membro do Ministério Público se filiar a partido político, desde que ele tenha ingressado na instituição antes da Constituição de 1988 e tenha optado pelo regime anterior.

Durante o período eleitoral, os promotores de Justiça no interior do Piauí e alguns de Teresina passam a ser promotores eleitorais.

"Só soube que um dos promotores eleitorais estava filiado a partido político quando li pela imprensa"

Marco Túlio Caminha disse nesta quinta-feira que, durante o exercício de dois anos no cargo de procurador regional eleitoral do Piauí, solicitou o afastamento de dez promotores eleitorais por irregularidades, sendo que dois foram por filiação a partidos políticos.

- Só soube que um dos promotores eleitorais estava filiado a partido político quando li pela imprensa. Os outros oito afastamentos foram porque os promotores não ficavam nos municípios onde atuavam ou porque eram assessores da Procuradoria Geral, o que não é permitido para os promotores eleitorais - explicou Marco Túlio, que assumiu nesta quinta a chefia da Procuradoria da República no Piauí.

- É uma denúncia muito grave, porque é vedada a participação político-partidária por qualquer membro do Ministério Público e, agora, pedimos que os nomes dos promotores nessa situação fossem levantados - apontou Sandro Neis.

"A situação realmente é grave, preocupante", afirma corregedor

O ex-procurador-geral da Justiça do Piauí Emir Martins Filho, na gestão na qual foram descobertas a maioria das irregularidades pelo CNMP, pediu a aposentadoria.

Sandro Neis disse que, após a apresentação do relatório da primeira inspeção, o CNMP tomou 170 deliberações para que as irregularidades sejam sanadas e os responsáveis punidos.

"Isso é inédito na história do Ministério Público brasileiro"

- A situação realmente é grave, preocupante. Por isso, o Conselho Nacional do Ministério Público está retornando ao Piauí e isso vai ser uma constante. Foram instaurados diversos procedimentos - acrescentou Sandro Neis, adiantando que promotores e procuradores poderão ser punidos com penas que vão de advertência e censura, até a demissão do Ministério Público e a cassação da aposentadoria.

Segundo Neis, a situação é tão preocupante que a Corregedoria Geral decidiu que o Piauí seria a primeira unidade da Federação a ser inspecionada.

- Isso é inédito na história do Ministério Público brasileiro. Não tinha acontecido isso no cenário do Ministério Público do Brasil - constatou Neis.

Um dos objetivos da inspeção do CNMP é saber se há no Piauí resistência à aplicação das deliberações do órgão.

Notícias relacioadas:
- Conselho Nacional aponta fraude e enriquecimento ilícito no Ministério Público do Piauí


- Escândalo: Promotores de Justiça do piauí residem em Santa Catarina e no Ceará


- Ministério Público do Piauí começa a se adequar às recomendações do CNMP

- Conselho analisa denúncia contra integrantes do Ministério Público do Piauí

ESCÂNDALO NO MINISTÉRIO PÚBLICO DO PIAUÍ

"Depois das denúncias que eu formulei no CNMP contra a administração do então Procurador Geral de Justiça, Emir Martins Filho, vários processos foram instaurados contra mim, com o único objetivo de intimidação, e ainda hoje existe uma caixa lotada de processos administrativos, no âmbito da Corregedoria do Ministério público, mas que estão sendo arquivados gradativamente"

Conselho do Ministério Público arquiva processo contra Promotor do Piauí

Em decisão fundamentada no regimento do CNMP, a conselheira Sandra Lia Simón determinou o arquivamento do processo administrativo.

José Saraiva
GP1/Teresina

O Conselho Nacional do Ministério Público, em Brasília-DF, arquivou um processo administrativo que foi instaurado pelo então Procurador Geral de Justiça do Piauí, Emir Martins Filho para investigar o Promotor de Justiça do Piauí, Francisco de Jesus Lima (foto), que atualmente, atua na 5ª Vara Criminal de Teresina-PI.

Em decisão fundamentada no artigo 46, X, alínea "b", do Regimento Interno do Conselho Nacional do Ministério Público, a Conselheira Sandra Lia Simón determinou o arquivamento do processo administrativo instaurado contra o promotor Francisco de Jesus.

"Depois das denúncias que eu formulei no CNMP contra a administração do então Procurador Geral de Justiça, Emir Martins Filho, vários processos foram instaurados contra mim, com o único objetivo de intimidação, e ainda hoje existe uma caixa lotada de processos administrativos, no âmbito da Corregedoria do Ministério público, mas que estão sendo arquivados gradativamente", desabafou ao Portal GP1 o Promotor Francisco de Jesus.

O Procurador de Justiça, Emir Martins Filho, no início deste mês, requereu a sua aposentadoria voluntária.

CARNE DE SOL: MAIS DE 90% É INADEQUADA PARA CONSUMO

Das 44 amostras coletadas, 42 apresentavam algum tipo de contaminante físico...como insetos mortos, fragmentos e larvas de insetos e pêlos de roedores...ácaros, bárbulas (filamentos das penas de aves), fungos e pedaços de ossos, madeira e plástico

Manipulação inadequada pode comprometer carne de sol

Por Júlio Bernardes
Agência USP de Notícias

[Carne se sol: Em Diadema, 90,9% do produto é vendido sob condições inadequadas]

A carne de sol é muito procurada em casas do norte, que vendem alimentos típicos do Nordeste brasileiro, mas uma pesquisa da Faculdade de Saúde Pública (FSP) da USP revela que 90,9% do produto é comercializado sob condições higiênicas e sanitárias inadequadas. O armazenamento impróprio e as práticas incorretas dos manipuladores de alimentos verificadas no estudo podem tornar a carne de sol uma fonte de contaminação, especialmente devido à presença de bactérias nocivas á saúde humana.

Na pesquisa, a médica veterinária Tatiana Almeida Mennucci coletou amostras de carne de sol em 22 casas do norte em Diadema (Grande São Paulo). A cidade, com 32 quilômetros quadrados (km2) de extensão e 400.000 habitantes, possui aproximadamente 40% de moradores de origem nordestina, o que leva a um grande consumo do produto. “Como a carne de sol é produzida artesanalmente, não existem normas oficiais para sua elaboração e controles de qualidade e segurança ”, ressalta Tatiana. “A presença de contaminantes físicos e bactérias foi avaliada com base nas resoluções da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa)”.

Das 44 amostras coletadas, 42 apresentavam algum tipo de contaminante físico. “Houve presença significativa de contaminantes proibidos pela legislação, como insetos mortos, fragmentos e larvas de insetos e pêlos de roedores”, relata a médica veterinária. “Também foram encontrados ácaros, bárbulas (filamentos das penas de aves), fungos e pedaços de ossos, madeira e plástico”. A avaliação aconteceu no Laboratório de Microscopia do Instituto Adolfo Lutz, da Secretaria de Saúde do Estado de São Paulo.

As analises microbiológicas, realizadas no Instituto Biológico, ligado a Secretaria Estadual de Agricultura, indicaram que 50% das amostras estavam contaminadas por algum tipo de bactéria. “Verificou-se contaminação por Salmonella spp, Escherichia coli e Staphylococcus aureus, todas associadas a quadros de diarréia em seres humanos”, aponta a pesquisadora. “Os maiores riscos à saúde são causados pela Staphylococcus aureus, cuja multiplicação no produto salgado in natura propicia a produção de uma toxina nociva, que não é eliminada quando o produto é submetido a processo térmico”.

Manipulação

A pesquisa também avaliou as condições dos estabelecimentos que comercializam a carne de sol, quanto a exposição e manipulação das peças. “Em todas as casas do norte visitadas, o produto estava exposto sem qualquer tipo de embalagem ou proteção, o que pode facilitar a presença de contaminantes físicos”, diz a pesquisadora. “Da mesma forma, em todos os estabelecimentos, a mesma faca usada para cortar a carne in natura servia para o corte de queijos e doces, aumentado os riscos de contaminação cruzada com outros prontos para o consumo”.

Apenas um estabelecimento possuía lavatório para que os manipuladores de alimentos pudessem higienizar as mãos. “Mesmo nesse local, não havia sabão líquido nem papel toalha à disposição”, conta. Entre os manipuladores, 45,4% usavam algum tipo de adorno, como relógios e alianças. “O contato com diversos tipos de alimentos e produtos faz com que esses objetos acumulem sujeira, que também poderá ser um veículo de contaminação cruzada”, acrescenta a médica veterinária.

A maioria das casas do norte possuía apenas um ou dois funcionários, o que levava 72,3% a manipularem dinheiro, apontado em pesquisas como fonte de contaminação. A pesquisadora ressalta como aspecto positivo o fato de 77,6% dos manipuladores terem apresentado as unhas cortadas e 72,7% mantê-las limpas, pois a sujeira acumulada também pode levar contaminantes aos alimentos. “As entidades fiscalizadoras devem exigir a presença de lavatórios para higienização das mãos nestes locais, além de maior proteção dos alimentos que, de preferência, devem ser mantidos sob refrigeração”, aponta Tatiana.

A médica veterinária também sugere a realização de cursos de formação para os manipuladores, para que possam lidar com os alimentos de forma adequada, evitando riscos para a saúde. A pesquisa, parte da dissertação de mestrado de Tatiana, teve orientação do professor Pedro Manuel Leal Germano, da FSP.

BINHO E A DEFESA DO CÓDIGO FLORESTAL

Charlene Carvalho
Coluna Ponto e Vírgula, ContilNet

A carta do governador Binho Marques ao deputado federal Moacir Micheleto, presidente da Comissão Externa da Câmara Federal, destinada a dar parecer às alterações no Código Florestal Brasileiro durante audiência pública realizada na quinta-feira à tarde em Rio Branco, mostra bem o compromisso do governo do Estado com o desenvolvimento sustentável, a preservação da floresta acreana. Compromisso que está alinhado aos ideais dos muitos que tombaram em defesa dessa mesma floresta nas décadas de 1970 e 1980, como Chico Mendes, Ivair Higino e Wilson Pinheiro, entre outros.

Binho defende o apoio parlamentar no sentido de proteger os avanços contidos no Código Florestal, e que eventuais ajustes sejam adotados no sentido de “fortalecer os compromissos da nação frente aos desafios da humanidade em razão das mudanças climáticas globais e das necessidade premente de conservar a qualidade dos serviços ambientais da Amazônia para as gerações futuras”. Nem todos os parlamentares, infelizmente, pensam assim e defendem as mudanças do ponto de vista do agronegócio.

Na carta, Binho Marques vai direto ao ponto no debate sobre o desenvolvimento regional. “A sociedade acreana, há mais de uma década, identificou a possibilidade de reversão do padrão anterior de desmatamento e degradação do solo mediante alteração da estratégia de indução econômica, fundamentando-a numa proposta de desenvolvimento sustentável e tendo por base as seis dimensões da sustentabilidade: ambiental, econômica, social, política, cultural e ética.”

Antes de ser governador, Binho é um grande defensor das causas do Acre e dos povos da floresta - bem mais que muitos dos que se dizem defensores dessa causa e nunca foram na verdade, bem pelo contrário - e destaca que as políticas públicas estaduais se sustentam nesse sódigo, “principalmente a partir da sua reforma realizada na década de 1990, quando acertadamente houve a elevação da reserva legal de 50% para 80% das propriedades”.

Segundo ele, algumas das alterações propostas ao atual Código Florestal ou já se encontram contempladas pelas normas e políticas estaduais ou as desarticulam, “desvalorizando a floresta em pé e colocando abaixo a estrutura sobre a qual o modelo de desenvolvimento sustentável do Estado se fundamenta”.

26 fevereiro 2010

REFORMA DO CÓDIGO FLORESTAL E O ACRE: A BRAVURA DE BINHO MARQUES

Governador do Estado 'peita' comissão e ruralistas locais, criticando tentativas de alterar o Código. Um dos principais pontos defendidos pelo Governador é a manutenção da obrigatoriedade de preservar 80% das propriedades na Amazônia

Um dos aspectos ressaltados pelo Governo do Acre junto à Comissão é o que diz respeito às metas de redução de desmatamento e emissões que o Governo Federal terá que cumprir nos próximos anos para não se expor negativamente na comunidade internacional. Por isso, qualquer alteração no Código Floresta precisa levar em conta os compromissos que o Governo Brasileiro assumiu no plano internacional, principalmente no momento em que as atenções do mundo se voltam para as mudanças climáticas e a importância das florestas tropicais para a sustentabilidade do planeta.

Leia a íntegra da carta de Binho Marques à comissão da Câmara que esteve em Rio Branco no dia 25/02/2010 debatendo publicamente a reforma do Código Florestal

_________________________________
Rio Branco-Acre, 25 de fevereiro de 2010.

A Sua Excelência o Senhor

MOACIR MICHELETO

Presidente da Comissão Externa da Câmara Federal Destinada a dar parecer às alterações no Código Florestal Brasileiro Prefeito de Rio Branco

Senhor Presidente,

O Governo do Estado do Acre tem como estratégia transformar a base produtiva do Estado, favorecendo sistemas de produção sustentáveis que estejam de acordo com a vocação e a capacidade de suporte dos recursos a serem utilizados, como indicado pelo nosso Zoneamento Ecológico-Econômico - ZEE. Nesta perspectiva, a sociedade acreana, há mais de uma década, identificou a possibilidade de reversão do padrão anterior de desmatamento e degradação do solo mediante alteração da estratégia de indução econômica, fundamentando-a numa proposta de desenvolvimento sustentável e tendo por base as seis dimensões da sustentabilidade: ambiental, econômica, social, política, cultural e ética.

A base legal para a formulação do modelo de desenvolvimento sustentável é o Código Florestal, que prevê a preservação de amplas áreas de valor ambiental nas propriedades privadas, criando condições para o desenvolvimento do manejo florestal e do aproveitamento econômico da floresta em pé. As políticas públicas estaduais se sustentam neste Código, principalmente a partir da sua reforma realizada na década de 1990, quando acertadamente houve a elevação da reserva legal de 50% para 80% das propriedades. Entendemos que qualquer atualização no Código Florestal deve caminhar no sentido de fortalecer a vocação florestal da Amazônia.

No Acre, excepcionalmente, desenvolvemos e implementamos uma política resultante de um grande pacto com os movimentos sociais, setor produtivo e instituições públicas, de maneira a fortalecer, com sucesso, uma economia ambientalmente sustentável, com manejo florestal certificado.

Dessa forma, tendo como base todo acúmulo dos últimos 10 anos, o Estado criou e implantou a chamada Política de Valorização do Ativo Ambiental, que objetiva, dentre outras coisas, regularizar o passivo ambiental das propriedades rurais em seu território, tema que tem se constituído como um dos maiores desafios para uma gestão socioambiental que promova a eqüidade e a sustentabilidade das atividades produtivas rurais.

Essa política tem fomentado ações integradas entre a sociedade civil, ONGs e instituições governamentais, em busca da melhoria da qualidade de vida das comunidades, assim como proteção do meio ambiente. Desta forma, considerando a Lei do ZEE e a política ambiental do Estado, desde o ano de 2008, foram editadas diversas normas que criaram planos e programas que buscam viabilizar atividades econômicas sustentáveis, onde a produção florestal e rural, a regularização das propriedades e a proteção ambiental possuam uma dinâmica integrada e harmônica. São exemplos dessa proposta o programa de certificação da propriedade rural sustentável, o programa de florestas plantadas e o programa de regularização do passivo ambiental.

A partir de tal ponto de vista, há que se atentar para o fato de que algumas das alterações propostas ao atual Código Florestal, ou já se encontram contempladas pelas normas e políticas estaduais ou as desarticulam, desvalorizando a floresta em pé e colocando abaixo a estrutura sobre a qual o modelo de desenvolvimento sustentável do Estado se fundamenta.

Ainda que ocorram ganhos residuais com a eventual aprovação de alguns projetos de lei que alteram o Código Florestal, temos que evitar a aprovação de projetos que possam significar perdas irreparáveis para milhares de pessoas que vivem na floresta, da floresta e com a floresta em toda região amazônica. Nesse sentido, faz-se fundamental que os avanços contidos no Código sejam mantidos, principalmente no que diz respeito aos 80% de reserva florestal das propriedades.

Por isso, nos dirigimos aos senhores integrantes desta comissão para pedir o seu apoio no sentido de proteger os avanços contidos no Código Florestal, e que eventuais ajustes sejam adotados no sentido de fortalecer os compromissos da nação frente aos desafios da humanidade em razão das mudanças climáticas globais e da necessidade premente de conservar a qualidade dos serviços ambientais da Amazônia para as gerações futuras.

Atenciosamente,

Arnóbio Marques de Almeida Júnior

Governador do Estado do Acre

_________________________________
Foto: Sérgio Vale/Secom

MUDANÇAS NO CÓDIGO FLORESTAL

Audiência sobre Código Florestal esquenta disputa política no Acre

João Brana
O Estado do Acre, 25 de fevereiro de 2010

[Entidades vão ao debate ambiental e mostram que campanha eleitoral será dura e sem trégua]

O debate na audiência pública realizada no auditório da secretaria de Educação na tarde de quinta-feira foi o evento político mais importante e quente da semana no Acre. Foi uma prévia da disputa eleitoral deste ano.

Patrocinada pela Aleac e coordenada pela Câmara dos Deputados, a audiência debateu o Código Florestal e suas nuances na vida dos produtores rurais do Acre e da Amazônia. Teve posições para todos os gostos.

A oposição compareceu ao debate. Estavam lá deputados e possíveis candidatos ao governo e ao senado nas eleiçoes de outubro. Do lado governista também o consenso passou ao largo. PT e PCdoB têm posições distintas quanto ao Código.

O governador Binho Marques mandou o recado pelo secretário Eufran Amaral, do meio ambiente 'Mudar o Código é atrasar o desenvolvimento do Acre'.

O debate foi aberto. E todo mundo falou o que quis. Democracia não faltou. Talvez tenha faltado propostas lúcidas sobre o assunto. Mas isso o tempo se encarrega de consertar.

O que diz o governo

Na abertura da audiência para discutir a reforma no Código Florestal, o secretário de Meio Ambiente do Acre, Eufram Amaral, apresentou a política ambiental do Estado, destacando que o governo vem se esforçando para executar ações que possam garantir a preservação do meio ambiente. Eufram Amaral ressaltou que as propostas contidas no Código Florestal já estão sendo cumpridas no Acre com o fortalecimento das políticas ambientais, garantindo a redução do desmatamento e fortalecendo a pequena produção.

“O Código Florestal é um instrumento necessário para garantir a preservação do meio ambiente. Desde 1999 o governo do Estado vem executando ações importantes que garantem a redução do desmatamento, que era de 87 mil hectares para 48 mil em 2009. Também estamos garantindo a certificação da nossa madeira, possibilitando a preservação da nossa floresta”, explicou.

Perpétua

A deputada Federal Perpétua Almeida (PC do B) durante a audiência pública em que se debateu o novo Código Florestal afirmou ser defensora de mudanças na legislação. De acordo com a parlamentar, o Código atual é injusto uma vez que o Ibama impõe inúmeras limitações para os pequenos produtores. “Acho que temos inteligência necessária e instituições competentes para fazer com que o Código Florestal passe por mudanças. As ações muitas vezes são injustas e cruéis. Tenho acompanhado a posição do Ibama não só no Estado do Acre, mas em todo Brasil e o que eles fazem com o pequeno produtor da Amazônia é um crime. Temos que buscar alternativas, do jeito que está não pode ficar”.

A deputada apresentou em novembro do ano passado o projeto de lei 6.313/09 que anistia as multas ambientais aplicadas aos povos da floresta: ribeirinhos, seringueiros, pescadores e pequenos produtores. Perpétua explicou que com isso os pequenos produtores afetados pelas multas poderão requerer crédito, desde que se comprometam em reverter a multa na recuperação da área degradada, ou seja, replantando.

Para Perpétua Almeida as instituições antes de aplicarem as multas deveriam primeiro orientar e ajudar o pequeno produtor. “As nossas instituições não estão conseguindo chegar para orientar e ajudar os produtores. Pelo contrário, já chegam multando. Também digo que não é justo que as mesmas multas que são aplicadas para os grandes produtores sejam também aplicadas para os pequenos produtores, esse é outro ponto importante que me leva a defender a mudança do Código Florestal”.

A deputada disse ainda que o Brasil necessita de um Código Florestal que tenha autonomia própria, assim não colocará em risco a população atual nem a futura. “Precisamos nos unir e manter nossa Amazônia em pé”.

Visão dos pecuaristas

Presente na audiência pública para discutir o novo Código Florestal Brasileiro, o presidente da Federação de Agricultura e Pecuária do Acre, Assuero Veronez, manifestou seu apoio às mudanças na legislação ambiental. Para ele, o Código atual está defasado e não reflete mais a realidade brasileira. Veronez fez ainda críticas à forma como o Código fForestal atual foi criado. “Foi uma lei feita com base no achismo, sem nenhum indicador técnico. O Código hoje é um gerador de conflitos extraordinário”.

O fato do Código ser composto em sua maioria por medidas provisórias também foi ressaltado pelo presidente que considerou uma forma antidemocrática de resolver as questões ambientais. “O Código foi criado em 65 e só nos últimos 13 anos sofreu mais de 60 modificações que não geraram soluções, mas problemas. Queremos encontrar um equilíbrio. Hoje a legislação impõe que 71% da terra deve ser destinada a preservação e 29% para produção e cidades, mas na realidade isso não ocorre”.

MP vê 'tragédia'

A procuradora de Justiça, Patrícia Rego, declarou ser contra a reforma do Código Florestal, posição comum de todo o Ministério Público brasileiro, segundo ela. De acordo com a promotora, que atua na área de Meio Ambiente há 16 anos, os brasileiros costumam achar que solucionam todos os problemas criando leis, o que não é real. Patrícia lembrou que as tragédias recentes em Santa Catarina, atingida por avalanches de terra e no Rio de Janeiro, demonstram que o Código Florestal foi criado com embasamento científico ao proteger as matas das encostas. Ela lembrou que a preservação de áreas florestais tem finalidades ambientais e econômicas uma vez que protegendo o biodiversidade protege o solo, e, portanto, a produção agropecuária.

Para a promotora, em vez de modificar leis, deve-se pensar em modificar os modos de produção, criar novas tecnologias e crédito para os agricultores.

Lotado

Com o auditório da Secretaria Estadual de Educação totalmente lotado, o deputado Moacir Michelleto (PMDB-PR) abriu às 15h em Rio Branco a 19ª audiência pública para debater a reforma do Código Florestal Brasileiro, criado 1966. O público foi composto por vários deputados estaduais, representantes de trabalhadores rurais, indígenas, seringueiros, fazendeiros, especialistas da área ambiental e estudantes. Michelleto é presidente de uma comissão especial da Câmara Federal criada para dar um parecer sobre projeto de lei que modifica o Código. Além do presidente, estão em Rio Branco, o vice-presidente, Anselmo de Jesus (PT-RO), o relator da comissão, deputado Aldo Rebelo (PCdoB) e o membro titular Paulo Piau (PMDB-MG).

Divergência

Cerca de 300 pessoas participaram da audiência que teve início às 15h no auditório da Secretaria Estadual de Educação. A audiência foi realizada por uma comissão especial da Câmara Federal que vai proferir um parecer sobre projeto de lei que modifica o Código Florestal Brasileiro, criado em 1966. O secretário de Meio Ambiente do Estado do Acre, Eufran Amaral, fez uma exposição em slides e leu uma carta do governador Binho Marques contra a reforma do Código Florestal. Logo em seguida o presidente da Federação da Agricultura do Acre, Assuero Doca Veronez, fez a defesa da reforma, lembrando que desde a criação do Código ele foi alterado diversas vezes. “O Código foi criado sem embasamento científico, com base no achismo e de forma autoritária. Hoje o Brasil tem estudos científicos que permitem a criação de um Código melhor”, argumenta.

ACRE: MUDANÇA DO CÓDIGO FLORESTAL É REJEITADA PELO GOVERNO E MINISTÉRIO PÚBLICO

Para Binho, mudanças em Código representam riscos para desenvolver o Acre

Fábio Pontes
Jornal A Gazeta, 26/02/2010

O governador Binho Marques disse ontem, por meio de carta lida pelo secretário Eufran Amaral (Meio Ambiente), que alterar o Código Florestal é um risco e representa retrocesso às políticas de desenvolvimento sustentável do Acre. A leitura ocorreu durante a reunião da comissão da Câmara dos Deputados responsável por conduzir o processo de eventuais mudanças na legislação ambiental.

Entre os presentes ao encontro estava o deputado presidente da comissão, Moacir Micheletto (PMDB-PR), o vice-presidente Anselmo de Jesus (PT-RO) e o relator Aldo Rebelo (PCdoB-SP). Da bancada acreana estavam os parlamentares Perpétua Almeida (PCdoB), Fernando Melo (PT) e Ilderlei Cordeiro (PPS). O encontro reuniu, ainda, deputados estaduais, representantes de movimentos sociais e ambientalistas.

Ainda em sua carta, Binho afirma que as políticas de desenvolvimento sustentável do Acre têm como uma de suas bases o próprio Código Florestal. Defensor árduo de uma política econômica que tenha como princípio a sustentabilidade, o governador pediu a manutenção do texto original da legislação. “Peço o apoio da defesa e manutenção do Código Florestal muito mais robusto aos desafios da humanidade”.

Em debate desde o ano passado, as mudanças no Código Florestal têm sido motivo de muita polêmica. De um lado, ambientalistas afirmam que eventuais alterações vão servir como uma “carta branca” para o aumento do desmatamento. Já o agronegócio, principal interessado em mexer na lei, afirma que a manutenção do texto como está é um grande retrocesso para o desenvolvimento de um dos principais setores da economia.

Defensor de um novo Código Florestal, o deputado Aldo Rebelo afirma que, como está, a legislação favorece apenas a perseguição e prisão dos pequenos e médios agricultores. “Não há assistência técnica nem atenção aos agricultores. O Estado aparece somente com helicópteros para intimidar”, critica o comunista.

Segundo ele, as organizações brasileiras que defendem o código em sua essência são financiadas por instituições e empresas de países desenvolvidos, que já perderam toda a sua cobertura florestal e agora querem que os países emergentes não destruam sua biodiversidade. Ainda assim, Rebelo reconhece que é necessário o Brasil ter uma legislação que garanta a proteção de seus recursos naturais.

A deputada Perpétua Almeida também é defensora de alterações no código. De acordo com ela, o Acre tem sido um exemplo na adoção de políticas que garantam a preservação da Amazônia, mas é preciso que o Estado contribua para que o pequeno agricultor não seja punido severamente pelo rigor do Código Florestal. “É preciso que o pequeno homem da floresta, o ribeirinho, o índio tenham a proteção do código. O que vemos hoje são os órgãos ambientais muito mais multando do que orientando”, pondera.

Perguntada se a reformulação da lei facilitaria a impunidade nos crimes ambientais, Perpétua diz que esse é um argumento de quem não quer discutir o desenvolvimento do Brasil. “Quem defende que não se pode mexer em nada é porque não conhece a necessidade do amazônida”.

Não há necessidades de mudanças em Código, diz procuradora

A procuradora-geral de Justiça em exercício, Patrícia Rêgo, disse que, atualmente, o Código Florestal e toda a legislação ambiental brasileira não precisam ser alterados. Muito mais do que mudanças, Patrícia ressalta a necessidade de políticas públicas eficazes para resolver os problemas sócio-ambientais do país. Investimento em tecnologias que dêem alternativas ao uso do fogo e derrubadas de novas áreas.

“A mudança no Código Florestal é algo que vai interferir na realidade social e que terá conseqüências muito sérias no futuro das futuras gerações, e o Ministério Público vê com cautela essas alterações; temos posições diferenciadas”, afirma a procuradora.

25 fevereiro 2010

PAUTA INDISPENSÁVEL PARA A IMPRENSA ACREANA NESTA QUINTA-FEIRA (25/02/2010)

Evandro Ferreira
Blog Ambiente Acreano

Meu caderno de anotação para minha missão de hoje

Local: Auditório da Secretaria de Educação, 14 horas
Evento: Discussão da nova proposta do código florestal

Anotações:

- Perguntas para não deixar de fazer ao relator do projeto na Câmara Federal, deputado Aldo Rebelo (PC do B), cuja presença foi confirmada em sua página na internet.


Contexto para as perguntas:

"O senhor tem sido acusado de, na qualidade de relator dessa proposta, ter se aliado com a bancada ruralista do Congresso. Inclusive sua escolha foi feita pelo deputado paranaense Moacir Micheletto (PMDB-PR), que já afirmou aos quatro ventos que os que são contra o novo Código representam grupos não-governamentais da Europa e Estados Unidos, que tendo destruído tudo o que podiam de suas florestas, agoram querem que o Brasil preserva a sua".

E isto parece ter sido confirmado pelas suas declarações durante uma polêmica audiência dessa comissão em Ribeirão Preto e uma recente entrevista para o jornal Folha de S. Paulo.

Diante disso, faço ao senhor as seguintes perguntas":

- Na qualidade de comunista histórico, formador de opinião, líder político nacional, inspiração para os novos quadros do PC do B, o senhor não fica com peso na consciência ao agir claramente contra os princípios ideológicos que sempre nortearam a atuação do PC do B? Não incomoda estar lado a lado com essas pessoas, comungando idéias tão antiquadadas?

- Esta aliança da esquerda representada pelo PC do B e ruralistas radicais não seria resultado de uma 'acomodação fisiológica' do partido visando preservar os cargos que ele tem no Governo Lula?


Caso Aldo Rabelo desconverse e negue que está aliado com o pior dos mundos da direita ruralista do país, é importante fazer a seguinte pergunta:

- Neste caso, então o senhor poderia confirmar publicamente para o povo acreano, sabiamente preservacionistas (só 10% das florestas do Estado foram destruídas), que não abrirá mão do conceito de reserva legal definida na legislação atual e manterá, no seu parecer, que em toda a Amazônia Legal deverá ser obrigatoriamente preservada 80% da área das propriedades?

Nota importante: nessa pergunta não deixar ele sair pela tangente divagando sobre o conceito de Reserva Legal. Insitir na definição praticada na atualidade pois os ruralistas estão manobrando para manter no novo Código o nome 'Reserva Legal', mas com outro conceito e aplicação para flexibiliar o tamanho da área a ser preservada na região.

Para finalizar: não deixar de ler a matéria abaixo antes de ir para o encontro:

Código Florestal acirra divergências entre produtores e ambientalistas

NOTA DO BLOG: Este texto é uma espécie de divertimento pessoal. Sei que os nossos repórteres que trabalham nos jornais impressos e em alguns sites de notícias online podem até ter vontade de fazer este tipo de questionamento para Aldo Rabelo. Mas não o farão porque a matéria dificilmente seria publicada. A turma do PC do B que está encastelada no poder não deixaria. Na imprensa amanhã vai sair um press release do gabinete de um dos parlamentares do PC do B absolutamente inócuo. Quanto a mim, infelizmente estarei fora de Rio Branco. Espero que o Elder de Paula e o Gerson Albuquerque possam estar presentes. Altino Machado também.

REFORMA DO CÓDIGO FLORESTAL

Aldo une esquerda e ruralistas na reforma do código florestal

Congresso: Relator do PCdoB recebe apoio do PT, PSB e PDT e é criticado por ONGs ambientalistas

Mauro Zanatta, de Brasília
Valor Econômico

De citações ao ditador chinês Mao Tsé-Tung, à Bíblia e ao "antropocentrismo", passando por ataques a "correntes" do ambientalismo e ao "capitalismo predatório", parlamentares de esquerda uniram-se à ideologia da bancada ruralista para defender ontem a necessidade de reformar o Código Florestal Brasileiro, em vigor desde 1965.

Deputados de PT, PSB e PDT, apoiados por diversos parlamentares ruralistas do PMDB, promoveram um ato político de apoio a Aldo Rebelo (PCdoB-SP), relator da comissão especial criada na Câmara para alterar as atuais regras ambientais.

Em um sufocante e calorento auditório da Câmara, Rebelo recebeu elogios unânimes diante da plateia de comunistas, ruralistas, sindicalistas, estudantes e índios trajados com imensos cocares vermelhos. Mas foi questionado por dirigentes de ONGs ambientalistas, como Greenpeace, WWF e SOS Mata Atlântica, por suas intenções de alterar o código.

O movimento de apoio político a Aldo Rebelo, liderado por seu partido, deu algumas pistas sobre como o relator pretende modificar as leis ambientais. Mesmo sendo um crítico ferrenho do processo de concentração de terras derivado das atuais regras, Rebelo informou que não vai "abrir mão" dos conceitos de áreas de reserva legal (RLs) e de preservação permanente (APPs). "Não existe esse conceito no mundo, mas está no nosso ordenamento jurídico. E São Paulo vai ter 20% de reserva legal, sim", sustentou. Isso obrigaria os produtores a recompor áreas de mata nativa. "Mas vamos com calma. Não vou servir de agente de defesa da agricultura europeia ou americana". O relator também afirmou ser contra a compensação ambiental fora das propriedades originais, ainda que na mesma microbacia hidrográfica. Isso reforçaria, segundo Rebelo, a pressão da "agricultura capitalizada" contra os donos de pequenas áreas de produção. "Precisamos mediar esses interesses econômicos", pregou. E criticou o governo por editar leis que "inviabilizam" o crédito a pequenos produtores que desmataram além do permitido, o que incentivaria a concentração da terra e a expulsão de agricultores e assentados do campo.

Apontadas como linha de apoio a uma "guerra comercial" entre agricultura frágil de países ricos contra "países frágeis" de agricultura forte, os ativistas das ONGs revidaram: "É necessário separarmos quem quer defender os interesses nacionais e quem quer jogar para defender seus próprios interesses", disse o diretor do Greenpeace, Sérgio Leitão. O "ponto central" do debate, segundo ele, é a "necessidade ou não da expansão da fronteira agrícola".

Em nome do PT, o deputado Dr. Rosinha (PR) elogiou a visão de soberania nacional de Aldo Rebelo, mas criticou o modelo de desenvolvimento "individualista e consumista" ao pregar a urgência de limitar a expansão de cultivos como a cana-de-açúcar e evitar a descentralização das leis ambientais aos Estados. "Já pensou se estivesse nas mãos do Arruda aqui em Brasília? Já chega o que estão fazendo no Noroeste", afirmou, em referência ao novo bairro "ecológico" aprovado pelo governador afastado do DF, José Roberto Arruda (sem partido), preso por acusações de corrupção. O líder do PSB na Câmara, Rodrigo Rollemberg (DF), concordou com as teses de Rebelo, mas reivindicou mudanças para proteger o Cerrado e o pagamento por serviços ambientais a produtores: "Este modelo que está aí não me serve. Precisamos mesmo avançar em novas áreas? Só que quem cumpriu a lei no passado não pode ser penalizado hoje", disse.

O presidente da comissão especial e uma das principais lideranças ruralistas do Congresso, Moacir Micheletto (PMDB-PR), voltou a criticar a forma como a legislação foi criada. "Há uma insegurança jurídica no campo. A legislação ambiental hoje é fragmentada, tem caráter ideológico, sem base científica, não protege o meio ambiente e engessa o agronegócio", resumiu. Será preciso, segundo ele, modificar quase todos os pontos do Código Florestal para "adequar" as regras às novas necessidades do país.

ALDO REBELO FOI INDICADO POR RURALISTA PARA A RELATORIA DA REFORMA DO CÓDIGO FLORESTAL

Definição de cargos de direção de comissão especial teve apoio de PT e governo. Dentre os membros, um dos direitistas mais radiais, deputado Luis Carlos Heinze (PP-RS), que afirmou que "Os americanos, os europeus não preservaram. E agora os trouxas do Brasil precisam [preservar]?.

Ruralistas obtêm comando de debate sobre Código Florestal

MARIA CLARA CABRAL
da Folha de S.Paulo, em Brasília, 15/10/2009 - 10h34

[Micheletto (PMDB-PR), eleito presidente da comissão, indicou Rebelo (PC do B-SP) para relator; PV e PSOL fazem crítica à composição da chapa]

Após semanas de debates, os ruralistas ficaram com a maioria dos cargos de comando da Comissão Especial do Código Florestal Brasileiro na Câmara. O acordo foi possível graças ao apoio do PT e do governo.

A chapa, que recebeu 15 votos favoráveis, 2 nulos e 1 branco, ficou a seguinte: Moacir Micheletto (PMDB-PR) na presidência, Anselmo de Jesus (PT-RO) e Homero Pereira (PR-MT) como primeiro e segundo vices. Micheletto e Pereira são ruralistas. Já Anselmo de Jesus é pequeno produtor.

Depois de tomar posse, Micheletto indicou Aldo Rebelo (PC do B-SP) para a relatoria da comissão. O deputado também é considerado um aliado dos ruralistas graças a posições polêmicas que adotou nos últimos anos, como as críticas feitas à demarcação contínua da terra indígena Raposa/Serra do Sol.

"Essa é uma mesa alinhada com o setor ruralista, uma chapa que não tem legitimidade", criticou o deputado Ivan Valente (PSOL-SP), apoiado por Edson Duarte (PV-SP).

"Nem os ambientalistas devem temer a produção de um código ambiental que despreze o meio ambiente, nem os ruralistas devem temer um código financiado pelas ONGs internacionais", disse o relator.

"Não tem nada disso de ruralistas e ambientalistas, porque quem vai definir o texto final [do código] é o plenário", completou o presidente Micheletto.

O PT admitiu que fez parte do acordo que elegeu o comando da comissão. O deputado José Genoino (PT-SP), no entanto, negou que Rebelo esteja do lado dos ruralistas.
Genoino foi o responsável pelo adiamento da primeira reunião, quando a chapa dos ruralistas era ainda mais forte, com Valdir Colatto (PMDB-SC), presidente da frente parlamentar da agricultura, em um dos postos principais.

Além de cargos no comando, a comissão também é composta por outros ruralistas, como o deputado Luis Carlos Heinze (PP-RS). "Os americanos, os europeus não preservaram. E agora os trouxas do Brasil precisam [preservar]? Depois que a Europa destruiu tudo", disse.A comissão do Código Florestal Brasileiro foi criada para analisar o projeto do ex-deputado Sérgio Carvalho, que propõe um novo Código Florestal em substituição ao atual.

REFORMA DO CÓDIGO FLORESTAL

A fala de um ruralista ecoa a voz dos comunistas brasileiros

Duvidam? Leiam abaixo:

"Não existe essa possibilidade. Isso vem sendo dito ao longo dos anos de uma maneira mentirosa, promovida principalmente por organismos internacionais como a WWF, que representa os interesses da Coroa britânica, e o Greenpeace, que se auto intitula tropa de choque do meio ambiente, mas que faz vistas grossas aos estragos ambientais causados pelos governos dos EUA e da comunidade européia".

Declaração do Deputado Moacir Micheletto (PMDB-PR) ao site Ambiente Brasil (10/03/2005), quando questionado se a proposta dele de reforma do Código Florestal iria permitir o desmatamento e a diminuição de áreas conservadas na Amazônia.

Isso foi em 2005. No final de 2009 o Deputado Moacir Micheletto (PMDB-PR), eleito presidente da comissão, indicou Aldo Rebelo (PC do B-SP) para relatar a matéria na Câmara.

A prova de que os comunistas comungam o pensamento e a prática dos ruralistas foi dada pelo próprio Aldo Rebelo durante a 25ª audiência pública de discussão sobre as alterações no Código Florestal, realizada no dia 03 de fevereiro passado em Ribeirão Preto-SP.

Na ocasião, o comunista disse que "o ambientalismo transformou-se em uma trincheira por onde se escondem os interesses das multinacionais e dos países ricos" e que a "legislação florestal não pode ser uma legislação tributária". Nesse momento ele foi interrompido pelos gritos dos manifestantes, que o chamaram de “traidor” e “tucano”.

O comunista não conseguiu terminar sua fala, sendo estranhamente aplaudido de pé pelo agronegócio e vaiado intensamente pela militância dos rabalhadores rurais, representantes da agricultura familiar, assentados e ambientalistas.

Clique aqui para ler nota relacionada.

REFORMA DO CÓDIGO FLORESTAL

PT: quem te viu, quem te vê

Lauro Jardim
Coluna Radar, Veja, quarta-feira, 14 de outubro de 2009

Os ruralistas levaram o comando da Comissão do Código Florestal Brasileiro, elegendo há pouco na Câmara o presidente e o relator do projeto que, no final das contas, vai mexer nas leis que limitam o desmatamento. A presidência da comissão ficou com o Moacir Micheletto (PMDB/PR) e a relatoria com Aldo Rebelo (PCdoB/SP). Até aí, beleza. Foram eleitos por seus pares e ponto.

O curioso é a mudança de postura do PT. Quando o Código Florestal foi modificado em 2001, no governo FHC, o PT bateu até não poder mais no projeto de Micheletto - afinal, aprovado. Micheletto era, então, um diabo desmatador. Agora, Micheletto foi eleito com o apoio entusiasmado da bancada petista.

Por Lauro Jardim
Foto: Site do Deputado Aldo Rabelo

24 fevereiro 2010

O PROJETO DE ANISTIA DE MULTAS AMBIENTAIS DO DEPUTADO WALTER PRADO

Evandro Ferreira
Blog Ambiente Acreano, atualizado em 25/02/2010

Confesso que ainda não entendi o texto produzido pelo repórter Ray Melo referente ao projeto do Deputado Walter Prado. No texto não fica claro se a anistia de 10 anos é para quem cometeu infração ambiental no passado ou para os que ainda irão cometer no futuro.

No texto do repórter, está escrito o seguinte:

"Para ter direito a anistia a infração ambiental precisa ser comprovadamente, motivada para a subsistência do agricultor ou de sua família. “A intenção é beneficiar os praticantes de cultura efetiva, que estão ligados economicamente à exploração agropecuária, agroindustrial, extrativista, florestal ou atividade similar, mantida no imóvel rural, com objetivo de prover a subsistência dos ocupantes, será agraciado com este projeto” enfatiza Prado."

Se a intenção do projeto é mesmo anistiar infratores ambientais pelos próximos 10 anos, então acho que os assessores do Deputado se equivocaram de forma grotesca. Afirmo isso porque conheço o deputado pessoalmente e tenho certeza que ele só apresentou a proposta depois de ter recebido carta branca de sua assessoria.

Entendo que não se pode anistiar quem ainda não cometeu infração. Anistia-se os infratores e não os inocentes.

Se a intenção é evitar que os agricultores sejam multados no futuro, então é mais fácil, e juridicamente aceitável, eliminar a lei que tipifica a infração. Sem lei não tem infração, e portanto não precisa anistiar.

Por outro lado, manter a lei para ter seus efeitos legais sistematicamente desconsiderados é absurdo e sem sentido. Um incentivo à desordem institucional.

Creio que um projeto desse não daria certo nem no Vaticano, quem dirá no Brasil, o país do 'jeitinho'. Se todos souberem que podem cometer a infração sem perigo de ser punido, quem vai ligar para cumprir a lei?

Foto: Blog do Deputado Walter Prado

COPA DO BRASIL: JUVENTUS-AC X ATLÉTICO-MG

"Se eu fosse uma autoridade, ficaria constrangido em usar dessa vantagem [ingresso cortesia]. Falo isso em consideração às dificuldades que os clubes locais enfrentam para participar desses campeonatos nacionais...mesmo com apoios de todos os lados...muitas vezes não é possível fechar a conta no final do mês."

Evandro Ferreira
Blog Ambiente Acreano

O Deputado Calixto informa no seu Blog que em troca do apoio financeiro que o Governo da Floresta está dando ao Juventus para participar na Copa do Brasil, o clube se obriga a ceder 50 ingressos/partida para autoridades e convidados do Governo.

Não sou contra o apoio estatal ao esporte acreano. Muito pelo contrário. Melhor um jovem praticando esporte do que peranbulando pelas ruas assaltando e usando drogas.

E a barganha no caso do apoio ao Juventus parece injusta para o Governo, que está levando menos do que está dando.

Entretanto, considerando que as autoridades com direito a ingresso cortesia ocupam cargos com ganhos financeiros mais que robustos, acho no mínimo uma afronta que alguma delas apareça por lá para desfrutar dessa benesse.

Se eu fosse uma autoridade, ficaria constrangido em usar dessa vantagem.

Falo isso em consideração às dificuldades que os clubes locais enfrentam para participar desses campeonatos nacionais. É uma operação complexa, com apoios de todos os lados e que muitas vezes não são suficientes para fechar a conta no final do mês.

Assim, sob o ponto de vista moral e ético, o mais adequado seria as autoridades pagarem os ingressos como forma de incentivo adicional para as agremiações esportivas locais.

Acho até que seria interessante essas autoridades doarem a cota de ingressos cortesia para instituições que apoiam a inclusão de jovens carentes que tem ambição de seguir uma carreira esportiva.

Seguramente para eles a oportunidade de ver ao vivo a atuação de grandes jogadores - locais e do time visitante - pode servir como exemplo, inspiração e aprendizado para o futuro que almejam.

Foto: Gustavo Simões/Photobucket

ATLAS DE PRESSÕES E AMEAÇAS ÀS TERRAS INDÍGENAS NA AMAZÔNIA BRASILEIRA

ISA

Muito tem se falado na devastação da Amazônia e em algumas de suas consequências para a população indígena. Mas muitas vezes de forma genérica, sem se especificar áreas mais afetadas e as dinâmicas territoriais dos principais causadores dessa devastação. Apontar essas regiões e processos, em diferentes horizontes de tempo, é a intenção do Atlas de Pressões e Ameaças às Terras Indígenas na Amazônia Brasileira, publicação do Instituto Socioambiental (ISA) que será apresentada à imprensa nesta quarta-feira, dia 9 de dezembro, às 9h, no escritório da organização em Brasília (SCLN 210, Bl. C sala 112). Na quinta-feira, às 19h, no café Daniel Briand (SCLN 104, Bl. A, Lj. 26), acontece o lançamento oficial.


O livro traz 25 mapas, além de textos de contextualização e com casos emblemáticos, tabelas, gráficos e fotos sobre temas como: estradas, hidrelétricas, desmatamento, agropecuária, queimadas, mineração, exploração madeireira, garimpo, petróleo e gás, população, saneamento básico, urbanização e projetos do PAC. A quase totalidade dos dados foi colhida em instituições que subsidiam pesquisas, políticas e indicadores oficiais, como o IBGE, o Inpe e a Aneel.

O atlas mostra, em especial, como os principais rios afluentes da margem direita do Amazonas e as Terras Indígenas (TIs) localizadas em suas bacias, na porção sul da Amazônia, estão ameaçados por um conjunto de pressões socioambientais. Bacias como dos Rios Tapajós, Madeira e Xingu são apresentadas com um alto grau de ameaças representadas por barramentos de rios em cadeia, desmatamento e mineração, entre outros. A publicação também oferece indícios sobre a possível movimentação da fronteira agrícola nos próximos anos: ela não mais avança gradualmente sobre o território amazônico a partir de um perímetro com contorno bem definido, mas lança ramificações e estabelece núcleos ativos em várias direções chegando a áreas até pouco tempo consideradas isoladas e mais preservadas. No momento em que o mundo discute medidas para o combate as mudanças climáticas, a intensidade e o alcance dessa movimentação – que pode ser visualizada no atlas – lança dúvidas sobre a real capacidade do Estado Brasileiro em gerir de forma sustentável o território amazônico e suas áreas protegidas.

Entre outros números apresentados na publicação, o leitor descobre que 44% potencial hidrelétrico inventariado da região pode atingir TIs – os povos indígenas serão os mais afetados pela expansão da geração de energia elétrica prevista para acontecer no País (grande parte na Amazônia). Existem hoje 83 hidrelétricas funcionando e 247 planejadas na Amazônia. Cálculos sobre somente 27 desses projetos, apontam que eles podem afetar até 44 mil pessoas. O tema da urbanização e do saneamento básico também é abordado no livro: em média, só 13% dos moradores das cidades da Amazônia Legal têm acesso à rede de esgoto, por exemplo.

Outros dados coletados pelo ISA e sistematizados em sua base de dados sobre Terras Indígenas também são agregados à publicação: na Amazônia, existem hoje 173 povos indígenas e 405 Terras Indígenas em diferentes estágios de regularização (21,7% do território amazônico), com uma população de cerca de 300 mil pessoas. Há mais de 5 mil processos minerários - entre alvarás e licenças de exploração, áreas “em disponibilidade”, requerimentos de lavra garimpeira e pesquisa – que incidem sobre 125 TIs na Amazônia. Essas TIs abrigam uma população de mais de 140 mil pessoas.

MAIS UM DESEMBARGADOR PUNIDO PELO CNJ

O desembargador Jovaldo dos Santos Aguiar, ex-corregedor geral do Tribunal de Justiça do Amazonas, será aposentado compulsoriamente. Acusações: negociar sentenças, corrupção, parcialidade e desídia, com a paralisação de 31 processos enquanto exercia o cargo de corregedor

CNJ aposenta ex-corregedor de Justiça do TJ-AM

Blog do Frederico Vasconcelos
Folha Online

Advogada paulista sustentou denúncia contra o juiz

O desembargador Jovaldo dos Santos Aguiar, ex-corregedor geral do Tribunal de Justiça do Amazonas, será aposentado compulsoriamente com vencimentos proporcionais ao tempo de serviço. A decisão foi tomada nesta terça-feira (23/2), por unanimidade, pelo plenário do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).

O relator do processo (*), conselheiro Walter Nunes, enumerou diversas irregularidades praticadas pelo juiz. O desembargador foi acusado de negociar sentenças, de prática de corrupção e de parcialidade. Foi acusado ainda de desídia quando exercia a função de Corregedor de Justiça, com a paralisação de 31 processos.

Ele estava afastado preventivamente desde maio do ano passado por recomendação do corregedor nacional de justiça, ministro Gilson Dipp, após inspeção realizada no Judiciário do Amazonas em fevereiro de 2008.

Reportagem da Folha, publicada em junho de 2009 (acesso a assinantes do jornal e do UOL **), revelou que a advogada paulista Alessandra Camargo Ferraz, inconformada com decisões do magistado que prejudicavam seus clientes, denunciou-o ao CNJ e sustentou as acusações em audiência pública em Manaus.

Na ocasião, o advogado Délcio Luiz Santos, que defende o corregedor, disse ao jornal que "o desembargador Jovaldo foi submetido à execração pública". Alegou que houve "julgamento sumário e condenação sumária". Ainda segundo o advogado, "uma auditoria entendeu que ele não teve qualquer participação em fraude de distribuição processual, e o relatório da Polícia Civil diz a mesma coisa".

Segundo o relator Walter Nunes, "o comportamento do acusado nos processos envolvendo os interesses de Djalma Castelo Branco e do Grupo Fama e Buriti Industrial S/A denotam, claramente, que havia corrupção".

O empresário e advogado José Kleber Arraes Bandeira afirmou ao CNJ ter pago propina ao magistrado e ter sido enganado. Apesar do pagamento, a decisão do desembargador teria sido desfavorável à empresa de Kleber Arraes e, por isso, ele decidiu denunciá-lo.

O CNJ acolheu 14 acusações feitas ao desembargador. A decisão será encaminhada ao Ministério Público, à Procuradoria do Estado do Amazonas e também à Ordem dos Advogados do Brasil, para apuração de irregularidades atribuídas a advogados citados no processo.

O PREÇO DO DESENVOLVIMENTO E DA EXPLORAÇÃO DA AMAZÔNIA PERUANA

Em nome do desenvolvimento, governo peruano cede terras para empresas estrangeiras explorarem recursos naturais, colocando em risco as populações tradicionais do Peru e do Acre

Peru vende Amazônia e ameaça comunidades indígenas da fronteira com o Brasil

Leandro Chaves, CPI/Acre
Especial para o site Ecodebate

Em junho de 2009, no massacre de Bagua, no Peru, dezenas de indígenas foram mortos pela polícia e centenas ficaram feridos e detidos, fruto da repressão oficial, que impedia os protestos contra o decreto de implantação do Tratado de Livre Comércio com os EUA. O tratado visava o aumento do investimento de empresas em áreas ricas em recursos naturais. O descaso com o meio ambiente e seus habitantes e a criminalização do movimento indígena refletem a política neoliberal do Peru, que cede terras a empresas multinacionais para a exploração de petróleo, gás, minérios e madeira.

Hoje, 49 milhões de hectares de terras na Amazônia peruana (72% da região) estão entregues a empresas petroleiras – dentre elas à brasileira Petrobrás. São 65 lotes para exploração e produção de petróleo, muitos dos quais sobrepostos a terras indígenas e a unidades de conservação, segundo dados de 2008 da Plos One. A retirada ilegal de madeira e o tráfico de drogas se intensificam nas regiões fronteiriças do Peru, resultando em invasões de territórios protegidos no Acre, como aconteceu, anos atrás, na Terra Indígena Ashaninka do Rio Amônia e no Parque Nacional da Serra do Divisor.

Desde 2004, a Comissão Pró-Índio do Acre e a SOS Amazônia coordenam o Grupo de Trabalho para a Proteção Transfronteiriça da Serra do Divisor e Alto Juruá, grupo de instituições que debatem as questões da fronteira e os impactos sobre os povos da região. Em novembro de 2009, realizaram mais um encontro para discutir o tema, que reuniu organizações indígenas e do movimento social do Brasil, Peru e Bolívia.
Vítimas do ‘desenvolvimento’

Durante o evento, duas lideranças indígenas do Peru, da Comunidade Nativa Sawawo Hito 40, na fronteira com o Acre, relataram como a comunidade se aliou à empresa madeireira Forestal Venao, de Pucallpa, para tentar superar as dificuldades causadas pelo isolamento e o descaso do governo. Os irmãos Ashaninka, João e Luis Garcia Campos, contaram em entrevista que, em troca da retirada da madeira, a empresa prestaria serviços à comunidade, inclusive aqueles de responsabilidade do governo.

Mesmo certificado pela Smartwood-Rainforest Alliance com o selo FSC em 2007, a atividade madeireira, fundamentada em um plano de manejo elaborado pela empresa e aprovado pelo Instituto de Recursos Naturales (Inrena), resultou na abertura de uma estrada, em uma extensa rede de ramais, em grande devastação, na fuga das caças e na obstrução de cursos de água, deixando as famílias Ashaninka sem a sua principal fonte de sobrevivência: a floresta.

Este é um retrato do que acontece em regiões da Amazônia peruana. Assim como a Forestal Venao, outras empresas, dentre elas as estrangeiras, exploram recursos naturais do país e causam prejuízos ao patrimônio natural e cultural das comunidades e às suas formas de organização social e política. Em nome do desenvolvimento sustentável e do progresso, essas atividades são apoiadas por políticas favorecidas por vários órgãos do governo peruano. Nos debates oficiais, costuma-se analisar apenas o lado positivo desses processos para a economia. A mídia, por sua vez, continua a retratar os povos indígenas como atrasados ou como obstáculos ao desenvolvimento.

Integração Brasil-Peru

Nos últimos anos os governos do Brasil e do Peru têm construído processos de integração física e energética. Além da pavimentação da Rodovia Interoceânica, estão em fase de planejamento a construção de uma estrada e de uma ferrovia ligando o município de Cruzeiro do Sul a Pucalpa. Já a parceria energética visa promover a produção e exportação de energia hidrelétrica e a integração de empreendimentos de empresas estatais e privadas – brasileiras e peruanas – nas áreas de petróleo e gás.

Esses processos de integração têm sido discutidos há anos por organizações do movimento social e associações indígenas e extrativistas do Acre e Peru. Elas têm exigido que os dois governos cumpram as recomendações da Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e da Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas. Essas recomendações garantem o direito das comunidades e organizações à realização de consultas, prévias, consentidas, informadas e de boa-fé, a respeito das políticas oficiais de desenvolvimento e de “integração regional” que venham a afetar seus territórios e modos de vida.

Têm também reivindicado que os governos de ambos os países implementem políticas fronteiriças comuns, voltadas à conservação do meio ambiente e da biodiversidade, à proteção de terras indígenas e unidades de conservação e à garantia de direitos dos povos indígenas, assegurando plena participação desses povos e dos demais moradores da região de fronteira na definição e execução dessas políticas.

ENTREVISTA

“O governo peruano tem contrato com empresas para a exploração de recursos naturais nas terras protegidas”, afirma liderança indígena Ashaninka do Peru

Leandro Chaves – Fale um pouco sobre a empresa Forestal Venao.
Luis Garcia e João Garcia – Forestal Venao é uma grande madeireira peruana. Foi ela que acabou com as madeiras da nossa aldeia. Hoje é uma empresa muito grande e só cresceu às nossas custas, porque quando a conhecemos, não tinha quase nada. Ela saiu da nossa comunidade e não nos deixou nada, nenhum recurso. Hoje ela trabalha com outras terras indígenas no Alto Juruá e está repetindo a mesma destruição que fez na nossa comunidade.

LC – O que aconteceu entre sua comunidade e a madeireira?
LG/JG – Nós estávamos abandonados pelo governo do Peru. Estávamos muito longe de qualquer tipo de comunicação com as instituições peruanas, inclusive as que representam os direitos das comunidades indígenas. Estávamos longe, também, das cidades e ficava difícil fazer compras. Tinha os problemas de saúde, adoecia uma pessoa e não tínhamos como sair. Sabe quanto custa um avião de Pucallpa para a nossa aldeia? 1.800 dólares para pegar um doente lá, trazer e mandar tratar na cidade. A única coisa que nos ajudaria a cobrir essa necessidade era a madeira. Esse foi o único meio que vimos para sair dessa situação. Por isso, fizemos o acordo com a empresa, em 2002. Entramos com a proposta do que a gente queria também. Faltou uma boa administração da parte deles com os mais de 4 milhões de dólares gerados dentro da nossa terra. Em 2007, começamos a perceber que isso não estava certo. Nossa madeira estava acabando e, por isso, terminamos o contrato. Agora, essa empresa não trabalha mais com a gente e nos deixou sem madeira e sem benefícios. Percebemos um pouco tarde que com a nossa madeira não poderíamos mexer. Estamos sofrendo bastante, mas tentando nos reerguer. Apanhamos, mas aprendemos.

LC – Que outros problemas vocês sofreram por causa das ações da empresa?
LG/JG – Sempre antes de a madeireira chegar à comunidade, ela ficava uns seis meses em Pucallpa fazendo manutenção das máquinas. Nesses meses não tínhamos muitos problemas. Mas quando as máquinas começavam a transitar pela terra, dia e noite, não encontrávamos nenhum tipo de caça. Elas corriam. Pesca nunca tivemos problemas.

LC – O que está sendo feito para reverter a situação do desmatamento na sua terra?
LG/JG – Começamos a fazer um plano de manejo e aprendemos a usar nossa madeira. Também estamos reflorestando. Após a saída da empresa, já plantamos mais de 85 mil árvores. Estamos sobrevivendo somente através do nosso recurso, pois continuamos abandonados pelo governo. Vamos buscar outras alternativas e maneiras de trabalhar, como o artesanato e o ecoturismo. Isso sim é uma fonte de renda que não causa problemas. Queremos também uma parceria com as comunidades do lado acreano, que possuem mais experiência, como é o caso da Apiwtxa, onde vivem muitos de nossos parentes.

LC – Vocês possuem alguma organização?
LG/JG – Sim, temos a UCIFP (Unión de Comunidades Indígenas Fronterizas del Perú), que abrange as comunidades Sawawo, Dorado, Santa Rosa, Nueva Shawaya e Vitória, das etnias Ashaninka, Jaminawá, Amauaca. Acontece que essa organização não funciona para a gente. Ela funciona só para as empresas. Na época da Forestal Venao, defendia mais o interesse da empresa do que o nosso. Não reclamo da organização, mas das pessoas que estão à frente dela e só vêem benefícios que não são o dos povos indígenas, que ficam no prejuízo. Quem sabe se trocasse de direção, as coisas não mudariam?

LC – Hoje vocês sofrem algum tipo de pressão por parte de outras empresas?
LG/JG – Sem dúvida. Nossa principal preocupação hoje é com essas companhias petroleiras que estão se aproximando da nossa comunidade. Tem uma que está com as suas bases instaladas a cerca de 80 km da nossa terra. O governo peruano tem contrato com essas empresas para explorar recursos nas terras protegidas, tudo isso sem consultar nós, que somos donos do lugar. Isso já está acontecendo, como na Forte Esperança, dos nossos parentes Ashaninka. Já não bastou a Forestal Venao e agora vêm essas petroleiras? Nossa terra vai se acabar! Sobrevivemos da mata, nossas crianças precisam dela, a nossa alimentação vem daí. Tem que haver um mínimo de respeito. A exploração já chegou à comunidade Paraíso. Eu vi muitas coisas por lá. Mexer com petróleo pode trazer consequências ruins para todo mundo. Se os canos vazarem, por exemplo, podem contaminar todos os rios, inclusive os do Acre, porque os rios correm no rumo do Brasil. Se sofremos com a retirada da madeira, pois agora é que vem o pior.

LC – A imprensa peruana tem dado alguma visibilidade à causa de vocês?
LG/JG – Estive um tempo em Lima e tentei informar sobre isso. Tive até a oportunidade de chegar à televisão para levar informações sobre esse problema. Os empresários, que tem dinheiro e controlam os meios de comunicação, cortaram tudo. Acabaram com a informação. Falaram: “Vocês vão acreditar nesse índio? Ele está sendo pago para fazer essa denúncia”.

LC – Qual sua opinião em relação ao mandato do atual presidente Alan Garcia?
LG/JG – Ele está deixando as comunidades indígenas da fronteira abandonadas e dando mais valor aos empresários, petroleiros e mineradores. Gente que já tem dinheiro o bastante. Está deixando de lado o nosso direito enquanto povos indígenas, que vivemos da floresta, e dando parte dela para pessoas que já têm como sobreviver. São empresas grandes. O governo está vendendo a Amazônia e nos tratando como animais. Tudo isso por causa de interesses econômicos. Nos sentimos vendidos, nossa opinião é essa. Gostaríamos de falar para todos o que está acontecendo para ver se gera alguma cobrança. O Peru precisa saber do sofrimento que estamos passando por culpa dele mesmo. Muita gente nem sabe que existimos, mas estamos aí. Agora, graças a Deus tivemos essa oportunidade de estar aqui com vocês, em Rio Branco, discutindo esses problemas e compartilhando ideias. Por que não agir como o governo brasileiro, que mostra preocupação com as suas florestas? É isso que queremos.

LC – E a partir daqui? O que esperar para o futuro?
LG/JG – Nós temos que pensar somente em ir em frente e buscar os nossos direitos. Em relação à madeira, nossa situação melhorou com a saída da empresa e o começo do reflorestamento. Agora é só ver como vamos trabalhar. Ainda queremos indenização da Forestal Venao. Aprendemos com o que aconteceu e estamos retomando. Vamos reclamar ao governo peruano, pois as coisas não estão claras e não foram cumpridas como estavam no contrato. Nossa comunidade ainda está abandonada pelas autoridades. Tem o IBC [Instituto Bien Común] lutando pelos direitos indígenas, mas no geral não há o mesmo tipo de organização que existe no Brasil. Só sei que várias pessoas querem viver às custas das comunidades indígenas e no final não nos deixam nada. É necessário mudar essas ideias para que possamos ter melhores expectativas para o futuro. Pobres nós não somos porque temos toda a natureza.

Reportagem e entrevista realizada por Leandro Chaves, Comissão Pró-Índio do Acre CPI/AC para o EcoDebate, 24/02/2010